José González, o hermano sueco

por Filipe Luna

Prestes a tocar no Brasil, o músico sueco de origem argentina José González fala sobre suas influências e ensina a lidar com a fama

Arrancar mais palavras do que simples “sims” e “nãos” da boca de José González é tarefa para um dentista munido de anestesia e alicate.

O filho do sincretismo Suécia-Argentina é de uma timidez indisfarçável pelo conforto da linha telefônica. Nem numa conversa DDI com seu interlocutor ele a perde. Difícil de acreditar que as raízes do rapaz vêm de nossos hermanos vizinhos.

Bem, as étnicas pelo menos, porque as musicais são totalmente brasileiras. Daí seu estilo com ecos de João Gilberto, Caetano Veloso, Chico Buarque e por aí vai.

Sentado no palco, se escondendo atrás de seu violão, ele mistura suas influências tupiniquins com o estilo singer/songwriter do velho continente para criar uma música que fala por si só, poupando esse esforço do seu criador.

É de admirar a facilidade com que ele transforma chicletices pop como “Hand on My Heart”, de Kylie Minogue, ou eletrônicos sintéticos como “Heartbeats”, dos compatriotas do The Knife, em doces melodias para ninar bebês.

Ainda levado pela onda do sucesso de seu primeiro disco, José se prepara para nos agraciar com seu segundo trabalho – já nos finalmentes das gravações.

Dando uma pausa no trabalho para um pouco mais de “trabalho”, desencava a neve da frente da sua casa e toma o rumo de São Paulo e Curitiba para um par de shows aqui no Brasil – dentro da segunda edição da turnê Invasão Sueca. Antes disso, arrancamos na marra, por telefone, algumas palavras do envergonhado hermanito.

Você é filho de argentinos, certo? Onde moram seus pais?
Eles se separaram há cinco anos atrás. Minha mãe mora na Suécia. Somos todos amigos [risos]. Desde que meu pai se mudou não falamos tanto, mas nos damos bem sim.

Você fala bastante com seus parentes argentinos?
Não tenho contato nenhum com eles. Quando estou lá os visito e saímos e tal, mas, fora isso, não costumo ligar para eles.

Você vai muito pra lá?
Não, só estive lá três vezes. Não vou muito. Mas acho que isso vai mudar agora que estou indo tocar lá. Quero ir lá uma vez por ano, mais ou menos.

O que você acha do Brasil? Já conheceu algum brasileiro?
Sim, eu estive no Rio por cinco dias durante uma das viagens que fiz para a Argentina. Meu irmão tem alguns amigos do Brasil que moram aqui em Gotemburgo. E minha irmã dançava samba também [risos].

Você acha que sua música te ajuda a se relacionar com as pessoas? Sim, definitivamente. Desde que comecei a tocar... Eu era tímido quando jovem, na universidade não tinha muitos amigos próximos nem falava muito com as pessoas, mas desde que comecei a tocar tenho viajado muito. Quando as pessoas te conhecem é mais fácil começar uma conversa. Ajudou muito minha timidez, as pessoas normalmente querem falar mais comigo.

Não é estranho eles saberem tudo sobre você e você não saber nada sobre eles?
Sim, é meio estranho às vezes. Depois de shows quando as pessoas vem falar comigo vira uma conversa de mão única. Eles me fazem perguntas sobre coisas específicas e eu apenas respondo [risos]. Não há uma discussão ou uma conversa. Mas é só quando estou em shows e pessoas vêm falar sobre minha música. Encontro pessoas o tempo todo e não parece que eles sabem tudo sobre mim, não é uma situação estranha.

Você já teve relações românticas por causa de sua música?
Hum, sim... Claro. Não tenho uma namorada há um tempo desde que estou em turnê e é muito fácil conhecer pessoas assim. Acho que na maioria das vezes é motivado pela música. Não sei... [risos]

Você usa bastante a Internet?
Sim, bastante. Acho que em geral é bom, gosto da idéia das pessoas entrarem em contato com artistas e com informações em geral através dela. Ainda precisa mudar no futuro a maneira como se consume música nela. Hoje em dia ou você paga uma grana ou pega de graça. Não sei, gosto da idéia das pessoas terem acesso à música e expandir seus horizontes de graça. Parece que as pessoas se relacionam mais pela Internet do que na vida real.

Você acha isso legal?
É, tem muitas pessoas indo para o meu website, ouvindo a música e mandando e-mails. Também no Myspace tem muita gente mandando mensagens. Acho isso muito legal... Há pouco tempo atrás a única maneira de se comunicar era por cartas ou telefone. A Internet diminui as distâncias no mundo, é claro. Mas, não sei, se você passa mais tempo na sua casa conhecendo pessoas on-line do que na rua, acho que é ruim. Por outro lado, é muito legal que pessoas de diferentes partes do mundo possam se relacionar. Quanto mais compartilharmos as idéias melhor.

Como você se sente por ter se tornado um artista famoso porque sua música estava num comercial?
Hum... Eu me tornei conhecido na Suécia sem a ajuda do comercial. Tive um bom começo na Europa sem o comercial, mas, depois que ele foi veiculado, tudo foi para um nível mais mainstream. Sinto que me poupou de muitas turnês, as coisas aconteceram muito mais rápido. Em parte fico feliz, por outro lado não acho muito charmoso quando vejo meu currículo e percebo que o sucesso veio só depois do comercial.

Você sentiu que estava se vendendo?
Sim, mas a partir do momento em que você deixa as pessoas usarem sua música para vender um produto você está se vendendo. Ao mesmo tempo, sinto que, em vez de sair por aí fazendo um monte de shows, foi uma oportunidade de ficar em casa, ganhar uma grana e pagar as contas por um ano.

Você faria de novo?
Em geral, estou meio negativo em relação a isso. Acho que não faria de novo, a não ser que fosse algo realmente especial por uma boa causa. Se a Anistia Internacional quisesse fazer um comercial eu não diria não.

Você é um homem religioso, José?
Não, sou bastante não-religioso.

Você acredita em Deus?
Não, eu sou ateu. Não acredito em nenhum Deus.

No que você acredita? [Risos] É uma pergunta engraçada porque é quase como se você precisasse acreditar em algo. Eu não acho que tenha que ser dessa maneira, você não é obrigado a acreditar em nada. Eu acredito que sou um animal [risos], acredito que realmente existo.

Você está fazendo um disco novo agora?
Sim, estou quase terminando, deve sair até o final do ano. As canções são parecidas com a do outro trabalho apenas porque são basicamente violão e voz – tem percussão em uma ou outra música. Estou gravando sozinho, como da última vez, mas agora com equipamento melhor.

Como foi trabalhar no novo álbum do Savath & Savalas?
Foi muito divertido. Eu estava em Nova York e ele [Guillermo Scott Herren] me ligou e fui até o flat dele e gravei alguns vocais. Ele é um cara muito legal, o admiro muito.

Foi bom colaborar com alguém em vez de tocar sozinho basicamente?
Sim, foi legal. Mas foi bem curto, passamos apenas cinco horas tocando. Foi uma coisa pequena. Na Suécia também costumo tocar com uma banda, não estou sempre sozinho [risos].

O que você tem ouvido ultimamente?
Tenho trabalhado muito nas minhas próprias coisas e fico escutando as gravações quando estou andando. Não tenho escutado muita música de outros. Tenho baixado podcasts da Universidade de Princeton...

Sério?
[Risos] Sim.

É um podcast de música?
Não, apenas algumas aulas. Tenho escutado minha própria música e essas palestras.

Você está estudando algo?
Não, é apenas por diversão. Hoje eu estava ouvindo uma palestra sobre astrobiologia, foi bem divertida. Sobre a probabilidade de vida extraterrestre e tal...

Que temas te interessam mais?
Ouvi uma séria de palestras sobre comida que foram muito interessantes. Ouvi palestras de Peter Singer. Seis horas de apresentações diferentes, foi muito interessante.

O que você cursou na universidade?
Fiz Biologia Molecular e ia fazer meu PhD em Bioquímica, mas quando lancei meu disco parei de pesquisar para fazer turnês.

O que você estava pesquisando?
Replicação de DNA em sistemas biológicos.

Você pretende continuar a estudar?
Não, acho que já deu para mim. Toma muito do meu tempo, estou feliz com minha vida como está. Já fico satisfeito em ouvir um podcast, ler um livro ou um artigo, já é o bastante para minha mente.

Você gosta de música brasileira?
Sim, cresci ouvindo Caetano Veloso, Chico Buarque, João Gilberto. Sou um grande fã de bossa nova e tropicália.

Foi uma influência?
Sim, definitivamente. Aprendi a tocar violão com as notas da bossa nova e dos Beatles. Os acordes difíceis, aprendi através da bossa nova.

Você tem expectativas para tocar aqui no Brasil?
Ainda não atualizei meu conhecimento cultural e musical, ainda estou nos anos 60 [risos]. Não sei tanto sobre o Brasil, estou ansioso.

Pretende tocar algum cover de música brasileira?
Não, provavelmente vou tocar minhas próprias músicas e alguns covers que toco normalmente. Não costumo tocar outros covers além dos que já gravei. Devo tocar “Heartbeats” e “Hand on your heart”.

Você pretende continuar a gravar covers?
Sim, mas agora não quero me focar tanto nisso. Sinto que tenho as minhas próprias canções que quero fazer. Não diria que nunca gravaria músicas brasileiras, mas não é o que pretendo agora. Sinto que as novas canções que fiz são boas [risos]. Qualquer um pode cantar covers...

Qual a pior experiência que você já teve com uma platéia?
Teve uma vez na Noruega em que estava nevando muito e a viagem que deveria levar duas horas demorou treze. Quando chegamos lá tinha apenas um cara na platéia. E ele só tinha ido ao lugar para beber café [risos].

Você tocou?
Não... [risos].

Vai lá: 

São Paulo

  • Onde: SESC Vila Mariana
  • Endereço: Pelotas, 141, Vila Mariana
  • Quando: 05/06
  • Horário: 21h

Curitiba

  • Onde: Era Só o Que Faltava
  • Endereço: Républica Argentina, 1334, Água Verde
  • Quando: 06/06
  • Horário: 22h
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