Quatro fotógrafos escolheram seus retratos mais reveladores e - talvez - mais honestos
“Cada vez que me deixo fotografar, sou tocado por uma sensação de inautenticidade, de impostura. Imaginariamente, a fotografia representa esse momento sutil em que um sujeito se sente tornar-se objeto. Vivo então uma microexperiência da morte.” Instigados pelo pensamento do filósofo francês Roland Barthes, convidamos quatro fotógrafos brasileiros para escolher uma imagem que reflita a personalidade do retratado com maior honestidade
Minha filha por Bob Wolfenson
Há 10 anos, em um momento caseiro, e de sofrimento, o fotógrafo Bob Wolfenson clicou sua filha sendo acariciada pela mãe. “Acho a questão da honestidade na fotografia polêmica e discutível. Sou daqueles que acham a honestidade, no sentido de uma revelação da essência de alguém, algo impossível para uma fotografia.”
Paulo César Pereio por Márcio Scavone
Em 2002 o fotógrafo Márcio Scavone clicou o ator Paulo César Pereio para seu livro Luz invisível. “Não me perguntem se os retratos são as pessoas ou se as pessoas são os retratos. Acho mesmo que é nessa dúvida que a honestidade em fotografia encontra a única chance de existir. Ela faz transparecer a ‘luz invisível’ do retratado. Acho esta foto do Pereio muito feliz em mostrar com honestidade o homem e o ator com a fragilidade humana exposta e exagerada pela imagem do Super-Homem na parede ao lado.”
Regina Casé por Vânia Toledo
Durante a elaboração de seu livro Personagens femininos, em 1990, Vânia Toledo convidou Regina Casé para encarnar uma personagem. A foto recebeu o título de “Nordestina radical”, papel parecido com o que Regina encarnaria em Eu, tu, eles, dez anos depois. “Acho este um dos retratos mais honestos que eu já fiz. É honesto em dois âmbitos, pessoal e simbólico. Regina é uma mulher honesta e se identifica com os valores dessa guerreira nordestina, incapaz de roubar, de trair, que caminha com o peso da trouxa na cabeça, mas a alma leve, ela deixa os valores transparecerem em seus olhos.”
Tom Zé por J. R. Duran
“Um dia tive de fazer um retrato do Tom Zé. A foto estava marcada para as 9h. Ele chegou 5 min antes. Em pouco tempo estava na frente da câmera. Fiz alguns cliques e achei que faltava alguma coisa. Perguntei para ele se não poderia fazer alguns gestos, alguma coisa diferente. Sem ter que pedir duas vezes, Tom começou a emitir sons estranhos e a se agitar como se fosse um animal. Dez min depois a sessão tinha terminado. Foi embora do estúdio às 9h30. Nunca vi ninguém, em um retrato, se mostrar, se exprimir, se soltar, se transformar tanto em tão pouco tempo. Tudo o que tem nesta foto é puro Tom Zé. De verdade, honestamente.”