Um carioca solto na China

Thiago Bessimo
Adriana Nazarian

por Thiago Bessimo
Adriana Nazarian
Trip #284

O brasileiro Thiago Bessimo se jogou em diferentes apps de relacionamento no gigante asiático e sacou que a mulher chinesa vai muito além de qualquer estereótipo

“A vida em Pequim, uma cidade cheia de imigrantes, onde se trabalha muitas horas, pode ser bem solitária. Muitas vezes, é mais fácil usar um app do que se envolver em conexões duradouras. Para muitos, eles são uma forma de conversar e combater a solidão, principalmente no inverno, de uma rotina superdigital.

“Ir a um date é uma caixa de bombons sortidos: você abre e entende se a pessoa quer algo casual ou sério. ”
Thiago Bessimo

Em 2016, logo que me mudei para China, terminei um relacionamento de cinco anos. Comecei usando o Tinder, que, na época, precisava de VPNs [rede privada virtual, alheia ao controle chinês], passei pelo Tantan [um dos aplicativos de encontro mais populares da China] e voltei para o Tinder. No começo, cometi vários erros: não sabia escrever uma descrição, não tinha fotos de solteiro, e, principalmente, não conhecia a cultura local.

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Um ano depois, após algumas interações, conheci uma ‘colecionadora de estrangeiros’. Ela já tinha dormido com suecos, belgas, noruegueses, americanos, mas nunca com um latino. Solitária, fazia isso para preencher um vazio. Foi ela quem me deu a melhor dica sobre namoro virtual na China. Assim como outras mulheres, as chinesas querem sexo, precisam matar a solidão de uma vida cheia de horas de trabalho e estudo, mas não gostam de bater de frente com a cultura tradicional, então dizem buscar namorados e até maridos.

E eu realmente senti esse conflito nas histórias que vivi: o valor tradicional da família – que pede que elas casem com um homem chinês e provedor – e a possibilidade de ter um relacionamento sem grandes preocupações. Outra questão gira em torno do sexo, já que os chineses são muito conservadores e julgam qualquer atitude mais ousada de suas parceiras na relação. Uma das garotas que conheci queria namorar de qualquer jeito, desde o primeiro beijo, só para ter um aval da sociedade do que é considerado um comportamento aceitável. Namora, faz o que quer e depois termina, simples assim.

“Assim como outras mulheres, as chinesas querem sexo, precisam matar a solidão de uma vida cheia de horas de trabalho e estudo.”
Thiago Bessimo

Quando entendi isso, passei a estar aberto a todas as possibilidades de relacionamento, desde uma simples amizade até histórias sérias, passando pelo famoso FWB (friends with benefits). Coloquei umas fotos pimponas no app e uma frase que uso até hoje: ‘Looking for a connection in a hyperconnected world’ [buscando uma conexão em um mundo hiperconectado, em tradução livre].

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Em muitas das interações que já tive pelos apps, a grande preocupação das chinesas era: ‘Quando você vai embora de Pequim?’. Uma vez, minha date começou a chorar quando tentei beijá-la depois de assistirmos a um filme, com a luz acesa, no meu dormitório da faculdade. Tudo porque sou estrangeiro e poderia deixá-la um dia. Ela saiu correndo e nunca mais nos falamos.

“Eu senti esse conflito: o valor tradicional da família e a possibilidade de ter um relacionamento sem grandes preocupações.”
Thiago Bessimo

De maneira geral, a regra no mundo virtual é ir devagar. Na China, até o mais lerdo dos brasileiros é rápido. Os encontros vão do café ao drink, de acordo com a intenção e a abertura encontradas. Há momentos em que sinto falta de algo mais rápido, mas demonstrar essa vontade não rola. A chinesa não costuma mostrar o que deseja com um encontro. Ir a um date é uma caixa de bombons sortidos: você abre e entende se a pessoa quer algo casual ou sério. Quando acontece um hook up [sexo casual], por exemplo, é a chinesa quem toma a iniciativa. Há um tempo, conheci uma mulher que estaria na cidade por apenas três dias. Comentei: ‘Poxa, pouco tempo’. E ela respondeu: ‘Tempo suficiente para o one night stand [uma transa]’. Me mandou o endereço do hotel em que estava, transamos e pronto, super bem resolvida. De tudo que vivi, só posso falar do grande respeito que tenho pelas usuárias dos apps, por quem, inclusive, já me apaixonei algumas vezes.

A verdade é que existe um estereótipo da mulher chinesa como submissa e fofinha, mas é justamente o contrário. São fortes, ambiciosas e, muitas vezes, querem a independência da família tradicional.”

Créditos

Imagem principal: Beijing Silvermine/ Thomas Sauvin

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