As nádegas são únicas: só nós as temos entre todos os primatas. E foram milhões de anos de evolução para que elas se desenvolvessem
A bunda não existe desde sempre. É o que defende o escritor, pesquisador e professor de linguística Jean-Luc Henning, em seu Brève Histoire des Fesses (Breve história das nádegas). Inédito no Brasil, o livro defende que só quando nossos ancestrais desceram das árvores nas savanas da África e ficaram eretos é que a protuberância traseira se desenvolveu. Somos os únicos primatas possuidores de bunda, e não foi fácil: foram milhões de anos de evolução para que as nádegas se desenvolvessem.
Quem conta a história é o cronista Humberto Werneck, num texto de seu livro Sonhos rebobinados, de 2014. "Mesmo sem saber quanto de sua sapiência se deve à teoria, haurida no ambiente monacal das bibliotecas, e quanto à prática, consolidada em talvez deleitosos trabalhos de campo, o Jean-Luc pode ser apresentado como o mais saliente bundólogo de que se tem notícia", anota Werneck, que diz que tanto quanto o cérebro é a bunda que nos distingue na massa das 193 espécies de primatas existentes sobre a Terra. "Com o devido respeito ao imortal arquiteto e aos Poderes da República, o invento mereceria a homenagem de um Niemeyer que plantasse, no Planalto ou alhures, não Câmara e Senado, mas dois Senados justapostos", comenta.
Outra investida francesa é o livro e documentário La Face Cachée des Fesses (O lado oculto da bunda), parceria de Caroline Pochon e Allan Rothschild. O projeto também parte do passado, quando começamos nossa caminhada em direção ao surgimento da bunda, e passa por temas como a arte francesa (derrières pintados por Courbet, Matisse, Degas) e a publicidade. Também o surgimento do feminismo no fim do século 19: uma das práticas mais sexistas de então era o uso de fauxculs pelas mulheres, um aparato usado por baixo das roupas para aumentar a bunda.
Política e bunda sempre foram indissociáveis na França. É só lembrar que uma das fotos mais famosas da história da bunda é de uma filósofa e escritora feminista, Simone de Beauvoir. E seu marido, o filósofo Jean-Paul Sartre, enquanto erigia as bases do existencialismo, encontrou tempo para anotar o célebre aforismo: "A pátria, a honra, a liberdade, nada existe: o universo gira em torno de um par de nádegas".