Em uma sociedade que se recusa a dialogar, Pedro Bial promove conversas profundas no horário nobre da TV aberta sobre alguns dos temas mais difíceis e urgentes da atualidade
Pedro Bial precisa sair para buscar a filha na escola. Ao fim da entrevista, essa era a sua missão como um pai de quinta viagem. “Eu sou a prova, mais ou menos viva, de que cabem muitas vidas numa só”, diz. Desde que se casou com a jornalista Maria Prata, em 2015, ele vem descobrindo mais um jeito de viver. O casal tem duas filhas: Laura, 2 anos, e Dora, que está para nascer. “Estou recomeçando. Não estou negando a velhice, ao contrário, estou acolhendo e me sentindo muito confortável em envelhecer nestas circunstâncias. Acho que é o auge, nunca estive tão bem.”
“A gente busca a pluralidade, a polifonia, a mistura de vozes diferentes”
Pedro Bial
Além do dia a dia familiar, na profissão, ele comanda um programa providencial nestes tempos de Brasil polarizado. “Eu não me lembro de ter visto um Brasil especialmente tão rachado. Mas eu sou jovem, tenho só 61 anos”, diz, com a sua característica ironia. O Conversa com Bial, que estreou em maio de 2017 na TV Globo, poderia ser mais um talk show com bancada, banda e convidados, mas o programa tem uma identidade própria e se tornou uma grande conversa com os protagonistas dos nossos tempos. “A gente busca a pluralidade, a polifonia, a mistura de vozes diferentes.”
Já sentaram na bancada do programa nomes como o escritor Olavo de Carvalho e o general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional do governo Bolsonaro. O ex-deputado e professor Jean Wyllys e a ativista pela Amazônia Claudelice Santos. Na cultura, além de atores globais em peso, a cantora Maria Bethânia e a turma da Tropicália (Caetano Veloso, Gilberto Gil, Tom Zé). “Aquele som e fúria das redes sociais não dá pra chamar de debate. A TV aberta, o velho eletrodoméstico no meio da sala, ganhou uma relevância enorme porque o sujeito põe a cara, apresenta as ideias dele e isso civiliza o diálogo”, diz.
Casa nova
Bial nasceu e cresceu no Rio de Janeiro. Há três anos, como parte da sua mais nova vida, mudou-se para São Paulo. Ele diz que gosta e se adaptou à cidade, mas “do Rio eu sinto saudades”. Faz sentido, o Bial carioca está no seu sotaque e na sua história. “Costumo dizer que, para a maioria das pessoas, a utopia é um lugar no futuro. Já eu, nasci na utopia, na Ipanema de 1958. Estavam lá no bar da esquina Vinicius de Moraes, Tom Jobim, eu vi a barriga da Leila Diniz.” A influência da cultura carioca da época deu o brilho para ele sonhar em ser cineasta. Mas o interesse em ouvir gente de todos os tipos fez com que escolhesse o jornalismo como profissão. “Sinto uma estranheza muito grande com o mundo, com o fato da gente estar vivo.” A escolha do jornalismo foi uma forma de checar como os outros lidavam com a própria existência. “Eu queria saber a reação das pessoas diante de coisas que, para mim, eram muito espantosas, surpreendentes, maravilhosas ou terríveis.”
“Eu não me lembro de ter visto um Brasil especialmente tão rachado. Mas eu sou jovem, tenho só 61 anos”
Pedro Bial
Rapidamente ele entraria para a equipe da Globo, no Jornal Hoje, em 1981. Tornou-se correspondente em Londres aos 30 anos, cobrindo grandes fatos históricos do final do século 20, como a queda do muro de Berlim, em 1989, e as guerras do Golfo (1990-1991) e da Bósnia (1992-1995). Ao longo de uma carreira de 38 anos na mesma emissora, passou por Globo Repórter, Fantástico, Na Moral e Big Brother Brasil, que apresentou por 14 anos (2002-2016). O programa não trazia exatamente sua experiência jornalística para as telas, mas tinha a marca da sua identidade.
“Mergulhei num caldeirão pop do entretenimento. Foi bom, abriu novas estradas, novos caminhos, falei com pessoas com quem eu não falava e me deu um pouquinho mais de versatilidade”, conta. “Quando me dei conta de que tinha ido muito longe no entretenimento, pensei: ‘Como é que eu vou juntar esses dois profissionais?’. E aí comecei a fazer outros programas, até que me chamaram para o Conversa”. Na hora que o programa começa, por volta da 1 da manhã, Bial já está dormindo. Mas, como uma parte dos telespectadores, assiste no dia seguinte, pelo computador. Enquanto isso, é hora de Laura, sua filha, ir à escola. Em algumas horas, o pai vai largar os jornais que lê diariamente e correr para buscá-la. E seguirá dialogando com todas as nuances do mundo ao nosso redor.
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Imagem principal: Mario Ladeira