Pretinho, pretinho

por Astrid Fontenelle
Trip #231

Um episódio de racismo, por Astrid Fontenelle, jornalista e apresentadora

Astrid Fontenelle, 53, jornalista, é apresentadora do programa Saia justa, no canal GNT. É mãe de Gabriel, um menino negro, de 5 anos

Que fique claro, odeio racistas. É crime. Na minha turma e em todas as turmas que tive todos éramos assim. Na teoria era fácil bradar. Até que em 2012, ao deixar meu filho, então com 3 anos, na porta da escola, ouço um pejorativíssimo “pretinho, pretinho”. Era um loirinho um ano mais velho do que ele. Não bradei. Gelei. Senti na pele a dor que o preconceito causa. Também não chorei, como todos que me conhecem acreditavam que teria feito. Fui firme. Porque, ao mesmo tempo que sangrou, veio a dignidade e o orgulho de ser negra. Todos somos... porra, sou filha de mãe descendente de portugueses e pai com ascendência duvidosa – pelo cabelo durinho, negro passou por ali. E explicitamente sou mãe de um menino negro com dreads no cabelo.

Não bradei porque tive mais pena do menino, que com tão poucos anos de idade já discriminava um igual por ser de cor diferente.

Dias antes o Gabriel tinha me perguntado qual era sua cor, e eu disse “negro”. Ele insistiu. E eu disse “preto”. E ele insistiu mais uma vez. E eu disse “marrom clarinho”. Conversamos sobre cor e raça, na medida da compreensão dele, e ficou tudo bem. E aí dez dias depois acontece aquilo?

Tudo foi muito rápido e eu só poderia exigir da escola (que inicialmente, e diante do choque, sugeriu que leriam livrinhos nas salas de aula) que eu conhecesse os pais do menino.

Foram horas de conversa por telefone. Foi um exercício de atenção para com o outro. Não eram preconceituosos, mas não sabiam de onde teria saído isso. Da cabeça do garoto sozinho?

Que tenha ficado ali, e em mim, a importância de prepararmos nossos filhos pra um mundo de iguais. Onde a única coisa que eu insisto em distinguir é o caráter.

Que o menino loirinho e o meu pretinho aprendam juntos a construir uma sociedade mais justa para todos!

Vai lá Astrid Fontenelle também colaborou com a Tpm deste mês.

 

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