por Carol Ito

A exposição German Lorca: Mosaico do Tempo - 70 anos de Fotografia traz uma panorama da obra de um dos grandes nomes da fotografia brasileira

Aos 96 anos, com 70 deles dedicados à fotografia, o paulistano German Lorca caminha devagar, com dificuldade, enquanto sua mente parece estar a cem por hora. Resgata memórias com detalhes que impressionam e comenta os bastidores de algumas fotos emblemáticas da carreira, enquanto passeia pelas mais de 150 imagens selecionadas para a exposição German Lorca: Mosaico do Tempo - 70 anos de Fotografia. De vez em quando consulta o filho, José Henrique, que caminha ao seu lado, para checar alguma data ou local. “Mais de 90, né... Tem hora que confunde”, brinca.

A mostra que ocupa dois pisos do Itaú Cultural, em São Paulo, até o dia 4 de novembro tem curadoria de Rubens Fernandes Júnior, jornalista, professor e crítico de fotografia, com assistência de José Henrique, fotógrafo e filho de Lorca. A dupla reuniu retratos, fotografias de arte, fotos feitas em viagens pelo mundo e para campanhas publicitárias, além de objetos pessoais como prêmios que acumulou – inclusive, o troféu do Trip Transformadores, recebido em 2016 por sua relevância no cenário da fotografia nacional.

Em uma das instalações é possível ver as principais câmeras usadas, desde a primeira Welta Welti 35 mm até a mais recente, uma Leica digital. “Hoje o digital está aproximando muito do analógico, em termos de qualidade. Mas a foto analógica ainda tem a vantagem de você poder ampliar em muitos metros”, observa.

LEIA TAMBÉM: Bob Wolfenson fala do impacto da tecnologia na fotografia

Lorca relembra com vivacidade os tempos em que a metrópole era menos caótica e permitia captar o instante fotográfico, assim como fazia o francês Henri Cartier-Bresson, um dos grandes nomes da fotografia mundial. “Só dava pra fazer certas fotos em São Paulo porque não tinha tanta gente como hoje”, explica ele, que fotografou muitos lugares do centro, como o Vale do Anhangabaú e a Praça da República.

Filho de imigrantes espanhóis, nasceu em 1922 (mesmo ano em que ocorreu a Semana de Arte Moderna) e passou boa parte da vida morando no Brás, bairro da região central de São Paulo. Aprimorou o olhar e a técnica frequentando o Foto Cine Clube Bandeirante, fundado em 1939, em São Paulo. “Quando comecei, não existia escola de fotografia, só fotoclubes. Cada um se especializava naquilo que gostava, como retratos, portas, janelas, natureza morta. Eu entrei para aprender a tirar boas fotografias dos meus filhos”, relembra. Em diversos trabalhos, os filhos, José Henrique, Frederico e Maria Elena, ainda crianças, aparecem como personagens.

Quando percebeu que seria mais bem pago como fotógrafo, abandonou a área da contabilidade e passou a fotografar para a imprensa e publicidade, sem deixar de lado o trabalho autoral. Ele não sabe dizer se prefere clicar retratos, objetos ou formas, mas responde com a convicção de quem passou por um turbilhão de mudanças em mais de nove décadas de vida: “As pessoas são parte importante da fotografia. Elas mostram que a vida funciona”.

Conheça a história por trás de sete fotos de German Lorca, clicadas em sete décadas diferentes.

 LEIA TAMBÉM: Nenhum nude será castigado

Le Diable au Corps, 1949

“Fiz essa foto logo que aprendi a técnica de solarização [efeito que realça tons de algumas áreas da imagem] com o Geraldo Barros. Ficou razoável. Depois consegui fazer fotos mais perfeitas que essa. O nome foi inspirado no título de um filme francês [de 1923] que tinha a cena de um homem na janela.” 

Só para mulheres, 1954

“Essa era uma casa no Rio de Janeiro que deve ter sido construída na década de 1890. Era uma loja de roupas para mulheres. Eu fiquei muito admirado com as portas, a serralheira.” 

Pickup Jeep Girafa, 1962

“Eu fiz para uma publicidade de picapes. Negociei com o circo para levar a girafa. O transporte foi muito difícil, um homem ficava dando pão para ela ficar parada. Ela sempre levantava o pescoço na hora de mastigar, por isso parece que está posando para a foto.”

Moda Masp, 1978

“Isso foi no vão do Masp, de frente para a vista da [avenida] 9 de julho. Tinha esse letreiro e eu pedi para algumas crianças subirem para fotografar. Hoje em dia, acho que nem poderia fazer isso [risos].”

Lonas, 1984

“Essa eu tirei em Nova York. Lá, os cartazes e as propagandas sempre mudam, dá até tontura de tanto prédio. Estava caminhando pela Times Square e vi essas lonas na rua que, sem querer, tinham as cores da bandeira americana.”

Calçada Volpi Cor, 1999

"Essa era uma calçada de Fortaleza. Fiz um tratamento de cor e as formas ficaram parecidas com as bandeirinhas do [Alfredo] Volpi [pintor modernista]."

Levitação na piscina, 2000

“Essa piscina eu vi na casa de um tio meu. Fiquei impressionado porque não tinha vento nenhum. Estava sem a câmera e fui correndo pegar a que minha mulher levava em viagens para fazer essa foto.” 

Créditos

Imagem principal: Autorretrato 1969/German Lorca/Divulgação Itaú Cultural

fechar