Câmera na cabeça, surf no pé

por Diogo Rodriguez

Munido de Lomo e Super 8, Marcos Sifu filma um programa de TV enquanto viaja pelo mundo

Marcos "Sifu" Menezes é um dos mais conhecidos free surfers do Brasil, craque nas manobras extremas. Como não participa de campeonatos, seu trabalho é surfar da maneira mais radical possível e registrar boas imagens de suas acrobacias. Porém, outro lado de Sifu está por aparecer, que é sua vocação artística. Fã de lomografia (fotografia tirada com uma câmera analógica simples), Sifu já fez stencil em pranchas e agora alia seu treinamento visual com o surf.

Em companhia do amigo surfista Mickey Bernardoni, o carioca viajou por diversos países das Américas para registrar as ondas e os locais visitados, usando filmadoras digitais, Super 8 e a boa e velha Lomo. Em conversa com a Trip, Sifu contou que eles e Bernardoni estão gravando um programa de surf trip com uma linguagem “mais artística”. Com imagens muito coloridas e uma visão de como cada país é, o projeto, que ainda não tem nome, “não é feito só para surfista, é para lazer mesmo, o cara chegar do trabalho e sair com a sensação de que ele viajou”, diz o free surfer. Visitas a Califórnia, México, Nicarágua, Peru, Chile, Galápagos, El Salvador já foram documentadas; os dois surfistas pretendem ainda passar por Nicarágua e voltar ao México para fechar o ciclo da primeira parte do programa, ainda sem previsão de exibição na TV.

Como vocês resolveram fazer os vídeos?
A gente não tinha dinheiro para fazer os vídeos, todo mundo queria cobrar. Aí a gente disse, “vamos nós dois, vamos revezar”. Rendeu pra caramba, a gente fez altas imagens. Foi muito legal. A gente não surfou junto nenhuma vez, mas voltamos cheios de imagens. Aí surgiu a ideia de fazer por conta própria. Só saiu na internet, por enquanto, mas já deu a maior repercussão. A ideia é fazer um filme no final, alguma coisa entre 30 e 45 minutos. Ainda tem dois destinos que pretendemos visitar para finalizar a primeira fase do projeto. O intuito é levar para a televisão. Eu queria que fosse para o cinema, mas é um passo maior que as pernas. A gente tem muito o que aprender. As imagens têm qualidade, mas não temos o conhecimento do que passar para um público que não surfa. Por enquanto a gente tem de passar pela televisão para ficar conhecido, como fez o Surf Adventures, o Jackass.


Vocês não pensam em fazer no Brasil?
Não, porque aqui todo mundo já conhece, mas tem viagens maneiras.

Você já fez stencil em prancha, gosta de fotografia; existe uma preocupação artística ao fazer as imagens do projeto?
A gente está sempre buscando fazer uma negócio mais artístico, menos cru, menos reality [show]. Exploramos diferentes câmeras, ângulos, lentes, frames, usamos câmera lenta. Usamos todos os recursos do cinema para fazer o programa. O vídeo (acima) é só um teaser. O programa tem entrevistas, tem 22 minutos. Em El Salvador, por exemplo, encontramos um cara que não tem uma das pernas e ele surfava bem pra caramba. Conversamos com ele, tentamos fazer uns ângulos diferentes, O Trekinho foi de convidado, levou a câmera para a água e filmou num ângulo “perseguição”, rabeando o cara. Temos a preocupação de mostrar um ângulo diferente para fugir do lance jornalístico, as imagens falam por elas.

Vocês estão negociando para lançar o programa na TV?
A gente ainda está prospectando. Tem horas em que eu penso que o negócio está engessado, mas várias coisas vão surgindo, a gente tem o apoio de uma agência de viagens. Queremos viajar o mundo inteiro. Essa primeira série foi feita só nas Américas Central, do Sul e do Norte. Finalizando essa, queremos partir para outro continente. É uma versão moderna do Surf Adventures. Uma versão com dois caras, viajando, com a visão deles, do jeito que dá – e a gente viaja no maior perrengue mesmo. Tem hora que dormimos no chão, em oficina de prancha, temos que pegar ônibus, carona,. Não é um negócio todo certinho com a maior equipe de produção, pelo contrário: são dois caras carregando tudo e revezando na filmadora. É uma câmera na mão e o surf no pé.



Com que histórias interessantes vocês se depararam nessas viagens?

Essa história do cara sem uma perna é comovente. Ele contou que uma vez estava num pico que era muito localista e um cara chegou nele querendo bater, “não pode longboard aqui”. Ele deu com a perna mecânica na cara do cara [e disse] :“Olha aqui porque eu to com longboard. Nem todo mundo que tá num long tem a saúde que você tem” e deu maior lição de moral no local. Outra coisa legal é que a gente visita os pontos turísticos do lugar. Na Costa Rica, fomos no vulcão, numa cachoeira bem legal, que sai direto do vulcão com água quente. Não tem roteiro. Viajamos e fazemos na hora o que for legal. Em cada lugar, a gente busca um pouco do contexto. Em El Salvador filmamos um pouco da pobreza por causa dos anos de guerra civil, na Califórnia conversamos com os “homeless” [sem-teto],  na Costa Rica foi mais turístico, como em Galápagos, e no Equador mostramos o lugar como ele era. Tentamos mostrar um pouco da comida do lugar, como é. É um guia de surf para o surfista ter uma noção do que vai encontrar fora, as melhores ondas. Na Costa Rica a gente dirigiu 3600 quilômetros em 20 dias, atravessou a fronteira a pé até o Panamá, chegou lá não tinha onda. Não tem tempo ruim.

Como você começou a se interessar por fotografia e pela Lomo?
Acabou de abrir uma loja de Lomo no Rio de Janeiro e eu tô amarradão, até comprei uma faz pouco tempo. Sempre fez parte da minha vida. Ela não muda por causa da Lomo, mas eu sempre levo para onde eu estou. Vou retratando minha vida dessa maneira porque eu acho [fotografia] digital tão chata, tão normal.  Tudo é digital hoje em dia e o analógico passa um negócio mais legal, uma essência mais legal de vida. Eu quero ter minhas lembranças retratadas em analógico, não em digital. Na Califórnia, usamos bastante a [câmera] Super 8

E a Lomo teve alguma influência na hora de filmar?
Teve. Influenciou muito na maneira como a gente faz esses programas. Com a Lomo, eu “encano” em usar diferentes tipos de filme e revelação e tenho resultados diferentes nas cores e no contraste. Quando a gente filma, tenta fazer dessa mesma maneira, fazer parecer com Lomo – mais saturada, com mais vibrantes.

Os programas estão prontos?
Temos três episódios filmados, um está pronto e editado.

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