Desconstruindo Sabrina

por Alexandre Makhlouf
Tpm #180

A apresentadora que faz rir com seu jeito espontâneo, todo mundo conhece. Já a Sabrina Sato que fala sobre sexo após a maternidade e de seus fracassos, essa só se revela para os íntimos

Acompanhar Sabrina Sato, 38 anos, chegando a um dos muitos eventos a que ela tem que comparecer é um acontecimento. Não apenas pelas roupas nada básicas que veste, mas por conta do entourage que a acompanha – assessores, stylist, maquiador, assistente pessoal, mãe, irmã-empresária, filha, babá e, de vez em quando, o marido e ator, Duda Nagle. “Uma vez, fui para o Líbano gravar matéria e lembro que as pessoas ficavam chocadas quando dizia que estava com 30 pessoas. Sempre tento enxugar, mas não consigo. Preciso parar de falar isso, senão ninguém mais vai me convidar para festa nenhuma.”

LEIA TAMBÉM: Carmita Abdo faz um breve - e necessário - panorama das mudanças da sexualidade feminina nas últimas décadas

O jeito espontâneo e piadista de Sabrina, que por muito tempo foi interpretado como ingenuidade e até burrice, hoje é visto como sua marca registrada e seu maior ativo. Com mais de 23 milhões de seguidores no Instagram, que podem acompanhar cada passo de sua vida pessoal e profissional (entre vários posts patrocinados), ela foi anunciada como a nova responsável pelos domingos da TV Record, onde, por quase cinco anos, comandou as tardes de sábado. Serão quase cinco horas seguidas ao vivo no ar.

Câmeras ao vivo e plateias, no entanto, nunca foram um problema para Sabrina. E na última Casa Tpm não foi diferente. Convidada a encarar nosso balde com perguntas enviadas pela audiência, ela arrancou risadas do público ao responder temas espinhosos. Sabrina não cai em polêmicas e segue firme como unanimidade nacional, que vai da Sapucaí à semana de moda parisiense. Na conversa que começou no evento e terminou em seu novo apartamento, em São Paulo, ela desconstrói a Sabrina que conhecemos.

Tpm. Você está sempre cercada por muita gente. Tem uma relação muito próxima com sua família e também com a sua equipe. Sempre foi assim?

Sabrina Sato. Cresci em uma casa que era nos fundos de dois comércios: a loja de roupas da minha avó e a alfaiataria do meu avô. Ficava no centro de Penápolis [interior de SP] e sempre estava passando gente. Morava com minha mãe, meu pai, meus irmãos, meus avós e minha tia. Todo mundo entrava e saia o dia inteiro. Minha vida já era essa bagunça quando eu nasci. Achei que, vindo para São Paulo, talvez tivesse privacidade porque aqui é diferente do interior, mas não tenho. Vi que a gente é desse jeito mesmo. Quando estava grávida, foi tanta gente me visitar no prédio antigo, era um entra e sai tão grande na portaria, que cheguei a tomar uma multa. Eram mais de dez pessoas por dia.

LEIA TAMBÉM: Sabrina Sato tomou conta da plateia da Casa Tpm 2019 em temas como maternidade, sexo, autoestima, sucesso - tudo com o humor que marca sua história

Tem algum momento em que você fica sozinha e desliga? Às vezes acontece, mas eu não sinto muita falta, sabia? O Duda não se conforma que eu vou pra eventos, atendo toda a imprensa, falo com fãs e chego animada em casa. Isso também é algo que vem da infância. Lá em Penápolis, a minha avó tinha muitos amigos: as colegas da sauna, os amigos gays, as costureiras... E a gente convivia muito bem com essas pessoas. Elas ajudavam a me criar.

Você conviveu com os amigos gays da sua avó na infância, nos anos 80. E ela acolheu muitos deles que sofreram com a aids. O que você aprendeu com isso? Convivi com isso muito de perto. Eu vi meu papai noel, o cara que se fantasiava todo Natal para nos levar presentes, morrer de aids. O visitei no hospital até ele não me reconhecer mais. Essa cena ficou marcada para mim. Perdemos vários amigos da minha avó, vendedores da loja, pessoas que estavam todos os dias na minha casa, e era de uma forma devastadora.

“Quem faz sexo depois de ser mãe? Não dá vontade nem de bater uma punheta para o marido”
Sabrina Sato

Você vem de um família de ascendência japonesa. Acha que falta representatividade de mulheres orientais na mídia? Sempre faltou. Tanto é que, quando eu era criança, queria trabalhar na televisão, ser atriz. Mas meus pais nunca deram força e acho que não acreditavam que daria certo, porque a gente é caipira, do interior, com sotaque, oriental. Minha irmã uma vez me perguntou: “É melhor você ser apresentadora, porque, se for atriz, quem vai ser seu pai e sua mãe na novela?” [risos]. Acho que isso acontece com os negros também, dá para contar nas mãos as pessoas não brancas que a gente vê na mídia. Muita gente diz que é porque “japonês é mais fechado”, mas isso não é verdade e também é preconceito, é rotular.

Você faz bastante publicidade e isso acaba se misturando à sua vida privada. O anúncio da sua gravidez, por exemplo, virou uma ação de marca. Quando fui internada [Sabrina teve uma gravidez de risco], uma das primeiras coisas que pensei era que rapidamente isso ia vazar na imprensa. Eu estava no hospital, internada numa maternidade, sem saber quando ia sair. Já tinha cruzado com um monte de gente conhecida enquanto fazia ultrassom. Então, escolhi deixar tudo pronto para anunciar. Chamei um videomaker da minha confiança e simulamos o quarto da Zoe ali na maternidade mesmo. Também chamei a Karina [Sato, irmã] e perguntei qual marca poderia entrar nesse anúncio com a gente. Ligamos e oferecemos o vídeo pronto. Eu dou a ideia, sou proativa, não espero a marca chegar em mim. E foi o que aconteceu: no dia seguinte do contato com a marca, o Leo Dias [colunista de celebridades] soltou que eu estava grávida porque uma outra paciente contou. Soltei o vídeo na hora, sem avisar ninguém, e ele ultrapassou os 15 milhões de views – porque foi feito de um jeito que eu sabia que minha audiência ia gostar. Sou assim mesmo: misturo minha vida pessoal com a profissional, é uma bagunça. Os amigos que conheci no trabalho se tornam da minha família, coloco a minha mãe para trabalhar… Mas é uma bagunça que agora deu certo, e em time que está ganhando não se mexe. Então, vamos continuar assim.

LEIA TAMBÉM: Com seu jeito desencanado e divertido, a musa do Pânico contou suas histórias ao Trip FM

Vou mudar um pouquinho de assunto pra gente falar sobre sexo. Ai, eu adoro. Pena que não faço.

A pergunta era exatamente essa. Dizem que o sexo depois da maternidade melhora. Procede? Como melhora se não existe? Quem faz sexo depois de ser mãe? Não dá vontade nem de bater uma punheta para o marido. É difícil, a vontade não vem. Quando você vira mãe, tudo muda. Atualmente, eu amo o Duda como se fosse meu irmão [risos]. É um amor gigantesco, eu olho para ele e sinto gratidão, mas não tesão. A gente precisa começar a falar sobre isso.Não é tudo maravilhoso [na maternidade]. Eu, que fiz cesárea, fiquei cheia de gases e cheia de pontos. A cicatriz dói até hoje. E você não quer sair de perto da sua filha, não quer sair do quarto. Mas eu tô tranquila com isso, sabia? O Duda e eu conversamos muito e estamos bem. Antes a gente era um casal, agora a gente é uma família, uma potência.

“Sou assim mesmo: misturo minha vida pessoal com a profissional, é uma bagunça. ”
Sabrina Sato

Falam que ser mãe é sinônimo de se sentir culpada.Você tem experimentado isso desde que a Zoe nasceu? Nossa, é muito doido. Parece que não importa a escolha que você faça, sempre vai se sentir culpada. Colocar ou não na escola, postar foto ou não nas redes... Conversar com outras mães é algo que me alivia muito. Essa troca é muito importante, faz a gente crescer e aprender. Eu sou muito privilegiada por ter uma rede de apoio, muita gente pra me ajudar o tempo todo, e por ser cara de pau de pedir ajuda para as pessoas. Vejo a dificuldade de mães que não têm a mesma realidade que eu.

Dizem que maternidade é fazer aquilo que você disse que nunca faria. O que você já fez e pagou a língua? Todas as cafonices do mundo! A primeira foi colocar roupa igual a da Zoe. Eu cheguei ao ponto de ligar para uma marca de roupinha de criança e pedir pra fazer um body pra mim, igual ao dela, pra postar no Instagram. Tenho um grupo de WhatsApp de amigas que são mães. Quando ainda não era, toda vez que elas falavam sobre filhos, eu mandava um pinto. Começava o assunto “meu filho vai para escola...”. Pinto. “Que livro você está lendo?” Pinto. Agora, só eu falo: “Ai, minha filha não sei o quê...”. Estou pagando a língua.

LEIA TAMBÉM: Por que as mulheres se cobram e são cobradas o tempo todo sobre as decisões que tomam em suas carreiras? Camila Pitanga, Juliana Wallauer e outras minas refletem sobre suas escolhas profissionais

Você já esteve em algum relacionamento abusivo? É muito doido porque, até pouco tempo atrás, a gente não falava disso, mas passávamos por isso. A gente dizia “ai, o cara pega no meu pé”, “um ciumento ao extremo”, mas não falava que era um relacionamento abusivo. Passei por isso, do cara fazer chantagem emocional, tentar o tempo inteiro me fragilizar, diminuindo minha autoestima, me deixando insegura. Lembro que quando terminei o namoro, tive muito apoio da família, dos amigos, que me falaram: “Você não pode sofrer desse jeito. Vai fazer uma terapia”. Então, sempre soube para quem ligar. Essa vergonha eu não tenho. Na fase do puerpério, não conseguia parar de chorar, mas liguei para pedir ajuda.

Nesta edição estamos discutindo sucesso. O que é ser bem-sucedida para você? Ninguém é sucesso, você faz sucesso. Pode parecer clichê, mas, quando eu me tornei mãe, voltei à estaca zero. Tudo mudou de perspectiva, parece que a gente renasce. Começa tudo de novo.

“Sou um ser esquisito. Tenho uma verruga na testa, sou japonesa, mas coloquei silicone na tentativa de me enquadrar em um padrão de beleza.”
Sabrina Sato

Quando você sentiu que não era bem-sucedida? O momento que me senti mais poderosa e mais feliz foi no parto. Mas, ao mesmo tempo, também senti que não tinha dado certo. Durante a gravidez inteira, falei que ia ter parto natural, estudei, planejei, me preparei. E, de repente, me vi fazendo uma cesárea. Não era isso que eu esperava e achei que fracassei. Mas a gente precisa aprender a lidar com essas mudanças de percurso. Foi uma das primeiras vezes na minha vida que visualizei algo e aconteceu de outra forma. Eu me imaginava parindo na banheira, de perna aberta, tocando a playlist que fiz pra quando a Zoe nascesse. Romantizei esse momento e não foi nada daquilo. Foi o oposto: com um monte de gente em volta de mim, me costurando. E, ao mesmo tempo, foi muito foda, porque eu saí muito mais forte daquela sala de parto. A gente tem que se cobrar menos e ser feliz. Ainda mais com as redes sociais, parece que temos que estar bem o tempo inteiro. Temos que mostrar também pelo que realmente passamos.

Sua aparência fez diferença para o seu sucesso? Na minha infância, me olhava no espelho e me achava esquisita. Me chamavam de japa na escola e eu não entendia por quê. Não sabia o que era ser oriental, nem que isso era diferente. A verruga na testa também era motivo de piada para os colegas. Depois de um tempo, comecei a trabalhar minha autoestima, me achar interessante por não ser igual aos outros.Aí comecei a querer ser mais diferentona ainda, cortar o cabelo assimétrico. Em muitos momentos não foi fácil, eu queria fazer parte de um padrão ao qual eu não pertencia. Queria ter um côncavo nos olhos, fazia massagem pra ver se conseguia desenhar isso no meu rosto. Mas eu sempre consegui me inspirar em várias mulheres que também estavam fora da curva e fizeram história, tipo Elke Maravilha e Yoko Ono – que eram superbruxas, interessantes, revolucionárias, à frente do tempo.

LEIA TAMBÉM: Em pleno século 21, Lua Fonseca ousou largar o emprego para se jogar no tanque de areia com os filhos – e não se arrependeu

Como você lida com haters? Sempre me perguntei: como que um jogador consegue terminar uma partida de futebol com os caras xingando a mãe dele? E, muitas vezes, ganhar o jogo.Aquilo [as redes sociais] não é a realidade, é o mundo virtual.Então, quando a pessoa me xinga ou fala alguma coisa é porque ela não me conhece. Se conhecesse, meu bem... Juro pra você: tento não me abalar. Ou não leio, ou excluo, ou respondo de forma educada. Porque acho que é a melhor forma de você dar um tapa na pessoa com luva de pelica – nossa, que expressão velha!

Nas suas redes, você fala sobre se aceitar, mas, ao mesmo tempo, malha para caramba, estava na Sapucaí pleníssima poucos meses depois de dar à luz... De alguma forma, você tem medo de reforçar um padrão? Sou um ser esquisito. Tenho uma verruga na testa, sou japonesa, mas coloquei silicone na tentativa de me enquadrar em um padrão de beleza. Já tentei me encaixar e sei que, de algum jeito, me encaixo, mas não quero que minha filha se sinta pressionada em nenhum momento a pertencer a um padrão. Quero educá-la para que ela se sinta o mais forte possível, porque as mulheres são comparadas às mães o tempo inteiro.Então, vou tentar deixar a Zoe mais independente para ela ter a personalidade dela. Às vezes, ela não vai ser a louca da maquiagem como eu sou, sabe? Eu não sei como ela vai querer ser, se vai querer ter pelo, se vai querer se depilar, se vai querer ter cabelo curto ou comprido. Ainda não sei como, mas vou tentar deixá-la bem livre. 

Créditos

COORDENAÇÃO GERAL Adriana Verani | STYLING Flávia Pommianosky e Davi Ramos | BELEZA Rodrigo Costa com produtos Sebastian e Mac | PRODUÇÃO DE MODA Sam Tavares | ASSISTENTE DE PRODUÇÃO DE MODA Juliana Santos | ASSISTENTE DE BELEZA Homero Mancilha | ASSISTENTES DE FOTO Flavio Lucas e Wallace Costa | CAMAREIRA Deise Gomes | TRATAMENTO DE IMAGENS Factory Retouch

fechar