Aqui é o meu Brazil

por Henrique Goldman
Trip #197

Aqui abundam bundas, sol e maracujá – itens que contam muitos pontos no meu Índice...

Chatices à parte, o Brasil é o país mais carinhoso e alegre que eu conheço. Aqui abundam bundas, sol e maracujá – itens que contam muitos pontos no meu Índice Pessoal de Desenvolvimento Humano

Depois de quase dois anos sem vir ao Brasil, cheguei para uma breve visita a São Paulo na semana passada. Mais do que uma simples viagem de trabalho, este é quase um refúgio – não só do insuportável inverno londrino, mas também da enorme deprê que assola a Europa. A média de desemprego na Espanha, na Irlanda, na Grécia e em Portugal está em torno de 20%. O Reino Unido também escorre pelo ralo e paira no ar um clima de fim de feira histórico.

Não é só uma crise econômica. Essa é uma crise de fé no modelo democrático ocidental. Tony Blair invadiu o Iraque contrariando as leis internacionais e a própria opinião pública, mas não pode ser legalmente punido. A Itália é governada por Berlusconi, um gângster comprovado, digno da República das Bananas. A nojenta Constituição suíça permite aos bancos do país lucrar muito escondendo dinheiro que facínoras roubam no mundo inteiro – do Haiti à Tunísia. O imbatível e onipresente “sistema” tão bem retratado no Tropa de Elite 2 não é um privilégio nacional. Dá medo pensar no que pode vir depois disso.

Nesses últimos tempos, coincidindo com a crise, aumentou demais na Europa o interesse por tudo e todos relacionados ao Brasil. Na imprensa, na televisão, na internet e nas conversas com amigos repete-se a mesma ladainha: “O Brasil mudou muito, deixou de ser emergente e agora é emergido. O Brasil não é mais um país do futuro e sim o país do presente”. Com tanta euforia alardeada diariamente, desci do avião em São Paulo com medo de não conseguir reconhecer meu próprio país.

Confesso então que foi um alívio enorme desembarcar em São Paulo em um aeroporto detonado e me defrontar com a ineficiência preguiçosa dos maltrapilhos entregadores de malas. Que delicioso é o cheiro podre emanado do rio Tietê – a cidade continua maravilhosamente feia e suja. Que bom é sentir o familiar medo tanto de assaltantes como da polícia. É reconfortante constatar que, mesmo tendo melhorado um pouco, velhos hábitos relutam em morrer: o ensino público continua péssimo e o país continua a ser violentíssimo, profundamente injusto com a maioria da população e irremediavelmente corrupto.

BUNDAS E PÃO DE QUEIJO

Com tudo isso, sinto uma vontade enorme de voltar a viver aqui. Porque, chatices à parte – como por exemplo dar CPF e RG cinco vezes por dia e pegar comanda em porta de padaria –, o Brasil é o país mais carinhoso, alegre e engraçado que conheço. Porque aqui abundam bundas bonitas (e trocadilhos), sol, maracujá e pão de queijo. E esses itens contam muitos pontos no meu IPDH (Índice Pessoal de Desenvolvimento Humano).

Tomara que as benesses prometidas por este novo ciclo de progresso melhorem de verdade a vida de muitos brasileiros. Mas tomara também que o Pré-sal não transforme o Brasil em um país sério. Eu moro num há 20 anos e juro: não vale a pena. Precisamos ficar atentos.

 

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