Cutucadas virtuais

por Ronaldo Lemos
Trip #225

Ninguém sabe ao certo para que serve, mas vira e mexe chega uma cutucada vinda de alguém

Desde que comecei a atuar como representante do MIT Media Lab no Brasil, recebo periodicamente pokes no Facebook do diretor da instituição, Joi Ito. Ele os distribui a uma rede enorme de pessoas no mundo todo

Se você está no Facebook provavelmente já esbarrou na função cutucar (poke, em inglês). Ninguém sabe ao certo para que serve, mas vira e mexe chega uma cutucada vinda de alguém. O legal é justamente “interpretar” o que significa a cutucada. É flerte? Jogo entre amigos? Alguém querendo chamar a atenção? Uma lembrança para responder uma mensagem esquecida? Pode ser também demonstração de afeto, amizade ou mesmo um sinal de aprovação intelectual. A graça é o enigma.

Nesse contexto, desde que comecei a atuar como pesquisador e representante do MIT Media Lab no Brasil, recebo periodicamente cutucadas do diretor da instituição, Joi Ito. Já falei dele aqui na coluna. Joi é o empresário e investidor japonês que apostou em empresas como o Twitter e o Tumblr quando elas ainda estavam no começo. Foi apresentador de programas de TV, DJ, nunca terminou a faculdade (apesar de ter passado por várias) e agora é diretor de uma das instituições acadêmicas mais inovadoras e prestigiosas do mundo.

O que significam suas cutucadas? Para interpretá-las, o primeiro passo é saber que elas não são direcionadas só a mim. Conheço a forma como Joi trabalha e ele distribui pokes ao longo de uma rede enorme de pessoas. Então sou apenas um entre os inúmeros alvos das cutucadas distribuídas por ele. Há chance de que não seja nem ele mesmo que faz os pokes. Joi pode estar usando um bot – um aplicativo como o Autopoke – que cutuca as pessoas de forma automatizada e pré-programada no Facebook. Essa possibilidade é reforçada porque não há um padrão de tempo nas cutucadas dele. Algumas chegam pela manhã, outras na madrugada ou à noite (claro que isso pode ser também resultado de que Joi vive em muitos fusos horários diferentes).

Com isso, fico imaginado se os pokes não são parte de algum projeto para medir o tempo de resposta das pessoas ligadas à sua rede. Quando recebo um poke de Joi, cutuco de volta. Isso às vezes acontece em minutos ou em horas, dependendo do quanto estou pessoalmente conectado no Facebook. Claro que poderia trapacear, instalando um script para responder automaticamente aos pokes dele, mas não fiz isso ainda.

Futuro em rede

Essa seria uma boa forma de medir a conectividade das pessoas na sua rede. Em algum lugar pode estar sendo criada uma planilha com o padrão do tempo de resposta aos pokes enviados (e já detectando aqueles que automatizaram a resposta).

Seja lá qual for a razão, são práticas que dão o que pensar. O diretor de uma instituição de pesquisa como o MIT Media Lab estar presente de verdade no Facebook já é algo notável. Usar a plataforma para manter contato constante com os seus colaboradores é mais notável ainda. São práticas que mostram uma outra ideia de academia. Em vez de simples hierarquia fechada, uma rede distribuída de colaboradores no mundo inteiro. Em vez de burocracia (ou autocracia), a informalidade (expressa por meio de simples pokes). Em vez de certezas, possibilidades.

Um poke é só um bit de informação. Mas até esse bit, se bem usado (de forma automatizada ou não), é capaz de gerar boas ideias. Inclusive para pensar um futuro mais integrado, inteligente e em rede para o mundo acadêmico.

*Ronaldo Lemos, 37, é diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro e fundador do site www.overmundo.com.br. Seu e-mail é rlemos@trip.com.br
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