Você é um androide?

por J.R.Duran
Trip #182

Não existem máquinas para detectar se alguém é idôneo; tudo depende da primeira impressão

O teste de Voight-Kampff é um procedimento utilizado, no filme Blade Runner, para descobrir se um suspeito é um replicante ou ser humano. Consiste em uma máquina de aspecto sinistro, que amplia consideravelmente o olho da pessoa examinada. A imagem é projetada em um monitor, de maneira a facilitar a observação das reações do suspeito, enquanto ele está sendo questionado pelos caçadores de androides. As perguntas são feitas para provocar reações na íris dos interrogados. Reações que não aconteceriam se eles fossem humanos. São questões como “Você está em um deserto andando sozinho e de repente olha para baixo e vê uma tartaruga. Você se abaixa e a vira de costas para cima. A barriga dela fica queimando ao sol e ela balança as pernas, tentando se virar, mas não consegue sem sua ajuda. Você vai ajudá-la?” ou “Você esta assistindo à televisão e percebe uma abelha em seu braço, o que você faz?”. Essas perguntas, supostamente, fazem com que os replicantes contraiam os músculos da íris ocular ou, acredite se quiser, fazem seu corpo emitir partículas quase invisíveis. Tudo devidamente registrado pela máquina.

 

No filme, um bom profissional como Deckard, detetive interpretado por Harrison Ford, precisa de pouco mais de 20 perguntas para descobrir a verdade. Porém, quando ele encontra a personagem Rachel (a bela Sean Young) precisa fazer mais de uma centena de questões para descobrir o que todos nós, espectadores, já sabemos. Ela é quase perfeita, mas não é humana.

Dr. Castanho e os psicopatas
Infelizmente o Voight-Kampff é resultado da imaginação de Philip K. Dick, autor do livro Do Androids Dream of Electric Sheep?, que deu origem ao filme. Na vida real, para quem está sentado na poltrona do cinema, não existem máquinas desse tipo para detectar se alguém é portador ou praticante das qualidades que fazem um indivíduo ser considerado idôneo. Um indivíduo correto. Confiável. Fica tudo dependendo da primeira impressão, o que às vezes é um erro que custará caro a quem se enganou na avaliação.

Seguem, então, algumas considerações, inúteis porém honestas, obtidas mesmo sem ajuda do teste Voigh-Kampff.

– Uma pessoa honesta é alguém íntegro, honrado e incapaz de enganar qualquer um. É alguém que age com seriedade e lealdade.

– A honestidade está ligada à sinceridade. Mas aprendi com o Dr. Castanho, o da novela, que um mentiroso, se for honesto, é um psicopata.

– A honestidade pode ser pessoa jurídica. Pode-se dizer, por exemplo, que um restaurante é honesto.

– A honestidade não é hereditária. O fato de um pai, ou uma mãe, ser honesto, não quer dizer que seus filhos o serão. Curiosamente um irmão pode ser honesto e o outro não.

– Normalmente, em uma relação amorosa, sentimental, o que se espera sempre é que ela seja honesta e sincera. Mas é bom, no cotidiano, não levar as coisas ao pé da letra. Experimente falar para sua esposa, namorada, que ela está “com o cabelo parecendo uma vassoura” ou “ com a maquiagem forte demais”. Não funciona.

– Wilfred Bion, psiquiatra e psicanalista britânico (1897-1979), escreveu que “. verdade sem amor é crueldade, amor sem verdade é hipocrisia.”.

– A honestidade deve ser praticada constantemente. Não se pode ser honesto dependendo da situação.

– A honestidade só é reconhecida e respeitada por quem a pratica. Mas uma pessoa honesta sempre vai estar em desvantagem perante uma outra que seja desonesta. Em princípio uma pessoa honesta é uma presa fácil.

– Nos esportes, geralmente, a honestidade é apreciada. Os ingleses chamam de fair play. No tênis, por exemplo, é considerada uma qualidade. No futebol, às vezes, um jogador catimbeiro faz falta a uma equipe. Ele é considerado astucioso.

– Assim como a ocasião faz o ladrão, o oposto também se aplica. A honestidade se acumula, como pontos de milhagem, no caráter da pessoa. Em cada ocasião que ela é colocada à prova a milhagem vai aumentando. Mas isso não é garantia de nada. Um erro apenas e todos os pontos acumulados desaparecem.

*J. R. Duran, 55, é fotógrafo e escritor. Seu e-mail é studio@jrduran.com.br

 

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