Lições da boate Kiss

por Alê Youssef
Trip #219

Uma comissão conjunta entre casas noturnas e a prefeitura de São Paulo em nome da segurança

Após a tragédia no Rio Grande do Sul, a prefeitura de São Paulo convidou os proprietários das casas noturnas para integrar uma comissão cujo objetivo é melhorar a segurança dos estabelecimentos

Logo após a lamentável tragédia da boate Kiss, que abalou o país, a maioria das cidades brasileiras, como não poderia deixar de ser, criou procedimentos mais rigorosos de fiscalização e controle das casas noturnas. Em São Paulo, aconteceu uma inédita reunião entre proprietários de casas noturnas e diversos representantes da prefeitura. Todos se mostraram dispostos a trabalhar em conjunto e integrar a comissão para discutir as questões relacionadas a licenciamentos de espaços e à segurança necessária para seus respectivos funcionamentos.

O prefeito da cidade separou a segurança das casas dos respectivos processos de obtenção de alvará. Não ter alvará e funcionar com o protocolo do mesmo – pois o processo é extremamente lento, corrupto e burocrático – não significa o não cumprimento dos itens de segurança do Corpo de Bombeiros. O bom funcionamento dos estabelecimentos noturnos nos grandes centros urbanos é fundamental para as cidades: seja do ponto de vista da cultura e do lazer – pois a noite e sua diversidade são uma marca forte e de reconhecimento internacional da cidade –, seja do ponto de vista econômico, pois muitos empregos estão justamente concentrados no setor.

O fato é que muitos estabelecimentos procuram há anos a regulamentação e a obtenção de alvarás definitivos de funcionamento, mas esbarram na morosidade da burocracia. Isso não significa que grande parte dessas empresas não se preocupe com segurança. É comum as casas respeitarem os critérios estabelecidos pelo Corpo de Bombeiros, para não colocar nenhum de seus clientes e frequentadores em risco.

O que aconteceu em Santa Maria foi um conjunto absurdo de irresponsabilidades nos critérios de segurança. Uma saída de emergência insuficiente, a utilização de materiais acústicos inflamáveis, o uso de equipamentos com fogo na performance da banda e a péssima orientação da brigada da casa, que impediu a saída das pessoas, geraram a tragédia. Nenhum empresário que se preze pode abrir uma casa com tantas falhas. Essa absurda postura macula a atuação de empresários corretos, que jamais tratariam a questão da segurança com descaso ou omissão.

Pacto civil

É importante ressaltar que a dificuldade de obtenção do alvará não é exclusividade do setor noturno. Muitos outros setores comerciais, estabelecimentos e edificações operam da mesma maneira. E isso é um defeito do sistema. O diálogo em busca de medidas imediatas e concretas é o melhor caminho para termos cidades ao mesmo tempo pulsantes, diversas e seguras. O trabalho em conjunto na comissão proposta pela prefeitura de São Paulo é um grande passo para que no Brasil se construa um pacto em que, por um lado, o empresariado garanta a segurança a todo custo e, por outro, a burocracia das cidades rompa com a corrupção e com a morosidade para conceder os alvarás.

Diante de tanta dor pelas vítimas da tragédia do Rio Grande do Sul, equacionar a questão das licenças de funcionamentos e das medidas de segurança dos estabelecimentos comerciais, noturnos ou não, é o objetivo maior.

*Alê Youssef, 38, é criador do Studio SP e do Studio RJ, um dos fundadores do site Overmundo e presidente do bloco Acadêmicos do Baixo Augusta. Foi coordenador de Juventude da prefeitura de SP (2001-04). E-mail: alexandreyoussef@gmail.com

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