Discussão sobre presente e futuros

por Luiz Alberto Mendes

Poupança

 

Tenho um problema sério com isso de vivermos para o futuro. Preenchemos grande parte do presente de passados. Transferimos energias, capacidades e até emoções para o futuro. Deixamos o singular presente à míngua de si mesmo. Por conta disso, vivemos uma vida apertada, espremida entre passados e futuros.

Enquanto meus companheiros de prisão investiam todas suas fichas no presente: futebol, droga, guerras, debates, televisão, rádio e problemas de cadeia, eu investia no futuro. Pensava nos 30 anos a cumprir e que, ao sair estaria velho e sem futuro. Investia no presente também. Conseguia gostar do que me parecia o único caminho viável para o futuro. Naquele presente, eu sentia prazer no trabalho de construir futuros. Ler, estudar, pesquisar, procurar... Minha curiosidade crescia assustadoramente.

O pai de Bill Gates em entrevista afirmou que a principal qualidade de seu filho foi sempre buscar satisfazer sua curiosidade. Eu tentei algo parecido, guardadas as proporções, dentro dos limites de minha condição social. Misturei meu presente ao meu futuro, mas não me perdia de meu real que era a prisão.

Ao sair eu estava no futuro, aquele que construíra em meu presente na prisão. Eu chegara ao futuro e agora ele era presente. Não existia mais futuro, já estava nele; era todo meu presente. Parecido com o que diz o Fukuyama acerca do fim da história. Havia acabado a minha história; agora meu presente seria sempre presente.

O meu presente esta carregado de passados. Histórias e mais histórias que venho contando nesses 6 anos aqui fora. Espero, ao fechar e publicar meus dois últimos livros: o final autobiográfico e um de contos, deixar o passado inteiramente para trás. Então me volto inteiramente para o presente em meu trabalho escrito. Ando de saco cheio de passados, não vejo a hora!  

Não quero mais poupar nada. Gostaria muito de ter um futuro de qualidade, mas não vou mais me preocupar com isso. O dia de hoje se basta. Provavelmente nem sempre conseguirei a qualidade de vida que desejo. Poupar poderia cobrir possíveis falhas ou dificuldades. Mas seria novamente sacar do presente para depositar nos futuros. Seria uma sangria nas possibilidades do presente. Misturei presente ao futuro na prisão e deu certo, é bem verdade. Mas aquela era uma estratégia necessária para sobreviver com alguma dignidade. Já aqui fora preciso investir todo meu possível no presente, mesmo porque meus futuros serão breves. Estou ficando velhinho...

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Luiz Mendes

29/06/2010.

 

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