Selecionamos as imagens, reportagens e personagens que refletem nossa visão sobre vivenciar e compartilhar a biosfera
Neste ano, em que celebramos o 32º aniversário da Trip, decidimos selecionar imagens, ideias, reportagens e personagens que, ao longo dessas décadas, traduzem com graça nossos temas de interesse e nos ajudam a clarear o olhar da revista para o mundo.
São 12 os pilares que fundamentam nosso projeto editorial: Corpo, Alimentação, Trabalho, Sono, Teto, Saber, Liberdade, Biosfera, Conexão, Diversidade, Acolhimento e Desprendimento. Foi um mergulho prazeroso e profundo em nossa história.
Todo este conteúdo foi acrescido de informações e novas entrevistas com personagens que protagonizaram passagens importantes da trajetória da Trip. Seguimos sempre em frente.
1988
#7 | tema: horizonte
Resistência verde
Texto Roberto Amado | Foto Araquém Alcântara
Nem tudo está perdido. Ainda existe a Mata Atlântica. Um verdadeiro santuário ecológico – um dos principais ecossistemas do planeta, segundo a ONU. Dentro desse hábitat, a vida é abundante de aves, peixes, animais e homens. O equilíbrio que se dá é perfeito: os rios carregam a massa orgânica da mata para os manguezais, que alimentam aos peixes, que, por sua vez, alimentam o caiçara. Se qualquer elo desta corrente for quebrado, os outros estarão igualmente ameaçados. E a ameaça aumenta a cada dia.
A proximidade com os centros urbanos começa a atrair os interesses comerciais e o turismo desordenado. A pesca predatória surge com os barcos de armadores que não respeitam as épocas de reprodução. Os loteamentos burlam as leis e se proliferam. Em 1986, um grupo de biólogos, jornalistas, empresários e ambientalistas juntou-se para evitar que o último pedaço da mata seja desmatado e criou a SOS Mata Atlântica. Com alguns meses de vida, já conta com quase 2 mil membros. E a Mata Atlântica tem muita pressa.
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E agora?
O bioma tropical continua ameaçado; restam hoje 12,4% da Mata Atlântica. Um recente estudo publicado na revista científica internacional Plos ONE revelou que menos de 30% dos mamíferos que existiam ali há 500 anos ainda resistem. No caso das onças, pintada e parda, a redução chega a quase 80%. A Serra do Mar, por sua topografia íngreme e de difícil acesso, se firmou como refúgio dos animais sobreviventes. A SOS Mata Atlântica, que hoje soma 250 mil filiados, segue na linha de frente da luta contra o desmatamento.
2007
#161 | tema: sustentabilidade
Frente fria
Texto Kátia Lessa | Foto Ryan Casey e Robert Brown
“Foi o projeto mais perigoso com que me comprometi na vida”, afirma Garrett McNamara, big rider havaiano, pós-graduado nos picos mais cabulosos do planeta. Em 2007, ele e o surfista conterrâneo Kealii Mamala encararam as ondas formadas pela queda de paredões de gelo no Alasca.
O bizarro é que essa nova modalidade tem relação direta com o aquecimento global: com os mares esquentando, a queda de imensas geleiras ficou, infelizmente, mais regular. “A primeira vez que um dos pedaços de gelo explodiu tive vontade de enfiar meu rabo entre as pernas e voltar para casa”, lembra Garrett, que quase desistiu, mas resistiu na água gelada. Em seguida, uma geleira de mais de 100 metros abriu caminho para uma perfeita onda – três minutos do surf mais belo e perigoso que a dupla já tinha experimentado. “Foi uma experiência extraordinária.”
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E agora?
“Tenho que ser honesto. Aquela não foi a minha melhor ideia . Achei que ia morrer”, escreveu Garret este ano em seu Instagram sobre a aventura de 2007. Mesmo longe das geleiras, o big rider não deixou de desafiar a morte. Em 2011, entrou para a história quando bateu o recorde da maior onda já surfada. Foi em Nazaré (Portugal), quando dropou um paredão de 23,77 metros. Ele sustentou o posto até novembro do ano passado, quando o brasileiro Rodrigo Koxa encarou, no mesmo local, uma onda de 24,38 metros.
1987 | #5
Fluxo podre
Texto José Fucs | Fotos Araquém Alcântara
A civilização está de ressaca. O vômito industrial está cobrindo as águas dos rios e do mar da Baixada Santista, litoral de São Paulo. Os peixes estão morrendo contaminados.
Traçar a rota da poluição das águas da Baixada Santista não é uma coisa agradável. O estrago, na verdade, começa no topo da Serra do Mar, ainda no planalto, nas proximidades da capital, onde fica a represa Billings. Ela concentra, hoje, nada menos que a metade dos esgotos de toda a Grande São Paulo e despeja essa carga em direção ao litoral. Em Cubatão, o maior polo petroquímico do país, passam as águas que descem da serra em direção ao mar.
A poluição nas praias do Guarujá não tem solução a curto prazo. A balneabilidade das praias é definida via índice de coliformes fecais. Em outras palavras, medem a quantidade de merda na água. Como solução parcial, a Sabesp está construindo um emissário submarino na praia da Enseada para levar os esgotos até o fundo do mar. Hoje, todo o sistema de esgotos do Guarujá deságua direto na praia do Tombo, considerada permanentemente imprópria para banho.
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E agora?
A situação do esgoto no Guarujá melhorou. 81% da cidade tem acesso à coleta e 100% deste volume é tratado em duas estações da Sabesp, antes do lançamento em emissário submarino de 4,5 km de extensão. Um símbolo desta melhora é a praia do Tombo, que no mês passado recebeu a certificação internacional Bandeira Azul, concedida às praias que atendem a 33 critérios, entre eles, o de qualidade das águas.
2007
#153 | tema: como você alimenta sua felicidade?
Ecologia lucrativa
Texto Ronaldo Bressane | Foto Márcio Lima
Ao topar com uma tartaruga morta da praia, um grupo de oceanólogos resolveu que precisava meter a mão na massa para mudar a situação desses animais, que são dos mais antigos da Terra e estavam vagarosamente desaparecendo. Entre eles, estava o casal que fundaria um dos mais bem-sucedidos projetos de preservação ambiental do mundo: Maria Angela e Guy Marcovaldi. Eles acharam um importante ponto de desova das tartarugas no litoral norte baiano. Desse ponto, começaram o lento trabalho de catalogação dos hábitos dos quelônios marinhos. Contrataram os mesmos pescadores que capturavam os bichos para comer, agora para protegê-los.
A ideia, simples, funcionou. Vinte e sete anos depois de sua fundação, em 1980, o Projeto Tamar conseguiu que o litoral fosse repovoado e hoje estão devagarando por aí 9 milhões de tartarugas marinhas. O projeto emprega cerca de 1,2 mil pessoas e, raridade entre as ONGs brasileiras ambientais, lucra. A sede na Praia do Forte recebe 1,5 milhão de pessoas por ano, que financiam a revolução.
Em 1998, o casal foi eleito pela Time entre os 50 heróis do planeta. “Nosso desafio agora é resolver o problema das redes, que matam tartarugas em todo o litoral. Tem muito barco japonês, espanhol, pescando legal e ilegalmente no Brasil.”
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E agora?
Com passos de tartaruga, o Tamar foi longe. “Aumentamos muito nossa produtividade nas praias. Até o verão de 2018, devolvemos ao mar mais de 35 milhões de tartarugas marinhas”, conta Guy. Mas a mortalidade nas redes tende a aumentar, avisa, já que cresceu o número de tartarugas nos oceanos. “Todo mundo está falando sobre o plástico no mar, mas o que mais ameaça hoje as tartarugas são as redes de pesca.”