Cheio de coragem, atravessei o desestimulante paredão de PMs que acintosamente fechava a frente do MASP
Marcha da Liberdade
Sempre pensei que o proibicionismo tinha mesmo que acabar. Convidado e curioso com relação a essas pessoas que organizam as Marchas do Coletivo DAR, fui conferir. Puxa, até que enfim alguém enfiava a cara! Pensava: vamos deixar de covardia agora. Alguma coisa esta começando, que bom...
Cheio de coragem, atravessei o desestimulante paredão de PMs que acintosamente fechava a frente do MASP. Aquilo bloqueava somente os menos determinados. Parecia um filtro. O povo que fazia a diferença estava todo lá dentro. A pressão era ostensiva, estávamos cercados por soldados armados. Alguns jovens pintados ou caracterizados e uma pequena banda aquecendo os couros.
Era encantador. Pessoas de diversos movimentos sociais, com os mais variados protestos e reivindicações, se entre comunicando. As redes sociais em pleno pulsar. Aquilo me sabia ao que havia de melhor: pessoas reais se encontrando. Lembrava manifestações dos anos 60 quando se falava do poder do amor e da flor.
Era qual estivesse entrado em outro planeta. Ninguém estava fumando, havia disciplina. Panfletos de todas as organizações participantes estavam sendo distribuídos. O grupo pela criminalização da homofobia; o grupo em defesa de nossas florestas; pessoas que apoiavam os Bombeiros do Rio; pessoas que brigavam com o prefeito; ciclistas protestando contra a morte de ciclistas; havia papéis que falavam em Democracia Direta; as chamadas “vadias”; contra a violência policial; claro, grupos pela liberação e regularização da maconha...
As roupas eram soltas, algo de reggae e Bahia no ar. Era uma celebração. Uma vontade de liberdade que como chicote elétrico estalava no ar. A velha Paulista se encheu de palavras, sons e cores. O carro da polícia e os policiais seguiam na frente como um abre alas. Atrás, as faixas, cartazes, bandeiras e o povo gritando palavras de ordem, com aquela faixa enorme “Marcha da Liberdade” tomando a avenida toda. A pequena banda botava fogo nos ânimos já exaltados.
Os cartazes se sucediam muito criativos: “A RUA É NOSSA”; “queremos direito de criar referendos”, “Apologia é o caralho!”, “Cultive seus Direitos”, “Legalize já”. Havia humor: “Se os maconheiros derem as mãos, quem é que vai enrolar o baseado?”. Poesia: “Balas, só de goma/ Bomba, só de chocolate/ Explosão, só de alegria”. Protestos contra a violência policial preponderavam. Aquele povo havia sido agredido pela polícia há pouco tempo atrás, na Marcha anterior.
Cada vez fica mais claro para mim que não temos como impedir o acesso às drogas. O fracasso da War of Drugs do governo americano, com um gasto de aproximadamente 500 bilhões de dólares, sem que o consumo de drogas fosse alterado, deixa esse fato fora de dúvidas.
Liberar e regularizar o uso e o comércio lícito da maconha é uma necessidade que se impõe. O contrário é continuar com a corrupção policial e política; o tráfico clandestino e também o trafico de armas; as milícias que têm matado mais que a peste negra; o domínio territorial por quadrilhas organizadas; e o avanço na criminalização das populações mais pobres.
Acabei, ao meio da Marcha, caindo para dentro e participando como mais um dos que protestavam. Não era “coisa de maconheiro”, como estavam dizendo. O pessoal era muito sério e quase todas as organizações que lutam por direitos não respeitados estavam ativas na Marcha. Tornou-se um evento e tudo contribuiu para que fosse raivoso, mas pacífico e ordeiro.
Estou convencido e pretendo participar de todas as demais Marchas que se sucedam, inclusive da Parada Gay. Talvez seja mesmo este o caminho. Já não podemos dizer que não temos nada com isso.
**
Luiz Mendes
19/06/2011