por Luiz Alberto Mendes

O Rato

 

Foi de repente que comecei a escutar um barulho estranho de madrugada na cozinha. Aqui em casa a cozinha é embaixo de meu quarto/escritório. Seriam ratos? E era. Atrás do fogão e da geladeira havia bastante fezes de rato. E não era camundongo; era desses maiores, rato-de-sotão, como o chamam. Dai para a frente, toda madrugada aquele barulho. Ele pulava para dentro do saco de ração de Chicão (meu cão) e levava ração para dentro do fogão.

Há cerca de um mês, chacoalhei o fogão e caiu um monte de fezes e ração já em pedaços partidos. Estaria ele morando ali? Bati nas lateral do fogão, abri o forno, bati, bati, fiz todo o possível para assustá-lo. Não havia rato lá, só fezes e restos de ração. Procurei na geladeira e nem isso, só no chão havia fezes. Minha cozinha virou um banheiro do rato; para todo canto e embaixo de tudo havia dejetos do rato. Aquilo era nojento e eu não sabia o que fazer. Outro dia acordei de madrugada e fui pé ante pé com um cacete na mão, atrás do "abençoado". acendi a luz e ele correu de debaixo da geladeira para debaixo do fogão. Meti o cacete e errei; ele era grande, preto, tinha um rabo enorme e era muito mais ligeiro que eu. Puxei fogão. ele correu para debaixo da pia, errei a cacetada novamente e lá se foi um copo que estava na pia e caiu no chão. Aquele roedor estava "me tirando"! Fiquei "puto" com ele; viramos inimigos mortais, agora seria ele ou eu nessa casa!

Primeiro me aconselhei com gente experiente e fui olhar debaixo do tanque de lavar roupas. Não deu outra: o danado havia construído um túnel de debaixo do tanque, que é do lado de fora, para dentro de minha casa, embaixo da pia. O pedreiro tapou o buraco pelo lado de fora com cimento mais duro possível. Pensei ter me livrado do problema. De noite, a mesma bagunça de sempre: fezes, eu atrás do rato que me dava bailes e fugia pra debaixo da pia. Eu enfiava o pau, mas ele estava no buraco. O canalha estava morando comigo na minha casa! Fiquei possesso, mas o que fazer? Aconselhado, comprei dessas folhas colantes que se põe no caminho do rato. Pequei uma lagartixa, mas nada do miserável. Na noite seguinte, novamente bagunça e outra lagartixa no papel colante. Desisti antes de acabar com a população de lagartixa da região. Comprei veneno; umas pedras sólidas para ele roer. Amarrei no pé do fogão e na geladeira, com medo do Chicão ir fuçar, coloquei ele para dormir na casinha dele (ele dorme aqui no sofa). Dia seguinte, os pedaços estavam inteiros e dejetos de rato, o saco de ração furado e ração quebrada pelo chão. Comprei outro veneno, um granulado, assim rosa. Misturei com a ração e joguei em baixo da pia. Noutro dia, ele não havia dado nem atenção. Comprei veneno de contato e coloquei o pó onde ele passava. De manhã não havia os pés dele na poeira envenenada, só fezes e restos de ração no chão. Aquilo foi me enervando, me deixando louco. Sentia-me inteiramente impotente contra aquele animalzinho tão mais esperto que eu. Tracei um  plano de combate e coloquei em execução. Comprei uma vasilha plástica grossa e consistente que cabia um saco de ração. Comecei a esconder a vasilha de alimentação do cão no armário e não deixar nenhum tipo de comida fácil para ele. Dois dias depois, comecei a amassar ração com veneno, prender em bolinhas de plástico e jogar em baixo das coisas. Demorou um pouco, mas comecei a notar as bolinhas plásticas estavam furadas: ele estava escolhendo entre ração e veneno. Fiz outras bolinhas e sujei com o veneno de contato. O animal foi fundo, chegou a rasgar uma bolinha: estava com fome. Ontem cheguei do dentista, abria porta e vi: ele estava na escada, subindo para o quarto. Parado, esquisito e estranho. Peguei o cacete e parti para cima. Acertei o rabo que se partiu e ele pulou para o chão, correndo para debaixo da geladeira. Puxei, ele havia sumido. Puxei tudo e achei que o perdera novamente. Olhei em baixo dos móveis para desencargo de consciência e lá estava ele. Havia acompanhado quando puxei a geladeira. Dessa vez acertei. Ele ainda correu e eu atrás enfiando o pau. Chicão pegou quando ele correu para o quintal. Jogou no chão já morto. Coloquei no saco plástico e joguei no lixo; a sensação foi de vitória suada e sofrida; um mês de lutas. Hoje dormi sossegado, acordei de madrugada e juro que senti falta dos barulhos do rato, sei lá porque. A natureza humana é tão estranha...

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Luiz Mendes

15/09/2013       

  

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