por Nathalia Zaccaro

Tim Bernardes, vocalista do trio O Terno, arrisca um palpite sobre qual pode ser o hit do novo álbum, conta sobre o match com Devendra Banhart e dá três dicas de artistas contemporâneos

“Transformar sofrimento em uma canção bonita é uma sensação muito boa”, diz Tim Bernardes, vocalista e compositor de todas as doze músicas do novo disco do trio paulistano O Terno, destaque da cena nacional contemporânea. <atrás/além> é o quarto álbum do grupo e gira em torno dos dilemas de quem, assim como os integrantes da banda, começa a perceber a vida adulta se aproximar. “O disco inteiro tem uma unidade temática que tem a ver com os conflitos, questões, sentimentos, vontades e anseios da chegada de uma vida adulta, sendo um jovem de quase 30 anos. Comecei a compor e reparei que as músicas falavam sobre os desdobramentos desses sentimentos e quis apostar nesse conceito”, explica.

O lançamento marca os dez anos da banda e traz duas participações especiais internacionais: o norte-americano Devendra Banhart e o japonês Shintaro Sakamoto, que dividem com Tim os vocais da faixa "Volta e meia". Famoso por seus videoclipes, o trio (que é composto ainda por Gabriel Basile na bateria e Guilherme D’Almeida do baixo) já soltou o primeiro vídeo de <atrás/além>, para a música "Pegando leve". Dá o play:

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Em setembro de 2017, Tim lançou seu primeiro um álbum solo, Recomeçar, que teve enorme impacto no desenvolvimento de <atrás/além>. “Acho que, como produtor, arranjador e compositor, eu ganhei alguma confiança. Explorei pondo em prática ideias de arranjos com muita liberdade, por estar sozinho para experimentar, acertar, errar. Aprendi coisas que  trouxe para esse disco”, conta. Em papo com a Trip, Tim arriscou um palpite sobre qual pode ser o hit do novo álbum, lembrou dos tempos do começo da banda e contou quais são os artistas contemporâneo que fazem sua cabeça. 

Trip. Como surgiu essa ideia de fazer um disco todo em volta de um único conceito?
Tim Bernardes. Eu comecei a compor as canções todas numa mesma época. E isso é diferente do que aconteceu nos outros discos d'O Terno, em que as músicas eram de várias safras e a gente queria justamente que cada uma fosse de um jeito, para ter contrastes e variedade. Nesse, a gente quis fazer um disco inteiro em um conceito, com uma unidade temática que tem a ver com os conflitos, questões, sentimentos, vontades e anseios da chegada de uma vida adulta, sendo um jovem de quase 30 anos. Comecei a compor e reparei que as músicas falavam sobre os desdobramentos desses sentimentos todos e quis apostar nesse conceito. “Eu vou”, por exemplo, é uma música mais otimista, que dá vontade de ir atrás e inventar o que você quer, de buscar. e acho que “Atrás/Além” também tem muito a ver com isso, mas de uma maneira mais nostálgica. Acho que as músicas todas são da mesma família, mas cada uma com seu próprio clima.

Como rola um hit? Vocês tem um feeling de qual música vai ser a mais popular e investem nela ou é a galera  mesmo que decide? Quando a gente termina de compor as músicas e olha para elas, às vezes, sentimos qual parece poder conversar com as pessoas mais diretamente. E, muitas vezes, é essa que a gente escolhe como single. Mas se vai ser hit ou não não está nas nossas mãos. Muitas vezes, você escolhe algumas como single e, no Spotify, depois de uns meses, você vê que tem uma música específica ali que bombou muito mais.

Qual acha que será o hit do novo disco? Eu gosto muito de "Pra sempre será", é uma música que me pega, não é um hit desses que vai estar na pista, é mais aquele do coração. Acho que é uma música que funciona muito bem sozinha e dá uma quebrada tanto no humor quanto na extroversão no disco. Mas todas as músicas são bem pop.

Como a experiência de ter feito um disco solo impacta no novo disco d'O Terno?Impactou bastante. Acho que, como produtor, arranjador, compositor, eu ganhei alguma confiança. Explorei pondo em prática ideias de arranjos com muita liberdade, por estar sozinho para experimentar, acertar, errar. Aprendi coisas que trouxe para esse disco. Ao mesmo tempo, também tem um lance de vida, vivi um processo muito louco com esse disco solo, que foi de dar a cara a tapa sozinho, sem a banda, sem os amigos, sem a persona, sem a zoeira. Foi realmente me abrir ali, o meu íntimo, é um disco muito sincero, pessoal. A resposta ter sido positiva me deu muita animação e vontade de seguir fazendo o que eu faço. Então chego nesse disco com com uma série de experiências novas que vieram bastante dos meu disco solo. <atrás/além> tem muito do Melhor do que parece [disco anterior d'O Terno, de 2016] e de Recomeçar [álbum solo, de 2017].

Como rolaram as participações do americano Devendra Banhart e do japonês Shintaro Sakamoto? O Devendra a gente conheceu no Brasil, quando abrimos o último show dele em São Paulo. Ali já rolou uma conversa, ele contou que gostava dos nossos clipes. Quando a gente se reencontrou num festival na Alemanha, em que rolou também um show do Shintaro, rolou um match. A gente gostou um do show do outro, nos identificamos, embora cada um tenha um caminho diferente. Tivemos a ideia da parceria e mandamos para eles. O Devendra gravou em Los Angeles, o Shintaro gravou no Japão; eles mandaram pra gente, juntamos e mixamos. Foi tudo pela internet.

Uma das músicas é uma ode ao Biel, baterista da banda. De onde veio essa ideia? O Biel é um cara que, quando entrou na banda, trouxe um astralzão muito legal, além de ser um baterista hipnotizante, com um estilo muito incrível. Essa música foi feita meio nesse clima de descontração, um presente para um amigo e que fala muito não só do Biel, mas da banda O Terno, de nós três. Ele é o protagonista desse molejo, dessa zoeira. Mas é uma música de amor para os amigos, para a banda, para a curtição que é tocar junto.

A banda está fazendo 10 anos. Quando vocês começaram, o que imaginavam para o futuro? Está parecido? Há 10 anos foi quando a gente começou como uma banda autoral, ainda antes de gravar o primeiro disco. Acho que ali não tinha nem como imaginar onde a banda poderia chegar. Não só por não saber até que ponto a gente ia chegar artisticamente, mas também porque a cena de 10 ou 15 anos atrás era uma entre-cena. A indústria fonográfica tinha ruído de uma certa forma, a internet ainda não estava rolando do jeito que rola hoje para música, estava começando uma experiência. O que a gente sempre soube é que a gente queria fazer música totalmente do nosso jeito, sem se render a nenhuma máxima ou algum dogma do que poderiam vir a dizer sobre o que era o mercado da música. Fazíamos a música que a gente gostaria de ouvir para tentar atingir o máximo de pessoas possível. Nesse sentido, isso é algo que a gente ainda quer e é uma coisa que a gente vem atingindo. Embora às vezes rolem saltos maiores, isso é uma construção degrau por degrau. Acho que onde a gente chegou agora, pensando em O Terno de 10 anos atrás, é um lugar que dá muita alegria. Poder fazer shows, ter uma público carinhoso pelo Brasil inteiro, até em alguns lugares fora do Brasil, gente interessada na música. E, para os próximos 10 anos, acho que a coisa segue, é um desenvolvimento para chegar a cada vez mais pessoas, fazer músicas que a gente goste cada vez mais, explorar novos caminhos.

Vocês já falaram em sofrência indie para definir o som. Sofrer é o caminho mais fácil e direto para compor? É um caminho, às vezes o mais urgente. Transformar um sofrimento em uma canção bonita é uma sensação muito boa e, muitas vezes, sensibiliza os outros também. Mas acho que não é necessariamente o caminho mais fácil ou direto. Tem muita música sobre alegria que transmite mais do que uma sofrência. Tudo pode inspirar, não tem muita restrição.

Quais artistas contemporâneos à banda vocês curtem? Uma banda americana que me toca muito é o Fleet Foxes, os assuntos são muito lindos, a musicalidade é muito bonita. Outro que acho um grande compositor da música popular brasileira atual é o Rafael Castro, esse cara para mim é um gênio. Ele já falou de tudo quanto é coisa, tem 500 mil discos e vive nos submundos de São Paulo. Também gosto muito da Ana Frango Elétrico, ela é bem nova, mais nova que eu, é do Rio. Ela me fascina porque tem uma liberdade criativa entre a psicodelia e uma coisa de infância, ela é pintora, poeta, tem  uma estética de computador. Acho bem fascinante.

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