Veja os boletins do repórter especial Fernando Costa Netto, enviado ao Oriente Médio. No mais recente, ele acompanha ataque palestino a um assentamento israelense.
Beit Jala fica há quinze ou vinte minutos de Jerusalém e vem sendo muito castigada pelo exército israelense. Nesta última semana foram três madrugadas de violência e destruição. Entrei na cidade árabe logo depois do almoço, antes dos soldados de Israel fecharem a principal via de acesso. Em alguns minutos, não se via mais carros circulando. Para os automóveis de placas israelenses, um outro trajeto garantia a saída do inferno. A estrada fechada e o movimento de tanques indo e voltando era o prenúncio de outra noite de terror. Nosso destino em Beit Jala era o hotel Everest. Do estacionamento deste lugar eu tinha a informação que teria a panorâmica do vale. E estava certo. Do plano superior podia avistar, sem precisar virar o pescoço, toda Beit Jala. À esquerda, estava o assentamento israelense de Gilo (pronuncia-se Guilo). À direita, via também o ponto de ataque israelense, o check point de DCO. E mais longe um pouco, outra vila árabe iluminava o horizonte. O dono do Everest é um cara simpático chamado Makran Arja. Makram me disse que até antes da Intifada, numa época do ano quente como esta, ele atendia cerca de 300 pessoas no almoço. E os quartos viviam cheios de hóspedes europeus e americanos. Hoje, a sujeira acumulada e os salões apagados sinalizam o abandono e a falta de trabalho. Apenas alguns amigos de Makran que tiveram as casas destruídas se acomodavam provisoriamente em dois ou três quartos.Beit Jala é a maior colônia chilena em Israel. Uma cidadezinha de 10 mil habitantes e antiga como tudo aqui. Bastante acolhedora, tem ótimos restaurantes como o El Pollo, do peruano Issac Zorob, que eu tive o prazer de conhecer na véspera. Issac me preparou um delicioso frango grelhado com homus e batata frita, sentamos à mesa e ele me contou sobre a sua vida antes e depois da Intifada. Às 5h da tarde, já com o sol se pondo, começaram os primeiros tiros disparados de metralhadoras árabes em direção ao assentamento de Gilo. Os palestinos de Beit Jala nunca aceitaram a construção de Gilo ali do lado. E protestavam disparando aleatoriamente contra as casas. O revide vinha no formato de morteiros e tiros calibre 500 mm e 800mm. E não demorou alguns minutos para as sequências de tiros começarem a riscar o céu de vermelho. Do estacionamento do Everest, oito árabes e eu assistíamos mais um pedaço da cidade ser destruído. A própria casa de um deles, depois a do vizinho da frente, o carro do fulano que pegou fogo... Parecia que não se importavam mais. Berravam palavras em árabe, mastigavam semente de abóbora e enchiam os copos com mais whisky. Observei com tristeza a capacidade de adaptação do povo subjugado pela força de um exército. Pessoas acostumadas ao estupro com hora marcada. A cada sequência de tiros, o céu era riscado de vermelho, um espetáculo impressionante. Uma seqüenciazinha só e eles já berravam, e queriam saber se eu tinha feito a foto. Às 11h da noite eu aproveitei uma trégua e fui embora para Jerusalém. De lá, ainda escutei a guerra seguindo até quase de manhã. Shalom, Salam maleikunFernando Costa Netto, com o apoio da Lufthansa, direto da Palestina para o site da revista TRIPFale com ele: fcnetto@uol.com.brMais boletins: Boletim I: Check in - 18/05Boletim II: Paz - a perder vista - 19/05Boletim III: De gaiato no escritório de Arafat - 21/05Boletim IV: Nosso repórter quase apanha - 22/05Boletim V: Conversa com líder extremista - 24/05