Competitividade no buraco

por Ronaldo Lemos
Trip #220

O Brasil deveria apoiar de forma incondicional a inovação

O Brasil deveria apoiar de forma incondicional a inovação. Seu único custo seria somar inteligência com vontade política. Inteligência o Brasil tem de sobra. A outra mercadoria é que está em falta

Em um mundo cada vez mais conectado, que está explodindo de ideias, o Brasil está ficando para trás na sua agenda microeconômica. Hoje não faltam inovações que mudam completamente as possibilidades de organização política, econômica e social. Os exemplos são muitos e incluem desde as várias formas de crowdfunding, passando pelo barateamento das impressoras 3-D, até os sites que oferecem compartilhamento de produtos, que vão de carros (Zipcar) e apartamentos (Couchsurfing) a animais de estimação (Petside). O tema ganhou até a capa da revista The Economist em março de 2013, com o título “A economia do compartilhamento”.

Essas são todas mudanças no plano microeconômico, que, em breve, começarão a influir de forma determinante no plano macroeconômico. Só tem um problema: o Brasil não está nem um pouco preocupado com elas. Está acontecendo um fenômeno interessante com o nosso país. Desde meados dos anos 90, o país ficou obstinado com sua política macroeconômica. Obviamente, isso foi muito positivo. Resultou no controle da inflação e em enormes avanços sociais nos últimos anos.

Só que, nesse período, a agenda microeconômica foi deixada de lado. E agora tornou-se um problema. Sem pensar nela, a competitividade do país vai aos poucos sendo erodida. Deixamos de assimilar e aproveitar mudanças como as mencionadas acima. Por exemplo, as impressoras 3-D. De objeto de curiosidade, hoje há cada vez mais gente apostando nelas como motor de uma nova revolução industrial. Isso porque, ao permitir a reprodução de qualquer objeto, elas democratizam um poderoso meio de produção, transformando em empresário quem se dispuser a pagar cerca de US$ 1 mil por uma delas.

CUSTO BRASIL

Mas não é só isso. Grande parte do chamado Custo Brasil é resultante do descaso com a agenda microeconômica. Veja só o exemplo do Chile. O país acabou de passar uma lei que torna possível abrir uma empresa em um único dia, pela internet e a custo zero. No Brasil, abrir uma empresa leva em média 119 dias e custa cerca de R$ 2 mil. Isso joga a competitividade do país no buraco.

Nos últimos anos houve algum avanço na agenda microeconômica, como a aprovação de uma nova lei de falências. Mas isso não basta. Para decolar para valer, o Brasil deveria apoiar de forma incondicional a inovação, o empreendedorismo e a criatividade necessários para que isso aconteça. Deveria começar cuidando da agenda digital: aprovar o Marco Civil da Internet, que está no Congresso, a lei de proteção à privacidade e aos dados pessoais e fazer a reforma da lei de direitos autorais, especialmente para regular o Ecad, como acontece em outros países.

Deveria depois passar uma lei obrigando os cartórios de registro de imóveis a colocar todos os seus registros on-line, de forma padronizada e acessível a qualquer pessoa, inclusive computadores. Só isso traria uma onda enorme de transparência e empreendedorismo ao mercado imobiliário. Permitiria a criação, no Brasil, de sites como o Trulia, que revolucionou o mercado nos EUA, onde é possível saber o preço de qualquer imóvel e as evoluções do mercado.

Esse é só o começo. O mais importante é que essas são mudanças que não custam nada para o Tesouro Nacional e que trariam resultados positivos imediatos. Seu único custo seria somar vontade política com inteligência para pensar o país. Inteligência o Brasil tem de sobra. A outra mercadoria é que está em falta.

*Ronaldo Lemos, 36, é diretor do Centro de Tecnologia da FGV-RJ e fundador do site www.overmundo.com.br. Seu e-mail é rlemos@trip.com.br

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