Liberdade e emprego

Mendes: ”O trabalho é o mais importante caminho para a inclusão de quem sai da prisão”

O trabalho é o mais importante caminho para a inclusão de quem sai da prisão. Estamos na batalha para criar cooperativas que funcionem como um espaço de virada para ex-presidiários

A superlotação das prisões no estado de São Paulo parece fenômeno cíclico e inexplicável. No momento estamos com 170% de lotação nas prisões do estado (dados da Secretaria dos Assuntos Penitenciários). É indiscutível: nos últimos dez anos, a camada mais humilde da população – de onde a maior parte dos presidiários é oriunda – obteve sensível avanço em termos de qualidade de vida. Cerca de 30 milhões de pessoas entraram no mercado de consumo regular. Não há como usar somente os velhos argumentos sociais para explicar a superlotação crônica dos presídios.

Quero ressaltar o peso da reincidência nesse complexo quadro da superlotação prisional. As pesquisas indicam que o índice de reincidência é de 75% no estado de São Paulo. De cada quatro presos que são libertados, apenas um continua livre. Os outros três retornam à prisão com novos delitos. Por esse cálculo perverso, os presos estão condenados a voltar mesmo antes de sair. E são 200 mil presidiários no estado, uma verdadeira tragédia social. É como jogar uma bomba para o alto e esperar que ela crie asas e vá explodir em outro lugar.

O trabalho é o mais importante caminho para a inclusão socioeconômica do homem egresso do cárcere. Trabalho traz identidade, relacionamentos, oportunidade de atualizar potenciais, vida efervescente onde o indivíduo se entende útil e integrado ao conjunto social. E a principal dificuldade do egresso está na suposição prévia de que ele cometerá os mesmos desatinos de antes. O preconceito limita as chances de encontrar trabalho. As empresas exigem atestado de antecedentes dos candidatos a emprego. Havendo qualquer mancha, a exclusão é automática. Ao ex-presidiário restam os bicos mal remunerados e sem garantias sociais.

Reinserção social
Liberdade é consciência que só existe na coexistência. Estar livre significa ser reconhecido e
tratado como igual pelos semelhantes. Para que o liberto da prisão sinta-se livre é preciso que ele se integre aos outros homens.

Então surge o cooperativismo como uma luz no fundo desse funil. Cooperativa é associação autônoma de pessoas que se unem para satisfazer aspirações e necessidades em empresa de propriedade conjunta.

Cooperação é o segredo da reinserção social. O trabalho em comum produz o companheirismo, passo importante na reintegração do homem ao seu meio social.

Os valores do cooperativismo se encaixam com perfeição à situação socioeconômica do egresso. Sua base é de ajuda mútua, responsabilidade pessoal e social, autonomia, equidade e solidariedade.

Exemplo disso é a Coopereso, cooperativa feita por egressos e familiares de presos na região de Sorocaba, com a importante colaboração do prefeito da cidade, Vitor Lippi. São mais de 180 cooperativados que trabalham em jardins, praças e no paisagismo da cidade. E não é uma experiência – é uma realidade com mais de cinco anos de funcionamento. O índice de reincidência de seus associados é mínimo.

Entramos, junto com a presidenta da Federação das Cooperativas do Estado, Sandra Campos, em enorme batalha para criar a nossa cooperativa. Estamos no aguardo de data na agenda do governador do estado. O governador é associado a uma cooperativa de médicos, como nós pretendemos ser. Só falta sua assinatura no convênio entre a Federação das Cooperativas e a Secretaria dos Assuntos Penitenciários para o lançamento da cooperativa de egressos.

Será o nosso piloto. Junto com o Instituto Nacional de Desenvolvimento e Valorização do Ser Humano pretendemos implantar cooperativas de egressos em 300 municípios de São Paulo. Pensamos atingir 15 mil egressos e fazer das cooperativas um espaço de virada de vida e mudança de atitude.

Tentamos fazer nossa parte. Para tanto, carecemos da colaboração de todos aqueles que se sentirem, como nós, preocupados com os problemas sociais de nosso estado.

*Luiz Alberto Mendes, 60, é autor de Memórias de um sobrevivente. Seu e-mail é lmendesjunior@gmail.com

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