A bolha do plástico

por J.R.Duran
Trip #178

Tenho, já há algum tempo, sérios problemas com plástico

Tenho, já há algum tempo, sérios problemas com plástico. Com sacolas de plástico. Parece que, cada vez mais, estão em todos os lugares. Que se multiplicam, que aparecem nos pontos menos pensados. Na copa de uma árvore alta, levada pelo vento e abraçada a um galho. Isso sem contar os lugares normais. Lugares em que nos acostumamos tanto a perceber a interferência do lixo que, hoje em dia, a paisagem não fica completa sem a presença de um saco plástico (azul, branco leitoso?) a interferir no olhar. Na beirada da boca de lobo, no meio-fio da calçada, meio enterrada na praia como se fosse uma água-viva sintética. O saco plástico é um companheiro silencioso que nos acompanha pela vida. Que se antecipa à nossa presença. Que nos espera em qualquer canto, apenas para lembrar da preguiça e falta de imaginação com que o ser humano circula pelo mundo.


Ultimamente o problema tem se agravado. Cada vez que a moça (ou o moço) do caixa, do outro lado do balcão, se inclina procurando a sacola e ouço aquele barulhinho de plástico fininho, sinto um arrepio nas costas. Um nó no estômago. No supermercado, na padaria, na banca. O gesto é o mesmo, a reação também. Agradeço e digo que prefiro carregar o que comprei embaixo do braço. O sorriso que recebo, normalmente, sugere que sou um idiota. Sorrio educadamente, também, e não perco tempo em explicar o que me aflige.

Cada vez que a moça do caixa procura a sacola e ouço aquele barulhinho de plástico fininho, sinto um arrepio nas costas

Na verdade me sinto um idiota quando falo, ou lembro, da quantidade de anos em que os malditos saquinhos plásticos vão demorar para desaparecer da nossa vista. Se é que algum dia desaparecerão.
Um saquinho plástico, daqueles que embalam os pacotes do supermercado, demora mais de 500 anos para se decompor, sumir, se desintegrar. E daí, qual é o problema? Bem. Um saquinho aqui (no supermercado), um saquinho ali (na feira), outro não sei onde (o jornal que chega todos os dias em casa) e você vai descobrir que você é uma ilha cercada de sacos plásticos por todos os lados. Leio, em um caderno especial do jornal O Estado de S. Paulo, que são produzidas 18 bilhões de sacolas plásticas por ano no Brasil. De acordo com as estatísticas, um brasileiro manuseia, em média, 66 sacolas plásticas por mês. Junte os pedacinhos, faça as contas e veja o tamanho da encrenca.

Gesto Mínimo
Em janeiro deste ano, em Nova Délhi, capital da Índia, os sacos plásticos foram banidos por lei. Vacas e outros animais comiam o material e morriam asfixiados. Os bueiros ficavam entupidos com os sacos, e ajudavam a aumentar as inundações na época das monções. A alta corte de justiça da cidade baniu as sacolas em mercados, lojas, hotéis, hospitais e shopping centers. Quem contrariar a proibição está sujeito a uma multa de mais de (no câmbio de meados de maio) R$ 4 mil. Na tentativa de melhorar a imagem diante do público, as sacolas estão ficando cada vez mais finas. Como se a espessura fosse suficiente para torná-las invisíveis. Nos últimos tempos, os catadores de lixo indianos nem sequer as recolhiam, já que não tinham valor algum.
Penso que a tendência à comodidade que o ser humano carrega embutida em alguma parte do cérebro faz com que as consequências sejam deixadas de lado em operações cotidianas. Não sei se tem a ver com o conceito matemático, aprendido desde cedo, de que a distância mais curta entre dois pontos é a linha reta. Ele funciona

*J. R. Duran, 55, é fotógrafo e escritor. Seu e-mail é studio@jrduran.com.br

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