Fumar é humano demais para ser permitido pelos princípios da vida e do bem-estar
Caro Paulo,
Fumar. Tem que proibir mesmo. Não é questão de liberdade individual, é questão de saúde pública. Tratar as doenças desse vício custa muito caro e nós, o povo, temos outras prioridades para o dinheiro público.
Tem que proibir porque somos ignorantes, frágeis e imaturos demais para fazer boas escolhas.
Eu parei porque me proibiram de fumar nos lugares gostosos de ficar. Se me deixassem ainda estaria fumando, apesar do esforço fantástico do queridíssimo doutor Drauzio para me convencer de que cigarro faz mal a minha saúde.
Eu sou a favor dessas intervenções na nossa liberdade, já que a maturidade e a sabedoria estão demorando a nos chegar antes das catástrofes que nossa imaturidade e ignorância podem provocar.
Outro dia debatemos se a ética não devia se apoiar mais na ciência para legitimar escolhas e decisões duras que imponham restrições a nossa liberdade.
Por exemplo, água é recurso finito que precisa ser gerenciado com ciência para poder abastecer toda a população do planeta, sob risco de termos guerras terríveis pelo valioso bem. O que fazer? Esperamos que todos ganhem consciência e amadureçam seus hábitos? Ou tomamos providências como instalar torneiras que fecham sozinhas depois de 15 segundos?
Argumentos apoiados em consciência e virtude levam tempo para vingar no comportamento da sociedade porque são considerados opcionais.
A natureza, que é de onde nós tiramos a ciência, não dá opção, e tudo funciona muito bem e de forma linda, a estética da eficiência.
Por exemplo, não se conhece animal que encha seus pulmões com algo nocivo que o deixará doente apenas por prazer – isso seria, vamos dizer, humano demais para ser permitido pelos princípios que regem a vida e o bem-estar na natureza.
A questão é se a ciência e a natureza não deviam se impor mais na nossa cultura para dar a correta e humilde dimensão do humano na hierarquia de valores de nossa sociedade. Uma revolução cultural inspirada na natureza. Seria animal!
Se isso acontecer, teremos muito mais proibições excelentes e bem-vindas que evitariam um desperdício enorme de tempo e energia e riscos absurdos como os que temos tido na saúde pública, no meio ambiente, no sistema financeiro internacional, na violência urbana.
A proposta seria decidir voltar conscientemente para o tal do paraíso que, diz a lenda, tinha a harmonia, o equilíbrio e o bem-estar, sem alternativa do contrário.
Mas existe uma distância muito grande entre decidir e executar. Por isso, entre o querer (ideal) e o fazer (real), uma lei que proíba ou obrigue seria sempre uma boa ajuda para colocar a gente no melhor caminho. O problema é: quem vai fazer essas leis? Aí a solução vira um problema.
É nóis
Enquanto isso, estou me sentindo muito bem sem fumar. É um bem-estar físico e social.
Mas, quando eu ficar bem velhinho, não prestar para mais nada e estiver morando sozinho na Itamambuca sem ninguém para reclamar de cheiro nem fumaça, aí eu volto a fumar. É nóis: muito burro e humano demais.
Abraço do amigo cheio de virtude sem mérito.
*Ricardo Guimarães, 62, é presidente da Thymus Branding. Seu e-mail é ricardoguimaraes@thymus.com.br e seu Twitter é twitter.com/ricardo_thymus