O prazer dos limites

É necessário erotizar a sustentabilidade e despertar o desejo das pessoas pela moderação

Para que as pessoas se conscientizem da importância de salvar o planeta – o corpo da humanidade –, é necessário erotizar o conceito de sustentabilidade, despertar o desejo das pessoas pela ideia de moderação

Caro Paulo,

Ultimamente tenho experimentado certo sentimento de gratidão ao meu corpo. Cada vez que vivencio algo gratificante que me faz mais feliz, mais alegre, mais satisfeito ou mais rico em algum aspecto, eu me surpreendo incluindo meu corpo na lista de agradecimento aos que viabilizaram aquela experiência.

Isso nunca tinha acontecido antes. Fico pensando por que agora. Provavelmente porque os limites do meu corpo não são mais os mesmos de anos atrás e eu percebo o esforço que ele faz para me levar a essas experiências.

E não se trata só de mobilidade. É sono, digestão, humor, circulação, tudo o que me proporciona um mínimo de bem-estar para usufruir da realização dos meus desejos. Isso tem me levado a estudar e conhecer mais intimamente o meu corpo e a cuidar dele cada vez melhor.

Com certeza essas descobertas têm a ver com o meu processo de amadurecimento, o que tem me ajudado muito a ter uma boa vida e, o mais importante, a entender a relação entre o meu corpo e os meus desejos.

Por mais estranho que pareça, essa conscientização forçada tem me ajudado a aprofundar a tese de que é necessário erotizar (ato de provocar desejo) a sustentabilidade, para que as pessoas queiram efetivamente utilizá-la como inspiração para criar um estilo de vida mais integrado, harmônico, prazeroso e, portanto, de maior satisfação.

Vejamos: o planeta é o corpo da humanidade. É ele quem proporciona a satisfação de nossos desejos. E, assim como nosso corpo, o planeta tem limites. Então fica a questão entre os limites do planeta e a satisfação dos nossos desejos.

Como na nossa civilização ocidental a satisfação dos desejos está relacionada à liberdade ilimitada para fazer o que se quer com o corpo, a noção de limites do planeta é um grande estraga prazeres.

É aí que mora a dificuldade da sustentabilidade: entusiasmar as pessoas. Porque, infelizmente, ela chegou à nossa cultura com a noção de restrição/culpa e não de potencialização do prazer.

A noção de limite do planeta e do nosso corpo nos chega por meio do mundo concreto da ciência, que revela nossa identidade e tem impacto fundamental no nosso amadurecimento e na nossa felicidade. É essa noção de limite que viabiliza o prazer, a evolução e a realização do ser humano. O resto é ignorância. Ou manipulação de interesses políticos e econômicos para manter o status quo – a Dilma e o Lula sabem do que estou falando.

SUSTENTABILIDADE ERÓTICA
O tema é grande, e neste espaço só vai dar para pautar o assunto. Mas fica a sugestão para os estudiosos da relação limite/prazer fazerem sua contribuição para refundarmos a sustentabilidade com o sedutor erotismo que permitirá sua reapresentação à sociedade como estágio de evolução e amadurecimento da nossa civilização.

Para tanto, recomendo fortemente a leitura do riquíssimo artigo “The Joy of Less”, de Wendy Steiner, publicado na edição de novembro/dezembro da Adbusters e na edição primavera/verão da Harvard Design.

Reconhecer o prazer dos limites, parodiando o maravilhoso O poder dos limites (editora Mercur), de Gyorgy Doczy, vai nos levar a experiências sensoriais com mais significado e menos predatórias; evolução necessária principalmente se nossos desejos nos levam a impor ao corpo e ao planeta uma agenda muito maior do que eles podem sustentar.  

Hora do almoço. Vou retribuir ao meu corpo o prazer que ele me proporcionou de redigir este texto.

Abraço saudoso do amigo,

Ricardo

*Ricardo Guimarães, 60, é presidente da Thymus Branding. Seu e-mail é rguimaraes@trip.com.br

 

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