Com hambúrguer high-tech que sangra e picanha vegetal, empresas vegetarianas querem convencer quem tem dó de bicho, mas não quer abdicar do prazer de comer carne
Produzir carnes com aspecto, textura e sabor idênticos às de origem animal sem envolver nenhuma morte, causando menor impacto ambiental. A Impossible Foods, uma empresa criada na Califórnia pelo professor de bioquímica Patrick Brown, está provando que isso já não é mais ficção científica. Primeiro produto da empresa, o “Impossible Burguer” é feito com proteína de trigo, batata, óleo de coco e um ingrediente especial chamado leghemoglobina (“heme”, para os íntimos). Encontrado em animais e também em plantas, o heme contribui para deixar o alimento com cor e gosto de carne.
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Comparado a um de vaca com o mesmo peso, o hambúrguer da Impossible Foods usa um quarto de água e emite um oitavo de gases do efeito estufa, e é com esse argumento, somado à textura e ao gosto, que Brown pretende convecer não vegetarianos a comerem seus produtos. Apesar do investimento parrudo – Bill Gates colocou US$ 108 milhões no projeto – o hambúrguer impossível ainda não é feito em escala e só é vendido em alguns restaurantes em Los Angeles, Nova York e São Francisco. Mas isto deve mudar: a empresa abriu em março uma fábrica para produzir até 450 toneladas de carne sem carne por mês.
Por aqui, as cifras dos empreendimentos passam longe disso e ainda não temos nenhum hambúrguer digno de ficção científica (ou qualquer outra carne vegetal que é de fato idêntica à verdadeira). Mas lá na década de 70 já tinha empresa considerando o valor emocional e cultural do bife: criada em 1925 para atender adeptos da religião adventista, que excluem a carne da dieta, a Superbom lançou sua primeira proteína vegetal enlatada em 1972. “A preocupação era atender os fiéis que sentiam falta da carne no prato”, explica o gerente de marketing David Oliveira. “Mas acabamos contemplando o público vegetariano e nos tornamos pioneiros.” Tofurky, Vegabom e Goshen são outras empresas que hoje também oferecem carnes vegetais e podem ser encontradas em grandes supermercados.
AÇOUGUE… VEGANO?
Criado por Marcella Izzo e Brunno Barbosa há um ano, o primeiro açougue vegano de São Paulo pretende usar o appetite appeal para agradar vegetarianos e veganos, mas também quem come carne. O No Bones oferece salsicha, linguiça, hambúrgueres, espetinhos, costelinhas e até picanha, tudo artesanal e vegetal. A carne da picanha vegan é feita de arroz selvagem vermelho, fumaça em pó para dar o sabor defumado, beterraba e outras especiarias. A gordurinha é um tipo queijo vegetal criado pela casa, à base de batata.
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Convence? “Muitos gostam e voltam a comprar. Já temos clientes que fazem compra do mês”, diz Marcella. O hambúrguer sem ingredientes de origem animal feito pela chef foi selecionado entre os 15 melhores em uma competição paulista de hambúrgueres caseiros. Para quem acha heresia um alimento vegetal ser chamado de carne, ela rebate. “Tomamos como referência o corte e o formato. Aqui utilizamos canhão convencional para produzir as linguiças e as salsichas, por exemplo. Hambúrguer tem até de salmão.” A gerente industrial da Superbom Cristina Ferreira reforça estar dentro das normas chamar uma salsicha de soja de salsicha. “Só precisa estar explícito que é de origem vegetal”.
Os alimentos de origem vegetal que simulam a aparência e o sabor da carne tradicional podem até ser nutritivos, mas no dia a dia, se o objetivo é garantir proteína, são totalmente dispensáveis. “É preferível alimentos naturais e menos processados. Uma alimentação que inclua feijões e cereais integrais dificilmente vai ter déficit protéico”, explica o médico nutrólogo Eric Slywitch, autor do livro Alimentação sem carne. Mas se a ideia é agradar o paladar, a imaginação e a tecnologia não são mais limites.
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