Leve e solto no mundo...

por Luiz Alberto Mendes

 

Leve e livre

 

A antropologia atesta que o homem pré-histórico tinha muito mais liberdade que o homem civilizado. Há rastros, pinturas ruprestes, utensílios e habitações em cavernas de um mesmo grupo humano em diversas e longínquas áreas. Andava centenas de quilômetros a vida toda. Especialistas afirmam que é porque ele não tinha propriedades, não carregava peso e nada o prendia. Ele era leve e livre. Eu que viajo constantemente carregando meus livros nas costas para vender e possuo um passado nada glorioso. Onde vou, mesmo não querendo, levo toda minha história, por isso sei, exatamente, o que é estar pesado e preso. Até meu cachorro, Chicão (chegou aqui agora, esfregando seu cabeção na minha perna, com a língua pra fora, resfolegando), me prende. Para viajar preciso conversar muito com meus filhos para que cuidem dele devidamente, prometer recompensas e tudo. E ainda fico preocupado, às vezes até telefono para reforçar com os meninos. Eles gostam dele, mas são garotos, sabe como é: vivem com a cabeça no vídeo game e seus guerreiros invencíveis. Caso possa, não saio de casa. As ruas são ásperas, cheias de perigos e olhares ameaçadores. Saio somente para cumprir minhas obrigações. Percebo claramente que estou ficando apegado a meu espaço de trabalho, meus computadores (tenho dois), minha televisão grande, o home teatre, a TV a cabo, meus DVDs, meus CDs, meus livros, meus cadernos de anotações, minha cama king size (não consigo dormir bem em outra)... Quando falha a conexão, é uma tristeza. Seria muito difícil ficar sem todo o mundo de informações e a comunicabilidade que a internet me permite.

Já estive preso de verdade quase a vida toda e posso enxergar a diferença claramente: todas essas outras formas de prisão ou apego, fui eu quem escolhi. Não estou contente, quero mais e melhor como todos, mas já tenho minha plataforma onde estou. Vou ser mais e melhor do que sou agora ou não, mas ser escritor é a profissão que escolhi. Sinto-me livre e leve porque, aconteça o que acontecer, é nessas águas que quero navegar.

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Luiz Mendes

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