Prisão até a morte

por Luiz Alberto Mendes

Chico Picadinho

 

Chico Picadinho tem personalidade psicopática. É um grande pesquisador. Leu e estudou tudo o que há de avançado no campo das pesquisas psicológicas. Esta consciente de sua patologia. Esse infeliz companheiro de tantas décadas de sofrimento juntos, é a pessoa mais doce que pode existir. Possui cultura invejável e um diálogo extremamente interessante. Pinta quadros e faz máscaras africanas com a sensibilidade fina do grande artista que mora dentro dele.

Não é psicopata. Tem sentimentos e é um bom amigo. Desenvolve-se bem na convivência prisional. É vendedor profissional bem sucedido dada sua simpatia natural. Esta preso a trocentos anos. Provavelmente morrerá na prisão. Depois de cumprir 10 anos de prisão por assassinato de uma mulher, picada (daí o apelido) em pedaços pequenos e colocada dentro de uma mala (o famoso “crime da mala”), ele foi solto. Trabalhava no Departamento de Biotipologia onde, antigamente, se emitia laudos de caráter psicológico e psiquiátrico sobre os presos do Estado.

Conquistou a confiança dos médicos. Resolveram dar-lhe uma chance. Emitiram parecer favorável à sua liberação em livramento condicional. Após chefiar enorme equipe de vendedores por um período, Francisco tornou a cometer o mesmo tipo de crime.

Levou uma prostituta ao hotel e a estrangulou. Cortou o corpo em pedaços, novamente e colocou em uma mala. Perguntado, respondeu-me que não era por prazer ou paranóia que picava as vítimas. O objetivo era prático. Adequar o corpo ao tamanho da mala para poder dar fim.

Isso caracteriza psicopatia. Não havia sentimentos com relação às vítimas. Eram apenas corpos que ele se desfazia. É algo que, segundo ele, pegou em algumas vezes em que bebeu. No mais das vezes é pacato chefe de equipe de vendas. Deve, neste instante, estar atirado no fundo da Casa de Tratamento e Custódia, sem esperanças de ser solto, a acerca de mais de 40 anos.

O que fazer com esse homem? Creio que ultrapassou os 70 anos de idade. Esta, obviamente, velho. Deixá-lo preso até que morra? Soltá-lo sob o risco que torne a cometer o mesmo crime? Quem assinaria em baixo de um laudo para colocá-lo em liberdade? Por conta de seu segundo delito, o Departamento de Biotipologia foi extinto. Como haviam soltado aquele psicopata? O que fazer com essa criatura humana? Gosto muito dele, tenho profunda compaixão pela natureza cruel que o acompanha.

Acho que nenhum de nós deixou de ser atingido pela sanha assassina. Sempre aparece alguém a nos tirar do sério. Alguns foram profundamente infelizes e se deixaram levar. Não sabemos das circunstâncias, embora esta claro que nada justifique o extermínio da vida humana. Felizmente, a maioria criou contensores que resistiram e resistem fortemente. Minhas homenagens sinceras a esses heróis existenciais. É exatamente porque a maioria se contém que ainda há grandes esperanças de um dia compormos uma sociedade equilibrada e feliz.

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Luiz Mendes

31/01/2012.     

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