Ronaldo Lemos fala sobre a competição entre a vida virtual e a real
Nossa vida virtual passou a competir acirradamente com a real. Neste exato momento, alguém pode ter deixado um recado no seu perfil de rede social, ou um e-mail importante pode ter chegado. O problema é que o virtual não tem limites
Falar da diferença entre “real” e “virtual” hoje soa como gafe. Vale recapitular como chegamos aqui. Se você pertence à geração Y (nasceu entre 1976 e 1994) foi certamente influenciado pela ideia do “virtual”. Pertence à geração que assistiu a uma rápida mudança tecnológica e tomou um susto quando navegou pela primeira vez na internet.
Hoje, a consequência dessas mudanças é um desdobramento dos planos onde os eventos acontecem. No exato momento em que você lê este texto, sua vida virtual continua em plena velocidade: alguém pode ter deixado um recado no seu perfil em alguma rede social neste exato momento, ou um e-mail importante pode ter chegado (fique à vontade para ir lá conferir, o autor entende).
O virtual passou a competir acirradamente por nossa atenção. Estamos “aqui”, mas precisamos ficar de olho no que acontece “lá”. O problema é que o virtual não tem limites. Pede nossa atenção ilimitada, ao mesmo tempo em que nossa capacidade de prestar atenção nele é só humana. Pergunte a quem joga Farmville ou World of Warcraft. Vai ouvir relatos dramáticos sobre a escassez de atenção, com muita gente trocando horas de sono por alguns pontos a mais.
Nossa vida “virtual” também serve para revalorizar rituais com o pé fincado no real. Um exemplo são os festivais de música, que se tornam eventos globais cada vez mais importantes. Do Coachella ao Glastonbury, a cada ano os ingressos esgotam-se mais rápido. Festivais híbridos, como o TED ou o SXSW (South by Southwest), tornam-se grandes encontros para a classe criativa global, cansada (ou nem tanto) de ficar em frente a uma tela. É um fenômeno que guarda semelhanças com a forma como o “slow food” reage ao “fast-food” ou como os movimentos pró-bicicleta respondem a um modelo de cidade que privilegia os carros.
Virtual datou
O festivais globais de música mostram a dinâmica pela qual culturas virtuais (como as músicas compartilhadas pelas redes peer-to-peer) transformam-se em boa desculpa para reunir pessoas. Os exemplos são muitos. Encontros de cosplayers reúnem 100 mil pessoas que celebram seus personagens de animê e mangá favoritos. Ou o Videogames Live, evento em que uma orquestra sinfônica toca “clássicos” musicais de jogos como Mario, Zelda, Halo e Final Fantasy.
A confusão entre real e virtual vai ser cada vez maior. Na constante disputa entre virtual e real, não existe vitória, mas pode haver uma boa dose de diversão
*Ronaldo Lemos, 34, é diretor do Centro de Tecnologia da FGV-RJ e fundador do site www.overmundo.com.br. Seu e-mail é rlemos@trip.com.br