Já que questão da dependência do feto ainda não foi resolvida de modo que não restem dúvidas
O ano era 1951. A moça vivia em colégio interno de orientação protestante (sóbrios protestantes, não alegres evangélicos). Naquele tempo colégio interno era comum. Os jovens ficavam internos o ano todo e visitavam as famílias nas férias. Numa dessas visitas, a jovem em questão foi levada a bailes pelas irmãs mais velhas. Foi então que ela conheceu um rapaz bem apessoado que dançava muito bem. Formaram um par de dança.
Namoro naquele tempo era sob as vistas da família. O namorado seria pesquisado. E foi ai que se descobriu que o rapaz era casado e tinha um filho. Óbvio, a família proibiu. A moça, ingênua, aceitou as explicações do namorado e deu linha na pipa. Jogou as suas malas pela janela e saiu como quem fosse à padaria.
A família foi descobri-la meses depois. Estava grávida. Caso nascesse aquela criança, seria um bastardo. Filho de mãe solteira com pai casado. Por lei a criança seria registrada como filho da mãe e pai ignorado. Um “filho da mãe”, quase “filho da puta”, por assim dizer. A solução era quase natural, embora ilegal, para esses casos. A família deu dinheiro para que ela abortasse em uma clínica de abortos.
Passado algum tempo, ela engravida novamente. Não havia educação sexual, televisão e nem anticoncepcional. A família deu dinheiro e ela voltou à clínica. Estávamos quase ao fim de 1951 quando ela engravidou mais uma vez. Eram jovens, cheios de vitalidade. A mãe deu dinheiro para que abortasse.
A jovem vivia namorando um armário de cozinha desses de fórmica e cheio de vidros. Como a gravidez era recente, o aborto podia esperar até o fim do mês, quando o companheiro recebesse. Satisfez sua vontade e comprou o armário bonito. Dia seguinte o “marido”, foi despedido do emprego. Não havia mais dinheiro para que voltasse à clínica. A solução foi deixar nascer, apesar do preconceito e todos os contras.
Foi assim que eu nasci, em 04 de maio de 1952.
Então, o que posso eu dizer acerca do aborto? Minha mãe me criou com todo amor e carinho que foi capaz. Mas quando eu tinha cerca de 10 anos de idade, ela foi operada e tirou todo aparelho reprodutor feminino. Os abortos em clínicas improvisadas a haviam destruído por dentro. Só pode ter a mim por filho.
Acho que a questão é a seguinte: O feto faz parte do corpo da mãe ou só se alimente no corpo da mãe? Ele é um ser independente ou parte do corpo da mãe? Se faz parte do corpo da mãe, caberia a ela decidir sobre seu corpo. Caso seja um ser independente, até que ponto seus direitos devem ser defendidos pelas leis sociais? Acho que a polêmica esta ai.
Não sei sobre o que nos diz a ciência atual acerca da questão. O que sei é que a questão da dependência ou independência do feto, ainda não foi resolvida de modo a que não restem dúvidas. Devo estar defasado, mas esta parece uma questão em aberto. Por favor, se alguém souber mais, nos informe. Agora, por conta dessa questão tão temática decidir (ou indecidir, se é que existe essa palavra) uma eleição presidencial é muito para a cabeça, não acham?
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Luiz Mendes
08/10/2010.