Os graves de Dengue

por Douglas Vieira

Diálogos culturais: o baixista da Nação Zumbi fala sobre a importância dos festivais fora do eixo Rio-São Paulo como locais de resistência

Há quase 30 anos a banda Nação Zumbi, à época liderada por Chico Science, voltava os holofotes do Brasil que consumia música pop para a cena independente de Pernambuco. O tempo passou e, junto com eles, emergiram vários artistas, que foram criando gerações consecutivas de novos e talentosos nomes da música brasileira. O resultado foi o surgimento de festivais locais como o Abril Pro Rock, Porto Musical, Coquetel Molotov, Rec Beat e o interesse cada vez maior de pessoas de outros estados, que passaram a seguir com frequência para Recife em busca de entender de onde vinha tanta criatividade.

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O fenômeno do manguebeat foi e é marcante tanto quanto é histórico. Mas resta muito Brasil para ser visto e os festivais, em um momento de tantos desafios para quem produz cultura, podem ser vistos como verdadeiros locais de resistência cultural.

É assim que Dengue, baixista da Nação, percebe os eventos que ocorrem nas diferentes regiões em que já se apresentaram. Em Belém, de volta ao festival Se Rasgum após 10 anos, ele trocou uma ideia com a Trip sobre a importância de existirem cada vez mais eventos desse tipo espalhados pelo país.

 

Trip. Qual a importância das pessoas do eixo sul-sudeste virem até o Norte para ver um festival, em vez de levar os artistas para lá?

Dengue. Aqui e em outros lugares fora do eixo Rio-São Paulo, tem outra cultura, a cultura brasileira é muito diversa. É massa quando você visita um lugar como Belém, no caso de agora, você troca uma ideia com uma galera, vê as bandas daqui, vê a cena. Acho que só tem a ganhar quem vem de fora. É uma troca muito justa inverter esse caminho. 

Quando vocês, que são nordestinos, tocam pra cá, no Norte, é muito diferente do que rola quando tocam em São Paulo, por exemplo? As pessoas reagem de maneira muito diversas, independentemente da região do país? Seria fundamental que as pessoas viessem até aqui. É tão difícil chegar no Norte, até para a gente que é do Nordeste. A gente mora em São Paulo há 20 anos e tal, mas, mesmo quando a gente estava em Recife, não era fácil. E é importante que se venha. 

Quanto tempo faz que vocês não tocam em Belém? Faz 10 anos que a gente não toca no Se Rasgum, mas a primeira vez que tocamos em Belém foi lá por 1995, por aí. Um festival como esse fortalece a cena, é um evento que está fazendo 14 anos. Recife a gente tem o Abril Pro Rock, o Bananada, em Goiás, esse tipo de festival fomenta também a cena. Não pode deixar de existir, se acaba, tem que ter sempre outro para substituir. 

E neste momento, com o Nordeste e o Norte sendo novamente alvo constante de visões preconceituosas, qual a relevância de um festival no Norte completar 14 anos com bandas do Brasil todo, quatro dias de shows? É chato pensar neste momento sobre isso, porque a cultura está sendo muito bombardeada por causa desse cara [presidente Bolsonaro], mas, impressionantemente, mas o festival parece que cresceu ainda mais. Estou adorando ver isso. Em Fortaleza, tem o Maloca Dragão, que é gigante. Quem tá antenado, vai, frequenta e não se arrepende. É sempre um foco de resistência cultural. 

Créditos

Imagem principal: Renato Reis

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