Imprensa sensacionalíssima

por Bruno Torturra Nogueira

Em tempos de liberdade de imprensa, uma seleta do Pasquim prova que o jornalismo já foi mais... livre

Gravador, bloquinho? O que eu ia dizer? “Como o Pasquim começou?” “Há espaço para aquele humor hoje em dia?” Não era o caso... Para entrevistar Jaguar não se leva uma pauta – leva-se o fígado.

Assim, a “entrevista” tornou-se um porre destilado por muitas horas em dois bares. Começou às 20h30, diante de uma long neck de Brahma e uma dose cowboy de Red Label, na primeira mesa na varanda do hotel Poeta Drummond, em São Paulo.

A conversa já começa fiada. “Sempre fico neste hotel. Drummond. Pior é que o Drummond era um tarado”, e gargalha, “tentou agarrar minha mulher.”

E a coisa vai... noitadas com Cartola, Millôr, Tarso de Castro, mulatas, cornos, cubanas, ejaculações precoces, Flávio Cavalcanti, chutes em bombas, maconha, morte, punheta com Viagra, piadas prontas ou feitas na hora.

Mas, causos à parte, a lição ali era outra: como fazer arte e grande jornalismo com conversa fiada. Nas entrelinhas dos causos estava a alegria e o espírito livre que cavou a maior trincheira criativa do jornalismo brasileiro, o lendário Pasquim.

“Odeio trabalhar. Sempre odiei. É a pior coisa do mundo”, repetia Jaguar, aos 74 anos. Por isso fez da redação do jornal tudo, menos uma redação – era uma casa onde uma turba genial curava ressacas, preparava outras e decidia como iria provocar fúrias e gargalhadas pelo Brasil no fim da semana.

Pasquim era o anti-jornal, o anti-consenso, o anti-bandeira. Por isso mesmo se tornou a bíblia apócrifa dos sensatos e o terror da censura. Principalmente nos anos deste primeiro volume coletânea do Pasquim aqui apresentado – 1969-1971, o auge.

Em 352 páginas está apenas um pouco (“Foi cruel demais escolher”, explica Jaguar) do que o próprio Jaguaribe publicou nos primeiros 150 números. Entrevistas até hoje explosivas, charges corrosivas, artigos emocionados, hilariantes, cartuns na mesma pegada.

Paulo Francis destila, Millôr filosofa, Tarso de Castro apavora, o próprio Jaguar debocha, Henfil faz troça, e toda a turma que habitava aquele lugar metafísico que foi a zona sul carioca dos anos 60 soltando o traço e o verbo no tabloide.

Como a ressaca da entrevista etílica com Jaguar, folhear este livro é dureza. É que, depois de fazer rir, dá certa depressão – que jornalismo meia bomba o de hoje em dia.

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