por Paulo Lima
Trip #189

Para esta edição, fomos a campo sem roteiros rígidos nem esquemas que amarrassem o time

Neném Prancha, Nelson Rodrigues e milhões de cronistas e filósofos do esporte bretão descansem em paz. Incluindo aí os menos inspirados. Conseguimos resistir bravamente às enormes tentações que advêm da combinação entre Brasil e futebol.

Só um número talvez ultrapasse o dos conterrâneos que se julgam excelentes técnicos e especialistas nas táticas do esporte: o daqueles que se acham entendedores capazes de teorizar com profundidade e elaborar tratados sobre os meandros e os arredores do jogo de bola. E dá para entender. Especialmente nesses dias de T.P.C.

Por aqui, o que fizemos foi deixar correr solto. Ir para o campo sem roteiros muito rígidos nem esquemas que amarrassem o time. Arthur Veríssimo, por exemplo, subiu o morro e acabou encaixando a bola no ângulo, encarando uma pitoresca partida contra um time de “cholas” bolivianas desgovernadas a 4.000 m de altitude, em plena “ex-tação” de esqui de Chacaltaya. A desolada locação, que há tempos não vê o branco das neves, virou palco para peladas com direito a uniformes de saias sobrepostas e chapéus-coco. O abraço de Arthur em uma de suas colegas de time é uma das cenas antológicas que conseguimos colher para esta edição. Também conseguimos desvendar o segredo bem guardado da federação de futebol da Argentina, que tem em seus quadros o escrete campeão do mundial de futebol gay. Ver como era a politicagem da bola na cadeia mais tristemente famosa do Brasil e reaproximar “polícia e ladrão” anos depois da implosão do sistema do Carandiru. Correr atrás do moleque Neymar, no auge da fama, pelas ruas de Santos, conhecer seu pai, um jogador que não chegou a experimentar o gosto (e o preço) do sucesso que pegou seu filho de jeito ainda menor de idade. Um time de anões voluntariosos, uma equipe carioca de pouco brilho que bateu bola com Che Guevara...

DEIXA ROLAR
A diversidade como sempre ajudou a pintar nosso quadro com cores pouco convencionais. Mas há, sim, algo que merece ser dito, ainda resistindo às filosofias de salão mencionadas no início. E, por que não, até seguindo na direção oposta: nosso olhar privilegiou o descompromisso, a vontade de brincar, de pensar menos e de ser mais, de aproveitar plenamente o segundo em que estamos agora, de deixar rolar...

Será por isso que tanta gente se apaixonou pelo futebol representado e reapresentado por Neymar? Será essa a razão pela qual em Teerã ou em Manhattan, quando se fala a palavra Brasil, ouvem-se sempre três ou quatro nomes próprios de jogadores geniais? Teriam a instabilidade congênita, os desvios de todos os tipos e a gestão temerária que assolaram o Brasil durante séculos criado uma potência feita de multidões capazes de desligar daquilo que talvez seja menos relevante e tratar de colocar o coração, a alma e a esperança na ponta dos pés? Recebemos todos doses cavalares do ópio do povo e gostamos?

Vamos ver.

Chega de preleção.

Vamos pro jogo!

Paulo Anis Lima, editor

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