Sexo oral, um tabu

Por conta do nosso preconceito, muitos da minha geração demoraram a ver uma vagina de perto

Quando eu era jovem e metido a malandro, sexo oral era um tabu gigantesco. O sujeito que cometia tal desfaçatez era tido como cafetão. Sabíamos que as mulheres apreciavam, mas, além do nojo que nos foi incutido, o preconceito era enorme. Ser cafetão, naquela época, era o que havia de pior na estratifi cação do submundo. O sujeito que vivia da prostituição da mulher era alguém indigno de convivência. Na prisão, eles eram seviciados e usados. 

Já os ladrões eram quase artistas, “artesãos do crime”. Roubavam a carteira do “João” de dentro do bolso interno do paletó; faziam chaves falsas a partir de uma colher de café; falsificavam cheques com tanta perfeição que enganavam gerentes de banco; roubavam o caixa do banco distraindo a atenção com encenações; e eram chamados de gatunos: leves, ligeiros e quase invisíveis. Entravam e saíam de qualquer carro ou casa sem precisar de armas. Montavam “araras” (empresas falsas); jogavam o “paco” (pacote de dinheiro falso) do conto do vigário nos pés do “trouxa” em plena praça da Sé; enfim, roubavam sem violência, na pura habilidade. Havia até uma certa admiração pela destreza rocambolesca de tais aventureiros da sorte.

Por conta de nossos preconceitos, muitos de nós, da minha geração, não viram uma vagina de perto a não ser por fotos de revistas. A que mais revelava era a Playboy, que, na verdade, não mostrava nada, só enganava. Fui preso aos 19 anos e não sabia que a mulher possuía uma saída da uretra separada da entrada da vagina em seu aparelho genital. Para mim funcionava como um vão que servia tanto para uma coisa quanto para a outra, como o órgão masculino. Fiquei sabendo na prisão, estudando em livros científicos; mas só fui constatar aos 32 anos, quando as mulheres puderam entrar nas prisões. 

O sexo oral, que fora escândalo, um tabu, 20 anos antes, agora era aceito com naturalidade. O casal que não fizesse nem havia feito sexo direito. Hoje é prática muito efi ciente de aquecimento antes da penetração. Faz parte do arsenal que dispomos para realçar o prazer sexual. E eu, como não poderia deixar de ser, fui experimentar. Fizemos clima; ia acontecer algo especial. Fui cheio de apetite e, de repente, por pouco não vomito em cima da companheira. Tive que correr para o banheiro. Depois de um tempo, tentamos novamente e o resultado foi parecido.

Somente anos depois, com uma parceira mais experiente, é que consegui incorporar a prática. Demorou para que eu pudesse conhecer a sexualidade feminina e conseguir agir com naturalidade.

 

PRAZER FEMININO

Não consigo imaginar como as mulheres lidam com esse órgão tão complexo no meio do corpo delas. Olho meu pênis com a maior naturalidade; é parte de mim. A vagina é parte da mulher também, é óbvio, mas existe a possibilidade, que nem sempre é uma opção, da maternidade. Os óvulos explodem em plasma coagulado ou na formação de outro ser, todos os meses. 

Talvez a relação da mulher com sua vagina seja bem diferente da do homem com seu pênis. A sexualidade feminina é vinculada aos sentimentos da mulher. O homem endureceu e a agressividade sexual masculina determina a busca pelo prazer. A mulher quer carinho, afagos, beijos e amor. A penetração, o prazer sexual e o orgasmo vêm depois. Confiança é fundamental para dar segurança ao prazer feminino. A mulher busca o homem; o homem busca a fêmea. Há psiquiatras que afi rmam que se procriação da humanidade fosse deixada por conta da iniciativa sexual feminina, a raça humana estaria extinta há milênios. 

A sociedade moderna exila o homem de seus sentidos mais profundos da existência para transformá-lo em consumista e produtor. O desencanto, o cansaço de viver o mesmo sempre têm sido pontes que nos movem para a busca de algo mais. Conhecer, desenvolver a energia sexual e o prazer e construir uma vida sexual sadia são requisitos básicos para reconstruir o sentido de viver do ser humano.

*Luiz Alberto Mendes, 62, é autor de Memórias de um sobrevivente. Seu e-mail é lmendesjunior@gmail.com

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