Um workshop incomum (sobre tapas na bunda)

por Marcos Candido

Mandamos nosso repórter para uma aula de spanking... Também conhecido como a ’a arte erótica de dar tapas na bunda’

“Eu tinha um acervo em casa que não conhecia”, brincou um rapaz, curioso, enquanto manuseava uma espátula de bolo antes de a palestra começar oficialmente. Passava das quatro da tarde e, mesmo com o frio de 5 graus em São Paulo no início de junho, cerca de dez pessoas assistiam ao garoto se divertir com o utensílio em uma sala escondida por uma cortina preta. “Minha cozinha vai ser outro lugar agora”, riu satisfeito. Ainda um pouco tímidos, os demais pupilos que observavam a cena também se levantaram para testar aquele talher 'perversível', como o instrutor Toshi San batizou a espátula da Tramontina.

Pelo segundo ano consecutivo Toshi ministra aulas de spanking em uma feira anual de cultura erótica. Explicando em linhas gerais: esse tal de spanking consiste em dar tapas nas regiões erógenas de parceiros sexuais. Aí valem golpes contra a bunda, nas coxas - e até pés e mãos. Os objetos para esses tapinhas vão de colher de pau, tubo de cola quente, chinelos e até raquetes de ping-pong. “Essa chibata aqui”, aponta Toshi para um longo e fino pedaço de plástico, “eu comprei na Decathlon”. Além de incorrer no mercado oficial, o patrono da aula é dono e fabricante de um acervo considerável de chicotes artesanais fabricados por ele mesmoque são vendidos por até R$ 150 em um ateliê próprio. 

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A coleção sugestiona trejeitos, mas eles não veem: o instrutor é dono de uma voz calma e monocórdica. O tom é sério até quando o professor arrisca uma piada ou outra (todas ruins). No tempo livre, Toshi é administrador de empresas, profissão com a qual se sustenta enquanto mantém, com discrição, a vida sexual que leva. O workshop de spanking que administra foi preparado há um ano, quando técnicas sexuais menos habituais ganharam as massas impulsionadas pelo livro e filmes de 50 Tons de Cinza (2011).

“O essencial é sempre seguir o SSC: São, Seguro e Consensual”
Toshi San, instrutor de spanking

A curiosidade cresceu, mas a maioria ainda necessitava dominar os cuidados exigidos. E Toshi é claro: “O essencial é sempre seguir o SSC: São, Seguro e Consensual”. A sigla é auto-explicativa, mas o palestrante de chibata em riste destrincha para que não fique dúvida: é preciso ter limites e respeitar, incondicionalmente, a vontade do parceiro. É bom deixar claro: também é melhor deixar bêbados e chapados bem longe da jogada. O diálogo é necessário em toda relação sexual, "mas no spanking é essencial", diz.  Não estamos falando de violência aqui. Uma garota da plateia, já adepta antes mesmo de ter uma aula oficial, me explicou que “às vezes aparece uma galera muito heteronormativa, um pouco machista. Por isso tem que escolher bem com quem fazer - e como fazer”. Anotado.

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Relações que utilizam o spanking podem nascer em redes sociais especializadas, como o Fetlife, em casas noturnas preparadas para a atividade ou em qualquer relação em que se queira tentar (o que é cada vez mais comum, dizem os entusiastas). “Há muito do casal em querer ultrapassar limites e estabelecer, a cada relação, um número maior de tapas a ser conquistado”, pontua Toshi, que arrisca uma explicação mezzo-científica mezzo-calabresa: cada golpe contra a bunda aciona uma série de terminações nervosas nas regiões vaginais e do ânus, mas “o corpo cria defesas” e, caso aconteça trocas constantes de ‘carícias dolorosas’, a pele “tende a engrossar”, considera o professor. 

Assim que interrompe as instruções, Toshi chama uma modelo especialmente convidada para a sessão de tapas. Ela é uma ruiva alta, vestida em uma roupa de couro bastante justa, com botas de cano alto. “O ideal é fazer o movimento de um oito deitado, atingindo cada nádega para distribuir a tensão. E é bom praticar tênis”, brinca, recebendo risadas tímidas da plateia. A recomendação é tentar o uso de cadeiras ou sofás que deixem a região erógena fácil de ser atingida e relaxada - assim como o modelo faz, se inclinando sobre uma cadeira de plástico. 

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Quando inicia o movimento, o posto como professor parece justo: ele entrelaça as mãos rapidamente no ar e estapeia, rapidamente, o lado esquerdo e direito da bunda da modelo. Como da primeira vez em que vi Toshi em ação, aquela ação toda me faz lembrar o artista expressionista Jackson Pollock, famoso por jogar tintas de forma aleatória contra uma tela em branco e retirar dali uma pintura única. Arte. No meio do movimento, ele a acaricia entre as coxas. Cerca de trinta segundos depois, ela pede para que o instrutor interrompa a ação. O convite para participar da aula prática é estendido ao restante da sala. Uma participante, até então calada, surge com um olhar o tímido: “Eu posso fazer?”. É recepcionada por tapas na bunda - e, logo após, é ela a autora de golpes contra bundas alheias.

O garoto da espátula, irresoluto sobre qual dos instrumentos de Toshi era o seu mais novo favorito, passou a testar um chicote de couro contra si mesmo. Novamente, os presentes o observaram. Ele olhou ao redor, girou o apetrecho no ar mais uma vez e respondeu: “Esse aqui é uma delícia”.

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Créditos

Imagem principal: Woman spanking a man in the park / Simpleinsomnia @Flickr

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