Terra da prosperidade

Há muitos motivos para falar mal de São Paulo, mas eu escolho falar com otimismo

Há muitos motivos para falar mal de São Paulo, mas eu escolho falar com otimismo sobre essa cidade que dá chances a qualquer um que quiser progredir. Nenhum outro local do país exibe a diversidade cultural que há por aqui

Como pode não dar certo um projeto de mais de 400 anos? Eu me recuso a aceitar que a cidade em que nasci e fui criado possa estar a um passo de sua inviabilidade. Inviável já é há muito tempo: poluição, enchentes, congestionamento de trânsito, aumento de preços, violência, e parece que aquilo que há de bom por aqui já tem dono. Tudo em São Paulo é tão complexo que chega a exceder a nossa capacidade de compreensão. Mesmo assim, a cidade está viabilizada – precariamente, admito, mas estamos aqui convivendo razoavelmente, não estamos?

Cada vez mais gente tem vindo de todos os cantos do país e do mundo. Aqui nos tornamos multirraciais, multiculturais e até multinacionais, ao mesmo tempo em que nos sentimos brasileiros. Não há como não ter a consciência de que estamos inseridos em uma metrópole global. Encontramos a pobreza que desumaniza, assim como a riqueza que desumaniza mais ainda. Mas aqui a fome é saciada, o frio é coberto e as oportunidades acontecem para quem corre atrás. Conflito e sinergia são os motores. Tradições e contradições; liberdades e prisões; cada bairro é quase uma nova cidade. Não falta nada. Convivemos com o estranho, com o diverso e até com o bizarro. Temos ONGs, Oscips, voluntários e igrejas que muito se esforçam para cobrir o que o governo deixa a desejar.

Reclamei da minha cidade durante muitos anos. Habitação e mobilidade são os nossos fracassos; desigualdade econômica e social são os nossos maiores obstáculos. Mas, quando comecei a sair e conhecer a realidade de outras cidades, parei com os meus protestos. Nelson Mandela afirma que, para conhecer um país, devemos ir às suas prisões. Porque a forma como são tratados seus piores cidadãos é o que define uma sociedade. Transpondo esse pensamento para São Paulo, a situação de nossas prisões é péssima. Principalmente em termos de superlotação, abuso de poder e mortandade de presos. Se formos ver as prisões das outras cidades, voltaremos conscientes de que aqui não é bom, mas ainda é muitas vezes melhor do que em qualquer outra cidade do país.

Gringolândia

Nenhuma cidade do país, quiçá da América Latina, tem a diversidade cultural que há em São Paulo. Nunca tantos estrangeiros vieram para cá. Múltiplos shows acontecendo ao mesmo tempo para agradar a todos os gostos; inúmeras casas de espetáculos; teatros; salões de shows e dança; shopping centers; viadutos e prédios.

Aumentou o poder aquisitivo da população, automaticamente explodiu o número de carros nas vias já supercongestionadas da metrópole. É uma loucura sair de automóvel em São Paulo, esta é a cidade dos carros. Mas somos o único local do país que está construindo um rodoanel que envolve toda a cidade e interliga todas as rodovias do estado. O metrô, aqui, embora pareça pequeno para o paulistano, é incomparável com qualquer outro no país. E estão sendo construídos monotrilhos; novas estações de metrô seguem adiante, ultrapassando até o município; linhas de trens são reativadas.

E tudo tende a mudar muito ainda nos próximos anos, haverá uma adequação às demandas. Haverá verba para tanto, não podemos esquecer que somos a cidade mais rica do país. Por exemplo, o problema das enchentes na cidade. Já existe alguma estrutura, e outras estão sendo providenciadas para segurar o pior das tempestades que se abatem sobre a cidade. São Paulo não é mais a “terra da garoa”, tornou-se a “cidade das tempestades”. Imaginem outras cidades brasileiras recebendo a mesma quantidade de chuvas que se abate sobre São Paulo. Algumas deslizariam oceano adentro.

Há muitos motivos para falar mal de São Paulo, mas eu escolho falar com otimismo e esperança sobre essa cidade que dá chances a qualquer um que por aqui chegar e quiser prosperar.

*Luiz Alberto Mendes, 60, é autor de Memórias de um sobrevivente. Seu e-mail é lmendesjunior@gmail.com

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