Diferenciada, junta e misturada

por Ronaldo Lemos
Trip #223

Quanto mais oportunidades de interação numa cidade, maior será o seu desenvolvimento

Um estudo do Mit Media Lab apontou que, quanto mais houver oportunidades de interação entre as pessoas numa cidade, maior será o seu desenvolvimento. E quanto mais diversa, tolerante e aberta for, maior será a sua capacidade de atrair talentos

O urbanista Richard Florida ficou famoso por defender uma teoria interessante para a vida e o futuro das cidades. Na sua visão, quanto mais gays houver em uma cidade, maior será o seu desenvolvimento econômico, social e, sobretudo, a capacidade de gerar inovação e atrair empresas de ponta. A presença de gays reforça a existência de uma “classe criativa” e promove um convívio urbano mais aberto, dinâmico e inteligente.

O resultado disso é atrair ainda mais pessoas criativas e, como consequência, atrair também negócios e investimento. Desse modo, como política urbana, tão importante quanto construir estádios, shoppings e grandes empreendimentos imobiliários é também atrair talentos e promover a existência de uma classe criativa. Não é por acaso que talentos globais são atraídos por cidades onde a diversidade é valorizada, como Nova York, Berlim ou São Francisco.

Florida chegou até a criar um “índice gay”, que, junto com outros índices (que medem fatores como o nível de boemia da cidade, ou de tolerância e diversidade), indica a capacidade da cidade de gerar desenvolvimento sustentável, bem como de obter prosperidade no longo prazo. Em um momento em que a competição global entre as cidades acirra-se, descuidar dessa parte é pura burrice.

Para tornar as coisas ainda mais interessantes, um recente estudo do MIT Media Lab (instituição que represento no Brasil) descobriu outra correlação. Quanto mais gente em uma cidade, mais cresce a produtividade individual de cada um. A conclusão, que poderia parecer óbvia, é na verdade surpreendente. Quando a população de uma cidade duplica, a produtividade individual de cada pessoa aumenta 130%. Ou seja, o ritmo de aumento da riqueza na cidade torna-se maior que o crescimento populacional (veja o estudo aqui: http://bit.ly/18R1FOo).

Favela e asfalto

A razão para isso é o aumento das interações “cara a cara”. Com o aumento da densidade populacional, as pessoas encontram-se mais e surgem novas ideias, planos e atividades. O estudo mediu o quanto as pessoas em uma cidade têm a oportunidade de interagir umas com as outras. E criou um índice para medir esse potencial. Não foi nenhuma surpresa quando constataram que quanto maior o índice de interações, maior é o desenvolvimento urbano.

Só tem um problema: o estudo não vale para cidades de países em desenvolvimento, como São Paulo ou Rio de Janeiro. Uma das razões para isso é que vivemos em cidades partidas. O aumento da população nas cidades brasileiras não necessariamente leva ao aumento no potencial de interação entre as pessoas. As razões para isso são várias. Dentre elas, a precariedade do sistema de transporte público. Ou ainda as barreiras econômicas e culturais que criam divisões artificiais na cidade, como favela e asfalto, ou mesmo a segregação de classes, que raramente compartilham o mesmo espaço.

Com isso, o recado dessas perspectivas urbanas é simples: quanto maiores forem as oportunidades de interação entre as pessoas na cidade, maior será o seu desenvolvimento. E quanto mais diversa, tolerante e aberta ela for, maior será sua competitividade no cenário global e sua capacidade de atrair talentos. Em síntese, quanto mais gente diferenciada, junta e misturada, melhor. Se não por razões culturais ou ideológicas, também por razões econômicas.

*Ronaldo Lemos, 36, é diretor do Centro de Tecnologia da FGV-RJ e fundador do site www.overmundo.com.br. Seu e-mail é rlemos@trip.com.br
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