por Fernando Gueiros

O rapaz apavorando o piano tem 26 anos, toca nos maiores festivais pop do mundo e já vendeu 2 milhões de cópias. Rock star? Nem tanto. O cara toca jazz

Imagine o Kurt Cobain bem arrumado e tocando piano... Agora o Sinatra soltando grunhidos com uma camisa de flanela. Difícil? Fica mais complicado se colocar uma pitada de 50 Cent, um choro de Miles Davis. Enrolou de vez... Mas se somarmos a companhia fiel de uma bela brasileira a conta fecha: Jamie Cullum.

O menino prodígio de 26 anos, nascido em Essex, na Inglaterra, tem todos esses ingredientes em sua talentosa alma. A mesma alma que impregnou em seus discos que estão em 2 milhões de lares (sem contar, é claro, outros tantos milhões de downloads) e que colocou o jazz de volta às paradas.

Jazz? Jamie diz que sim, e não nega o explícito apelo pop que o faz ser ouvido por vovós e netinhos. E não deixa de tocar Hendrix em seus shows. O sapateador de pianos – sim, Jamie dança em cima do piano em suas apresentações – arrumou um tempinho para falar com a Trip sobre o que move sua jovem e produtiva mente.

Qual é o segredo para levar o jazz para o público jovem?

É por isso que eu estou aqui. Sempre fui muito ligado ao rock, ouvindo Red Hot Chili Peppers e Nirvana, junto com o jazz. Creio que minha aproximação com o público vem da união de coisas de que eu gosto, coisas contemporâneas, modernas. Isso torna o som mais acessível aos jovens, mais do que o jazz puro. Mas não existe uma fórmula. Se você juntar os dois um deles vai sofrer, entende? O jazz é muito mais complexo, envolve improviso e é mais difícil. O pop é fácil, rápido, divertido, excitante. Acho que juntando os dois estilos você vai perder muito de ambos, então o truque é não ter uma fórmula e sim respeitar os dois lados, saber qual é a fantasia do jazz e qual é a do pop. É preciso respeitar os dois lados, desde 50 Cent e Strokes até Charlie Parker e Miles Davis.

Você disse que gosta de Nirvana. Era grunge nos anos 90?

Sim. 100%. Eu tinha cabelo comprido, andava carregando o meu violão. Fizemos um feriado na escola quando Kurt Cobain morreu.

Kurt Cobain significou muito pra você?

Ele significou muito quando eu estava crescendo. Era um ícone para nós adolescentes. Ele era muito talentoso, um ótimo compositor. Uma espécie de deus. A grande voz da minha geração, assim como para o meu pai foram os Beatles.

Nos tempos atuais falta um Kurt Cobain?

Tentam criar novos ídolos. Temos um cara na Inglaterra chamado Pete Doherty, que era do Libertines e hoje está no Babyshambles, muito drogado, mas um grande compositor. Os jornais tentam vendê-lo como uma das vozes desta geração. Mas  hoje existem muitas bandas no mercado, muitas apresentações na TV. É difícil encontrar um cara hábil suficiente para tornar-se um ícone. Rola muito dinheiro e as pessoas se perdem.

um lado escuro do jazz, onde música e drogas andam juntas. O que pensa sobre o uso de drogas?

Este é um assunto que eu prefiro não falar muito. Se você disser que não gosta de drogas as pessoas vão achar que você é chato e nada experimental. E se você disser que usa drogas as pessoas pensam que você é viciado [risos]. Basicamente é ruim se você tomar e ruim se você não tomar.

O que você escuta de música pop hoje?

Praticamente tudo. Lupe Fiasco, as coisas novas da Beyoncé, Timberlake, 50 Cent, Razor Light...

Que CD não pode faltar na coleção de ninguém?

Kind of Blue do Miles Davis, Revolver dos Beatles e Axis: Bold as Love do Jimi Hendrix.

Você adaptou a “Wind Cries Mary” do Hendrix para o piano. Como foi isso?

Sempre fui muito fã dele. Eu tocava guitarra e quando fui para o piano usei muito da pegada da guitarra – não queria soar como Elton John. Um dia eu sonhei com o encontro de Dr. John [pianista de blues, símbolo de New Orleans] e Jimi Hendrix em New Orleans. Na manhã seguinte eu tive a idéia de fazer esta versão.

Você conhece música brasileira?

Claro! Gosto muito. Sou um grande fã da música brasileira. Gosto de O Rappa, Maria Rita, Tom Jobim, Elis Regina, Egberto Gismonti, João Gilberto, Edu Lobo. Grandes ídolos. Creio que não existe compositor no mundo que não cultue Tom Jobim.

TRIP + A íntegra da entrevista você encontra na versão impressa da Trip, nas bancas.

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