O mundo em dois atos
Quem elegeu os políticos que liberaram a farra dos banqueiros?
/ Créditos: Reprodução
Por Henrique Goldman
em 8 de fevereiro de 2012
Em 1981, o presidente americano Ronald Reagan proclamou duas célebres frases ao tomar posse: “A solução para nosso problema não está no governo, pois o governo em si é o problema”. O velho cowboy dava voz ao impulso libertário da grande maioria dos americanos, que o elegeu partindo do princípio de que menos governo é igual a mais liberdade. Este é o marco inicial do momento histórico que vivemos, a derrocada das democracias ocidentais.
Em nome da liberdade, deu-se carta branca para que os banqueiros arruinassem a economia de países inteiros. Em nome da liberdade, grandes corporações podem vender armas, destruir o meio ambiente, invadir e ocupar outros países – sem culpa. Triste paradoxo democrático: a liberdade é também um poderoso instrumento de opressão.
Pequena reflexão de direita
Agora acabou a festa. Em Atenas, Madri, Londres, Nova York e tantas outras capitais, as populações indignadas e empobrecidas ocupam ruas e praças, revoltadas com governos corruptos, banqueiros gananciosos e uma imprensa vendida, escrava de ambos.
Mas é justo perguntar: quem por décadas – quando lhes era conveniente – elegeu políticos que deixaram os bancos especular livremente sobre os nossos destinos? Quem esses políticos estavam (e ainda estão) representando? Quem mandou ir ao banco pegar dinheiro emprestado sabendo que não se poderia pagar a dívida? Quem escolheu assistir a noticiários tendenciosos e comprar tabloides imbecis? A escolha é da própria população, uma maioria que certamente inclui os indignados em tantas ruas e praças, em tantas capitais.
O sistema não é uma estrutura supra-humana e dissociada da esfera individual. Ele começa e é constituído por nós – e é movido, em grande, enorme parte, por nossas escolhas. Vamos acordar. É muito fácil culpar bancos e governos (que sem dúvida têm uma enorme culpa). A democracia começa na frente do espelho. É hora de começarmos a nos indignar também com nossas próprias caras.
*HENRIQUE GOLDMAN, 48, cineasta paulistano radicado em Londres, é diretor do filme Jean Charles. Seu e-mail é hgoldman@trip.com.br
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