Um cara que já foi lanterninha, ator de pornô soft e tão duro que teve que vender o cachorro
Você conhece Rocky Balboa, Rambo, Cobra. Mas nunca viu Sylvester Stallone na pele de... Sylvester Stallone, um cara que já foi lanterninha, ator de pornô soft e tão duro que teve que vender o cachorro. Aos 67 anos, o ídolo revela o que pensa e sente por baixo de todos os músculos
Estamos no teatro Palladium, em Londres, para uma das três entrevistas coletivas que tivemos com Sylvester Stallone. Sim, ele mesmo, o ator e criador de Rambo, Cobra e Rocky Balboa. O cara que, ao dar vida a este último personagem pela primeira vez em 1976, despertou, mesmo que sem querer, uma onda global de culto ao corpo e aos músculos, de glamourização dos ringues e, por fim, da conquista dos sonhos através da persistência e de muita, muita luta.
Nem todo mundo sabe, mas Sly, como é carinhosamente chamado por seus fãs, estreou no cinema estrelando o pornô soft Garanhão italiano, em 1970. E sua mãe, Jackie, ganha a vida adivinhando o futuro das pessoas lendo não suas mãos, mas suas bundas (leia matéria na Trip: http://goo.gl/Po8D14). Entretanto, nada disso importa agora – pelo menos para ele. Stallone está de passagem na terra da rainha para promover seu último filme, Ajuste de contas, onde atua ao lado de Robert De Niro. Ele veste um terno e, apesar de distante da forma física de outrora, está bem para os seus 67 anos - botox à parte.
Durante a conversa, rememorou episódios trágicos de sua biografia. Antes de dar seus jabs como Rocky nas telonas, por exemplo, diz que teve de vender o cachorro porque não tinha mais como sustentá-lo. Ele, no entanto, gastou mais tempo para explicar como fez para superar esse e outros reveses e como cada um deles moldou quem ele é hoje do que com lamúrias. Sylvester Stallone, quem diria, daria um bom autor de autoajuda.
A seguir, o ídolo conta como e por que se apaixonou por malhação, da inimizade com Arnold Schwarzenegger, como quase morreu filmando Rambo, das egotrips que surfou e muito mais.
Cuidado com o corpo
“Meus pais tinham se divorciado e malhar foi a motivação que eu precisava naquela época. Um dia, saindo do cinema, passei por um ferro-velho e peguei uns pedaços de carros. Em casa, com os pesos que a minha mãe tinha, juntei tudo e criei algumas anilhas. Mudou a minha vida.”
Boletim vermelho
“Passei por 13 escolas em 12 anos e depois fui banido do sistema escolar. Fui para a Suíça e comecei a fazer teatro no colégio. Eles gostaram e me aconselharam a seguir.”
Lanterninha
“Quando eu estava no colégio, por quatro anos, trabalhei como lanterninha. Fazia testes durante o dia e trabalhava como lanterninha à noite. Ganhava U$ 38 por semana, mas eu estudava os filmes. Assisti a Easy Rider 60 vezes. Estava lá todas as noites, levava um gravador, gravava algumas das cenas e ouvia em casa várias vezes. Depois tentava reescrever a cena como um exercício. Escrevi 33 peças. Todas horríveis. Os protagonistas choravam, caíam e murmuravam na mesma cena.”
Heróis
“O personagem fictício mais icônico para mim foi de um ator que provavelmente ninguém conhece: Steve Reeves, de Hércules. Ele foi provavelmente o modelo de homem mais perfeito que já vi, foi quem me fez ficar interessado em atuação e musculação. Depois foi o Kirk Douglas. O trabalho que ele fazia no filme The Vikings eu achava incrível. Ele se deformava naquela época, era muito ousado.”
Rambo
“O filme foi literalmente amaldiçoado. Havia 17 diferentes roteiros. Alguns eram muito bons. Mas ninguém queria fazer. Tinha passado pelas mãos de Robert Redford, Burt Reynolds, Robert De Niro, Al Pacino... a lista é grande. O primeiro filme mostra um Rambo que não era inteligente, apenas um sobrevivente. Já no segundo ele fazia tudo: ficava debaixo da água, atirava, usava arco e flecha. Ele era como um super-herói. O terceiro foi incrivelmente brutal. Nós estávamos no deserto o tempo todo, por isso eu fiquei tão vermelho, até hoje. Eu me queimei tanto que nunca voltei a ser como era. Era explosão atrás de explosão, e não havia efeitos de computador. As quedas de cavalo eram reais. Eu nunca estive em um filme mais perigoso que aquele.”
"Me tornei insuportável. Olho algumas das entrevistas que fiz e dá vontade de me dar um soco na cara"
Rocky
“O filme nasceu de uma frustração. Eu acho que talvez nós nunca veremos as melhores performances de grandes atores, por conta da grande rejeição que existe nessa indústria. Muitos desistem ou se perdem. Eu passava por isso e quis colocar toda essa frustração de não ser reconhecido como ator no corpo de um lutador... Pois é isto que fazemos: nós lutamos contra os acasos, todos os dias. Uma noite eu vi uma luta na TV, entre Chuck Wepner e Muhammad Ali. Ele estava sendo mostrado como um preguiçoso, sem valor, mas nocauteou Ali no 14º round. Quando vi aquilo, pensei imediatamente: ‘Essa é a minha história’. Fui para casa e comecei a escrever como um maníaco dia e noite. E criei a ideia do Rocky. Um dia, quando fui recusado em um teste para ator, mencionei que também escrevia, e eles se interessaram. Eles leram o roteiro e resolveram fazer o filme. Mas não me queriam no papel principal. Era mais de US$ 1 milhão hoje em dia, mas eu não aceitei. E olha que tinha acabado de vender meu cachorro simplesmente porque não tinha dinheiro para sustentar ele. Depois vendi por US$ 60 mil, mas comigo como Rocky.”
Egotrip
“O Rocky III é autobiográfico. Eu tinha me tornado muito egoísta, vaidoso. E foi isso que aconteceu com o Rocky. Eu abusei do poder. Era uma autoridade em tudo. Se você tivesse uma doença, eu diria a você qual era a cura. Eu me tornei insuportável. Olho agora algumas das entrevistas que fiz naquela época e me dá vontade de voltar no tempo e me dar um soco na cara.”
Arnold Schwarzenegger
“Nós basicamente nos odiávamos, mas de uma maneira boa. Você precisa de um adversário que o faz levantar de manhã e dar tudo de si.”
Robert De Niro
“O De Niro era um ator muito mais corajoso que eu. Enquanto Rocky estava em cartaz, no cinema em frente estava Taxi Driver, em que Bobby tinha aquele corte de cabelo, nariz cheio de sangue... Você precisa de coragem para fazer aquilo. Eu admiro que ele queira sempre seguir adiante. Foi ótimo trabalhar com ele nesse último filme, Ajuste de contas, porque ele é completamente o oposto de quem eu sou. Ele é modesto, calmo, reservado, e eu aprendi muito com ele.”