California Dream

por Redação

E os brasileiros vivendo nos EUA, como estão lidando com o terror se tornando algo tão próximo e presente?

E os brasileiros vivendo nos EUA, como estão lidando com o terror deixando de ser um artigo perdido nas páginas internacionais do jornal e se tornando algo tão próximo e presente? A carta abaixo foi enviada por um jovem chefe de família brasileiro:E aí, Paulo? Como vai? Desde junho de 99 eu e minha familia estamos morando na Califórnia.Aproveitando o fato de ter uma filha americana e uma mulher com Green Card, saí fugindo do sobe-e-desce da nossa economia, da insegurança de Sampa e do trânsito infernal da Bandeirantes. Aqui, passado o tempo do sub-emprego, encontramos a estabilidade do dólar ,a segurança e limpeza quase total de Sta Mônica e, para irmos à praia, andando levo menos de 10 minutos. Tá certo, não é Maresias e muito menos Ilha Bela, mas a 10 minutos... Minha filha parece estar vivendo num seriado de TV. High school, pólo aquático, boyfriend, prancha de surf, snowboard, enfim, tudo que pediu a Deus. O moleque, virando teenager, cabelo espetado, matando os gringos no 'soccer' e começando a arrepiar no snowboard. Eu trabalho de assistente de marketing numa empresa e minha mulher, num dos shoppings mais bacanas do pedaço.SONHO DE VALSANão pegamos freeway e os trabalhos e escolas são a 10 minutos de casa. Saudades, é lógico que sentimos, mas quando aperta, coloco um Gil ou Paralamas, ou corro até a loja de produtos brasileiros e compro um Sonho de Valsa e farinha de mandioca. Todo dia me informo lendo o JT pela internet, pelas notícias que tenho lido, continuo achando que fiz muito bem em fugir daí. Não consigo imaginar minha filha de 17 anos caindo na noite de São Paulo. Lendo uma de suas crônicas, sobre os atentados, achei que vc gostaria de ouvir a opinião de quem está aqui, mas vê a situação e a atitude (eles aqui adoram essa palavra) deles com os olhos de quem veio daí. Bom, passado o choque inicial, os gringos começam a mostrar sua verdadeira cara. Um dia após os ataques, as ruas já começaram a ficar cheias de bandeiras - hoje a cada 10 carros 11 tem bandeira, lojas, casas, restaurantes. Parece Copa do Mundo no Brasil. Só que a seleção dos caras é o exército. Cada turma que embarca, choro, banda e tome 'God bless America'. Parece a gente, preocupados com a unha encravada do Rivaldo.Ninguém quer saber porque meio mundo tem ódio mortal deles. De uma hora pra outra 95% dos caras concordam com tudo que o W. Bush fala, o mesmo que nos seus primeiros dias de governo disse: 'O que é bom para os EUA é bom para o resto do mundo'. Vibram, enquanto tomam cerveja na frente da TV vendo as bombas destruírem o que já não existe. Filme que eles já viram em 1991 quando a CNN mostrou ao vivo a destruição de Bagdá. Só aqui em LA, mais de 50 descendentes de árabes já foram atacados. Liquor stores incendiadas, restaurantes apedrejados e crianças hostilizadas nas escolas.Muros pixados com frases tipo 'morte aos árabes' são vistos logo cedo, pois a turma que apaga vem correndo logo atrás.GATINHAMinha manager, uma gracinha de menina, loirinha, loirinha, cantora de hard rock nas horas de folga, mostrou suas garras ao me dar um desenho do velho 'Tio Sam', só que em vez do dedo indicador chamando os americanos para alistarem-se no exército, o dedo que está erguido é o do meio com dizeres impublicáveis contra os que estão contra eles . Ou seja de gatinha a urso bravo. A paz americana está ameaçada como nunca esteve, a guerra chegou aqui. O céu na Califórnia continua azul, mas agora ficamos procurando para ver se não tem nenhum Boeing despencando. Já não se encontram máscaras de gas em nenhuma loja do pedaço. Qualquer cara barbado, o nosso tradicional 'turco', está tendo que andar de olho aberto. Estou me sentindo naquela de 'se ficar o bicho pega, se correr o bicho come'. Calçadão de Venice com anthrax no ar ou Faria Lima com trombadão, pois trombadinha era quando eu estava por aí, e imagino que os caras cresceram. Assalto a mão armada ou bactéria vindo junto pelo junk mail ? No século 21 e os caras com cabeça na Idade Média.Bom, espero que na pior das hipóteses, possa escrever pra TRIP sobre a fuga de carro via México e América Central.Abraços a todos, ainda são e salvo
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