Guimarães: ”Que não demoremos tanto tempo até reconhecermos que somos coadjuvantes da vida”
Espero que não demoremos tanto tempo, e que não morra tanta gente, até reconhecermos que somos coadjuvantes da vida, e não protagonistas. Mas se o homem não reconhecer seu lugar, a natureza fará isso por ele, naturalmente
Caro Paulo,
Sabe por que eu curto tanto falar da biomimética? Porque é uma maneira moderna e mais científica de colocar em prática o taoismo, que eu acredito ser o melhor caminho para encontrar a felicidade. Você sabe, o taoismo é uma filosofia, registrada em livro antes de Cristo, que ensina os humanos a viverem em paz com a natureza. Mais do que isso, reconhece na natureza a sabedoria necessária para os homens aprenderem a viver em paz e felizes. A biomimética não pretende tanto, mas pelo menos coloca os biólogos na mesa onde se buscam soluções para o estilo de vida de nossa sociedade.
Na minha opinião, praticar o biomimetismo faz parte do processo da transformação épica que a nossa civilização está vivendo, que é tirar o ser humano do centro de suas preocupações e colocar a vida no seu lugar. Em outras palavras, substituir a visão de mundo antropocêntrica pela biocêntrica.
Quando fizermos isso, nossa arrogância/ignorância com relação à natureza vai se transformar em admiração/respeito; e o ser humano vai, então, encontrar seu lugar e seu papel nesse processo incrível que chamamos de evolução.
Acho que a última vez que a humanidade teve que fazer uma mudança dessa magnitude foi quando substituímos a Terra pelo Sol como centro do sistema solar. Isso demorou uns 400 anos e muita gente morreu até reconhecermos essa verdade.
Enquanto a verdade – Sol no centro – não era aceita, era difícil explicar os novos planetas descobertos, era tudo muito complicado, cheio de dogmas, e apenas as pessoas de poder da Igreja é que “sabiam das coisas”. Só depois de colocar o Sol no centro é que o sistema solar ganhou explicações claras e científicas de acesso a todos. Aí a humanidade evoluiu.
Código Florestal
Quer ter uma ideia de como foi difícil uma mudança desse tipo? Preste atenção na pobre argumentação dos que defendem as mudanças no Código Florestal para “produzir alimento e o povo não passar fome”, como a senadora Kátia Abreu. Ela me lembra os cardeais da Igreja no século 16 prometendo a excomunhão e o inferno para quem reconhecesse que o Sol era o centro do sistema solar. Seu melhor argumento é o medo, não a ciência.
Na cabeça de pessoas como a senadora, a natureza é apenas recurso e está lá para produzir alimento. Como ela, todos nós temos dificuldades enormes para reconstruir nossos discursos e posturas, colocando o homem como coadjuvante da vida e não como seu protagonista. Tem até muita gente séria da sustentabilidade que coloca as gerações futuras no centro de suas preocupações, e não a vida, hoje.
Espero que não demoremos tanto tempo e que não morra tanta gente para aprendermos. Mas tudo bem, porque, se o homem não reconhecer o seu lugar, a natureza, como mãe sábia e generosa, fará isso por ele, naturalmente.
Fique com o abraço do amigo e admirador da sabedoria da natureza,
Ricardo
*Ricardo Guimarães, 62, é presidente da Thymus Branding. Seu e-mail é ricardoguimaraes@thymus.com.br e seu Twitter é twitter.com/ricardo_thymus