Para chinês ver

por Ronaldo Lemos
Trip #275

Hoje conseguimos aprender qualquer coisa pela internet e de graça. Basta ter o interesse,
 a curiosidade e a persistência necessária

Quando a gente pensa em internet nos últimos tempos, é muito fácil se lembrar apenas dos aspectos negativos: fake news, manipulação política, polarização, ódio, extremismo e assim por diante. Com isso, acabamos nos esquecendo dos aspectos positivos da rede. Um deles é justamente a possibilidade de estudar outras línguas, em casa, no computador ou, sobretudo, usando apenas o celular. E de graça, sem gastar nada por isso.

Fui lembrado disso há pouco tempo, quando decidi assumir um desafio pessoal: aprender a falar chinês (mandarim, para ser preciso). Para nós, brasileiros, que falamos português, é certamente um desafio lidar com uma língua que tem uma estrutura tão diferente da nossa, bem como uma escrita ao mesmo tempo magnífica e desafiadora. Há pelo menos 170 mil caracteres chineses nos dicionários. Mas a verdade é que aprendendo cerca de 2 mil já é possível ler a maioria absoluta dos textos – com 300 já conseguimos entender cerca de 40% da escrita.

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Em todo caso, ao procurar onde estudar chinês, logo me deparei com uma constatação sobre a qual eu mesmo já escrevi várias vezes aqui na coluna: no mundo de hoje, conseguimos aprender qualquer coisa pela internet e de graça. Basta ter o interesse, a curiosidade e a persistência necessária. Cozinhar, consertar o chuveiro elétrico ou a bicicleta, programar. Matemática, biologia e física. Ou, ainda, conhecimentos de ponta, como inteligência artificial, blockchain e aprendizado de máquina. E é claro: mandarim.

Baixando um aplicativo gratuito no celular (como existem vários, não vou fazer propaganda de nenhum específico – todos são bons), você de repente mergulha no incrível mundo daquele novo idioma. Vai aprendendo a escutar as palavras. Vai se familiarizando com os caracteres. Vai entendendo a pronúncia. E rapidamente um universo imenso se abre.

Diferente só que igual

Primeiro, caem por terra todos os preconceitos. Por exemplo, o de que os chineses falam “cantando”, isto é, usando uma entonação musical na voz. Dá para constatar que esse preconceito e vários outros são fundados na simples ignorância. O que o chinês tem (e o português também tem em menor escala) é o uso de diferentes tons na pronúncia de uma mesma palavra que são capazes de mudar completamente o sentido do que está sendo dito. Mas para pronunciar os tons não é preciso mudar para uma entonação musical, basta usar sua voz normalmente.

O português também tem isso. Vou dar um exemplo. Quando dizemos “vovó”, queremos nos referir à genitora de um dos nossos pais do sexo feminino. Quando dizemos a mesma palavra com outro tom, “vovô”, queremos dizer nosso ascendente do sexo masculino. Esses mesmíssimos tons existem no chinês, inclusive com acentos parecidos. Só que se aplicam amplamente para quase todas as palavras. E o seu significado depende da pronúncia correta, tal como nosso avô ou avó.

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Tudo isso dá para aprender on-line, não apenas com aplicativos, mas também com o YouTube. A quantidade de vídeos ensinando chinês (ou qualquer outra língua) é impressionante. E ninguém precisa fazer isso sozinho. Há várias comunidades de estudantes do mundo inteiro que se organizam por meio de fóruns on-line. Há inclusive sessões de videoconferência, marcadas por Skype ou Hangout, para a prática de conversação.

Ao resolver me dedicar ao mandarim depois de tantos anos desde a última vez que decidi estudar um idioma, notei como o mundo mudou. Antes, aprender uma língua era uma tortura que se materializava em aulas que aconteciam duas vezes por semana em um horário marcado, geralmente frequentadas por pessoas que preferiam estar em outro lugar, longe dali. Hoje, estudar uma nova língua pode ser um prazer. O desafio é muito mais interessante e você está no controle. Isso me dá certamente a esperança de que o mundo pode ser muito mais conectado.

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