por Caio Ferretti
Trip #184

Fomos ao berço do hip hop para acompanhar de perto o maior campeonato de break do mundo

A cidade que viu o hip hop nascer em suas ruas assistiu ao maior campeonato de break do mundo, com a participação de um brasileiro, o paranaense Neguin. Fomos a Nova York para acompanhar o evento e tentar entender os malabarismos que os melhores b-boys do planeta fazem com seus corpos

Deveria ser obrigatória a opção “slow motion” nas batalhas de break. Sim, porque só dessa forma o público conseguiria entender todos os movimentos feitos pelos b-boys. Já que a opção não existe – pelo menos não simultaneamente –, resta ficar impressionado, sem saber exatamente o que aconteceu. E todos que assistem se impressionam. No campeonato mundial de b-boys, o Red Bull BC One, é assim. Cada movimento no palco ganha como resposta um “wow!” coletivo vindo das arquibancadas da arena. Motivos sobram para a euforia. Não bastassem os 16 principais breakers do mundo duelando entre si, a edição deste ano do BC One, realizada em 18 de novembro, levou o hip hop de volta à cidade onde tudo começou: Nova York.

“Onde está o verdadeiro hip hop?”, gritava ao microfone o MC do campeonato pouco antes de as batalhas começarem. “Está aqui”, respondia em coro o público no Hammerstein Ballroom. Difícil discordar. “Meu mundo é esse aqui”, disse o b-boy brasileiro Fabiano Lopes, o Neguin. “Em Nova York o hip hop é puro, o comportamento é diferente. Eles vivem essa cultura mesmo, dá pra sentir.” E ele sentiu. Enquanto fazia alguns passos em uma estação de metrô de Manhattan a pedido da Trip, ele arrancou elogios da turma que passava por lá.

O envolvimento do paranaense Neguin com o break aconteceu por acaso. Capoeirista desde pequeno, Neguin gostava de pesquisar na internet novidades que lhe ajudassem na roda. Numa dessas buscas, quando estava com 15 anos, encontrou sem querer um vídeo de um b-boy dançando break ao som de capoeira. “Foi um acidente que tinha que acontecer. Quando vi o vídeo pensei: ‘Que negócio louco é esse, quero aprender isso rápido’. Eu já tinha a didática da capoeira, então foi mais fácil.” Nessa época o rap já ecoava nas caixas de som do rádio dos irmãos mais velhos. Não demorou muito e o nome de Neguin começou a ficar popular no cenário do hip hop nacional. Ao lado de Pelezinho e Chaveirinho, b-boys que fizeram fama em turnês ao lado do rapper Marcelo D2, criou um dos principais grupos de break do país, o Tsunami All Stars Crew. Notoriedade que rendeu ao morador de Balneário Camboriú, aos 22 anos, o convite para participar do BC One de Nova York.

Sem pânico
Andando a passos curtos, proporcionais ao seu pequeno tamanho, o argelino Lilou subiu ao palco da arena ao ser convocado para sua primeira batalha. Antes de qualquer movimento já havia chamado a atenção de todo o público. Não por ter sido campeão em 2005 e ser um dos favoritos para mais um título. O que fez alguns rirem e outros se calarem foi a roupa de Lilou. Em letras gigantes, a frase escrita na frente da camiseta dizia: “Sou muçulmano. Não entrem em pânico”. Recado propício para uma arena lotada de nova-iorquinos. “Tenho várias camisetas assim. Esta aqui eu pedi pra fazer com letras ainda maiores. Tento mostrar que ser muçulmano não significa ser diferente”, explica.

Até conseguir o bicampeonato, Lilou teria que vencer quatro batalhas. O sistema do mundial é eliminatório, quem perde está fora. O confronto funciona assim: dois b-boys sobem ao palco para duelar ao som escolhido pelo DJ na hora. Enquanto um se apresenta, o outro assiste. Cinco juízes, todos também b-boys, elegem o melhor. E o que eles avaliam? “Procuro por originalidade, musicalidade, potência nos movimentos. Percebemos quando alguém está pegando fogo ou está num dia horrível”, diz Ronnie, campeão do BC One de 2007, agora juiz.

Neguin estava confiante, havia encontrado uma pulseira nas ruas de Manhattan no dia anterior com o recado: “Não importa o julgamento, a sorte está com você”. Mas o os juízes decidiram que quem estava com sorte mesmo era Lilou, e Neguin ficou em quarto, bela colocação para o estreante. O argelino foi o primeiro a ganhar o bicampeonato – e, assim, um muçulmano virou o rei de Nova York por um dia.

 

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