por Kátia Lessa
Trip #177

Conheça Randi Newton, a americana que tornou-se stripper e conseguiu driblar a crise

Conheça Randi Newton, a americana que deu significado inédito à frase “partir para novos desafios profissionais”: após perder o emprego de analista financeira, ela virou a própria mesa, tornou-se stripper e conseguiu driblar a crise

 

Por um breve período, os personagens desta reportagem fizeram parte dos 5,1 milhões de trabalhadores que perderam seus empregos nos Estados Unidos desde dezembro de 2007, quando uma das maiores crises econômicas da história atingiu o país. As contas não paravam de chegar, as geladeiras ficavam cada vez menos lotadas de porcaria, e, pela primeira vez em suas vidas, eles perderam o sono com medo do que viria pela frente. Depois de meses de tentativas frustradas de recolocação no mercado, encontraram a solução onde menos imaginavam: no próprio corpo.

Apesar de já ter feito pontas em séries de TV como The Sopranos e filmes como What we do is Secret, Randi Newton ganhou fama depois que foi demitida de seu antigo trabalho como assistente financeira no banco de investimentos Morgan Stanley. Hoje, ela recheia sua bolsa de marca todos os dias no Rick’s Cabaret, uma casa de striptease em Nova York. Dobrou seu faturamento anual, diminuiu as horas de trabalho e ficou conhecida como a primeira Wall Street stripper, nome de seu blog e título do livro que sai em dezembro deste ano. “Meu emprego antigo era entediante. As pessoas eram chatas, eu trabalhava muitas horas por dia e vivia gorda. Fazia de US$ 30 a US$ 40 mil por ano, agora faço US$ 100 mil”, conta Randi, enquanto rabisca a cifra no caderno da repórter em um papo minutos antes de subir ao palco redondo e rebolar entre as luzes coloridas.

Randi nunca havia pensado em trabalhar na área. “Antes de dançar, fiz bicos como babá, atriz e modelo para folhetos promocionais. Um dia saí com as amigas para encher a cara e recebi o convite para trabalhar como garçonete em uma casa de strip”, lembra. “Certa noite, durante o trabalho, fiquei bêbada porque meu parceiro havia me dado o fora no Dia dos Namorados. Tirei a roupa, encarnei a Demi Moore e as gorjetas aumentaram.”

Lycra e lucro
Para trabalhar no Rick’s Cabaret, considerado de alto padrão, as garotas devem pagar uma taxa que gira em torno de US$ 140 por noite. O que resta fica na lateral das calcinhas brilhantes, única peça que resiste às apresentações calorosas das moças em seus shows solo ou às danças privativas e massagens feitas em frequentadores engravatados. “Já cheguei a fazer US$ 500 em uma noite na qual trabalhei por apenas três horas”, diz a stripper, que hoje prefere guardar seu dinheiro dentro de casa, bem longe dos bancos. “Com a economia do jeito que está, não confio nos bancos. Meu dinheiro fica nos lugares mais estranhos e secretos que você possa imaginar, bem longe de aplicações e investimentos”, dispara Randi, enquanto confere os e-mails em seu smartphone. Diferentemente das outras garotas que trabalham na casa, Randi não esconde sua profissão. “Minhas amigas sabem que eu sou maluca e ficam felizes porque agora tenho tempo para mim e para elas. Antes eu almoçava na mesa do escritório, tinha uma vida deprimente. Hoje não preciso nem me preocupar com a crise. Meu antigo chefe já esteve aqui, pediu uma dança e me deu US$ 200. Disse que eu tenho talento.”

O assessor corporativo da casa, Allan Priaulx, confirma a história. Responsável por receber os pedidos de emprego das meninas, ele conta que depois da crise o número de candidatas subiu de 25 a 30 ao ano para 50 por mês. “São mulheres que trabalhavam em grandes empresas, pós-graduadas. Aqui a crise não existe. Os homens estão sob muita pressão em seus trabalhos, e esse é o lugar perfeito para relaxar e esquecer o mundo lá fora”, diz. Não é o que conta um cliente que estava na casa no dia da visita da Trip e não quis se identificar. Diretor de uma grande empresa de tecnologia e habitué há mais de três anos, ele relata que antes o lugar vivia cheio, mas que ele está muito mais feliz agora. “Meu uísque demorava para chegar e era difícil ter a atenção de mais de uma garota ao mesmo tempo. Hoje elas estão mais dedicadas, você percebe?”, gargalha o executivo, envolto por três mulheres seminuas, inclusive uma brasileira de currículo invejável – com pós-graduação e especialização na área da saúde em São Paulo e cuja conta bancária, segundo ela, já acumula meio milhão de dólares.

MERCADO EM EXPANSÃO
Enquanto estava em Nova York, a reportagem da Trip decidiu colocar um anúncio na internet em busca de histórias de gente que conseguiu superar a crise de forma inusitada. O resultado foi uma caixa de e-mails lotada de desabafos de desempregados e histórias de pessoas que tiveram que radicalizar para manter as contas em dia.

Um deles é Steave J., 41 anos. Marcamos um encontro no Starbucks da Union Square em plena terça-feira, horário comercial. Alto, cabelo bem aparado e fala mansa, ele chegou com a gola do casaco levantada, tipo galã, e surpreendeu: “Antes de conversar, queria deixar duas coisas bem claras. Não posso ser identificado porque ainda não desisti de enviar meu currículo para as empresas, e o que faço hoje é crime. Quero que entenda que não me orgulho nem um pouco desse trabalho. Não vou dizer que seja ruim, mas quero que minha filha se orgulhe do pai dela”. Steave era gerente na indústria da tecnologia de comunicação e foi demitido de um emprego no qual faturava US$ 100 mil por ano, mais bônus.

Hoje, como garoto de programa de luxo, consegue acumular a mesma quantia em um bom mês. Mesmo assim, separado da mulher e da filha, aluga um apartamento mais modesto do que o antigo em uma área discreta do Brooklyn e economiza o que pode para garantir a universidade da filha. “Digo que ganho dinheiro com consultorias, que trabalho de casa como freelancer. Já ganhei US$ 1 mil em uma tarde nesse trabalho”, afirma ele, enquanto pica pedacinhos do guardanapo insistentemente sobre a mesa. E, mesmo sem se orgulhar da nova função, ele está otimista em relação ao governo. “Estamos pagando pela nossa cegueira. Nos livramos de George W. Bush, e isso é o mais importante. Com Obama as coisas vão caminhar para algo positivo. Acredito que vamos nos recuperar e voltaremos a ter orgulho desse país”, finaliza Steave, depois de revelar que topou conversar com a reportagem porque tem uma cliente brasileira em Manhattan que conhece a Trip. E porque precisava desabafar.

Os longos e-mails trocados com Tina A., 26 anos, seguiram a mesma linha. Tina vive em Nova York, bem longe da família que deixou em uma pequena cidade da costa oeste americana. “Não conseguia emprego para pagar um curso de cinema. Aí uma amiga ofereceu um trabalho como “party entertainer”. Eu teria que dançar de forma insinuante e animar as pessoas em festas particulares de empresas. O que eu não sabia é que, se você sai acompanhada desses lugares, pode faturar uma boa quantia [em torno de US$ 200 a US$ 500] por noite. Apesar de ter brigado com meu preconceito, fiz programas algumas vezes no último ano e guardei um bom dinheiro. Mas caí em prantos durante uma noitada, na cama de um artista plástico que gostava muito do meu corpo, e saí de lá com uma oferta para trabalhar como modelo-vivo em seu ateliê. Ele paga bem e eu não vivo mais sob a pressão do desemprego ou do medo de ser pega pela polícia. Mas, se Obama não der um jeito nisso, já sei para onde correr. Acredito que, em tempos de crise, o dinheiro fica com o sexo e o entretenimento”, conclui Tina antes de sair para a aula na academia de cinema.

 

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