Com Obama confirmado na disputa à presidência americana, a política passa a depender menos do bastidor, do conchavo e do sobrenome.
POR ALÊ YOUSSEF*
Desde que chegaram à Casa Branca, em 1992, os Clinton consagraram um jeito de fazer política baseado em troca de favores, lealdade política e relacionamento com grandes conglomerados econômicos financiadores das suas campanhas eleitorais. Tudo, claro, feito com muito charme e discurso moderno. Com a derrota de Hillary e a definição de Barack Obama como candidato do Partido Democrata à presidência dos Estados Unidos, a política que dependia demais do bastidor, do conchavo e do sobrenome começa a perder força.
O estilo Obama é baseado em três grandes eixos: arrecadação pulverizada (muita gente doa pequenas quantias para a campanha, numa espécie de “vaquinha eleitoral”); ação de longuíssimo prazo (um grupo de pessoas pode ser capaz de traçar um plano de poder para alcançá-lo em 10 ou 15 anos); e voluntariado jovem (a prática política renovada coloca no jogo a nova geração, que, sem vícios e preconceitos, enche o processo de vitalidade, dando visibilidade ao seu candidato).
Outro aspecto interessante do processo norte-americano é a quebra dos tradicionais “currais eleitorais”. Volta à pauta política com força o voto de opinião. Alguns Estados que eram tidos como cativos pelos Clinton foram contagiados pelo discurso de mudança de paradigmas de Obama. A reflexão lato sensu do bem maior bateu a dinâmica regional e de classe do favorecimento strictu sensu.
Utopia possível
No Brasil, ainda estamos muito presos ao modelo Clinton. A era FHC, por exemplo, foi uma reprodução cabal dessa mistura de charme, sobrenome, barganha e pompa que Bill e Hillary consagraram. Já Lula, com carisma contagiante, militância jovem e projeto de longo prazo, se assemelha a Obama. Mas, infelizmente, a arrecadação eleitoral baseada em grandes e vorazes doadores e a política da troca de favores se mantêm fortemente presentes.
No que diz respeito ao voto de opinião, nosso país anda de mal a pior. As câmaras legislativas, por exemplo, estão repletas de representantes de interesses muito específicos de bairros. É quase impossível achar um vereador ou deputado eleito com uma plataforma geral de reflexão consistente sobre o todo das cidades ou do país. Isso empobrece a prática parlamentar e afasta o político local do imaginário coletivo, transformando-o num despachante que resolve microproblemas em troca de um caminhão de votos de alguma comunidade.
Imaginava ser impossível mudar certos dogmas na política. Como uma idéia de mudança pode bater candidatos amparados por muita grana e interesses, repletos de aliados poderosos, com sobrenomes de peso e currais eleitorais cheios de votos? Obama já respondeu parte dessas questões com seu estilo e discurso inovadores. Outras mudanças, como não se transformar com o exercício do poder (e que poder!) e fugir dos poderosos lobbies, também são esperadas. Vamos torcer para que tudo isso aconteça, e nosso país possa ser influenciado por essas boas novidades vindas da terra do Tio Sam. Depois de tanto fast-food e neoliberalismo, um pouco de voto de opinião, juventude na política e desafio aos coronéis e cartéis não nos faria nada mal.
ilustração Thiago Bolotta
*Alê Youssef, 33, é sócio do Studio SP, um dos idealizadores do site www.overmundo.com.br e foi coordenador da Juventude na prefeitura de São Paulo (2001-2004). Seu e-mail é ayoussef@trip.com.br
Desde que chegaram à Casa Branca, em 1992, os Clinton consagraram um jeito de fazer política baseado em troca de favores, lealdade política e relacionamento com grandes conglomerados econômicos financiadores das suas campanhas eleitorais. Tudo, claro, feito com muito charme e discurso moderno. Com a derrota de Hillary e a definição de Barack Obama como candidato do Partido Democrata à presidência dos Estados Unidos, a política que dependia demais do bastidor, do conchavo e do sobrenome começa a perder força.
O estilo Obama é baseado em três grandes eixos: arrecadação pulverizada (muita gente doa pequenas quantias para a campanha, numa espécie de “vaquinha eleitoral”); ação de longuíssimo prazo (um grupo de pessoas pode ser capaz de traçar um plano de poder para alcançá-lo em 10 ou 15 anos); e voluntariado jovem (a prática política renovada coloca no jogo a nova geração, que, sem vícios e preconceitos, enche o processo de vitalidade, dando visibilidade ao seu candidato).
Outro aspecto interessante do processo norte-americano é a quebra dos tradicionais “currais eleitorais”. Volta à pauta política com força o voto de opinião. Alguns Estados que eram tidos como cativos pelos Clinton foram contagiados pelo discurso de mudança de paradigmas de Obama. A reflexão lato sensu do bem maior bateu a dinâmica regional e de classe do favorecimento strictu sensu.
Utopia possível
No Brasil, ainda estamos muito presos ao modelo Clinton. A era FHC, por exemplo, foi uma reprodução cabal dessa mistura de charme, sobrenome, barganha e pompa que Bill e Hillary consagraram. Já Lula, com carisma contagiante, militância jovem e projeto de longo prazo, se assemelha a Obama. Mas, infelizmente, a arrecadação eleitoral baseada em grandes e vorazes doadores e a política da troca de favores se mantêm fortemente presentes.
No que diz respeito ao voto de opinião, nosso país anda de mal a pior. As câmaras legislativas, por exemplo, estão repletas de representantes de interesses muito específicos de bairros. É quase impossível achar um vereador ou deputado eleito com uma plataforma geral de reflexão consistente sobre o todo das cidades ou do país. Isso empobrece a prática parlamentar e afasta o político local do imaginário coletivo, transformando-o num despachante que resolve microproblemas em troca de um caminhão de votos de alguma comunidade.
Imaginava ser impossível mudar certos dogmas na política. Como uma idéia de mudança pode bater candidatos amparados por muita grana e interesses, repletos de aliados poderosos, com sobrenomes de peso e currais eleitorais cheios de votos? Obama já respondeu parte dessas questões com seu estilo e discurso inovadores. Outras mudanças, como não se transformar com o exercício do poder (e que poder!) e fugir dos poderosos lobbies, também são esperadas. Vamos torcer para que tudo isso aconteça, e nosso país possa ser influenciado por essas boas novidades vindas da terra do Tio Sam. Depois de tanto fast-food e neoliberalismo, um pouco de voto de opinião, juventude na política e desafio aos coronéis e cartéis não nos faria nada mal.
ilustração Thiago Bolotta
*Alê Youssef, 33, é sócio do Studio SP, um dos idealizadores do site www.overmundo.com.br e foi coordenador da Juventude na prefeitura de São Paulo (2001-2004). Seu e-mail é ayoussef@trip.com.br