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Canastra de reis

por Caio Ferretti
Trip #182

Juntamos seis covers de Roberto Carlos e ainda armamos um show com todos eles na Augusta

Para tentar entender o que leva alguém a tentar ser outra pessoa, e também pela farra, juntamos seis covers de Roberto Carlos e ainda armamos um show com todos eles

“Tem alguma tomada por aí? Alguém está vendo uma tomada livre?” A busca de Carlos Evanney já levava alguns minutos, mas nada de resultados. “Precisava de uma aqui”, insistia. Andando de um lado para o outro, Evanney checava as paredes do estúdio fotográfico, mas não encontrava o que queria. Nas mãos, o objeto que desejava ligar: sua chapinha de cabelo. “Esta aqui eu comprei, não roubei da mulher, não.” Evanney tinha pressa. Queria alisar ainda mais as longas mechas para estar impecável na sessão de fotos para Trip. Mas grande parte das tomadas disponíveis já estava ocupada por. outras chapinhas. Além de Evanney, outros cinco ali tinham o mesmo objetivo de vida: ser igual ao rei Roberto Carlos.

Sim, é isso mesmo. Reunimos seis Robertos covers. Do Rio de Janeiro vieram Carlos Evanney e Carlos Cristiano; do Espírito Santo, Fábio Freitas; e de São Paulo, Raul Nazário, Carlos Moreira e Paulo Omine.

A maioria já se conhecia, estiveram juntos em alguns concursos, mas em nenhum dos casos houve seis representantes ao mesmo tempo. A sala era pequena para tantos reis. Não demorou para que um deles percebesse a relação da música “O sósia” com o encontro: “Quando olhei pro lado eu perdi a fala/ Descobri um cara que tinha a minha cara/ E até seu nome era igual ao meu/ Um era demais, eu sei não era eu.”. Ironicamente, um apontava para o outro durante os versos, mesmo sendo todos covers. Evanney finalizou, em tom de brincadeira: “Que papo-furado, um cara com a minha cara, mora!”.

“Às vezes eu até penso que sou o Roberto. Quando me produzo, olho no espelho, ali não está mais o Carlos Evanney, ali está o Roberto”


Segundo essa turma, para interpretar Roberto Carlos é preciso se sentir um pouco como ele. Nesse quesito, Carlos Cristiano é preciso: “Se você não se sente pelo menos 60% Roberto no palco, pode fazer outra coisa”, diz. Há quem vá além. “Às vezes eu até penso que sou o Roberto. Quando me produzo, olho no espelho, ali não está mais o Carlos Evanney, ali está o Roberto Carlos. Eu vivo Roberto 24 horas do meu dia. Em nenhum momento eu penso: ‘Agora é a hora do Carlos Evanney’, porque eu faço tudo o que o Roberto faz.” Sua filha, aliás, chama-se Roberta Carla.

Manias cover
Inicialmente, a intenção era juntar cinco covers de Roberto Carlos. Mas a notícia de que um inusitado imitador do rei fazia sucesso em casas de karaoke da Liberdade, bairro oriental de São Paulo, fez mudarem os planos. Não dava para excluir do encontro Paulo Omine, o cover japonês. Em meio aos outros Robertos, o rei do Oriente ganhou o apelido de Jackie Chan – e aproveitou para tirar a dúvida sobre qual perna Roberto balança enquanto canta. “Tem gente que fala que ele balança a direita, aí fico treinando a direita. Depois falam que é a esquerda, aí tem que treinar a esquerda. Ainda bem que é simples, não é igual ao Michael Jackson.” Mas, Paulo, dá pra dizer que você é o rei mesmo sendo japonês? “Rei eu não sou, mas tenho minha coroa lá em casa.”

 

“Às vezes eu até penso que sou o Roberto. Quando me produzo, olho no espelho, ali não está mais o Carlos Evanney, ali está o Roberto”

 

Logo se percebeu que Paulo era o menos realista dos reis ali reunidos. Não pintou os cabelos brancos e foi o único a chegar para as fotos com sapatos marrons. Como é sabido, o rei de verdade jamais usaria essa cor. Aliás, alguns de mentira também não usariam – sim, alguns também têm manias cover. “Tenho todos os costumes parecidos com os do Roberto. Não uso marrom, procuro sair pela mesma porta pela qual entrei e assim vai”, conta Evanney, que agora canta em seu próprio cruzeiro, mas pela baía de Guanabara.


A famosa mancadinha que nosso rei Roberto Carlos dá enquanto anda também não poderia ficar de fora. Dois deles, Carlos Cristiano e Carlos Moreira, repetem o gesto. “Dizem que é pra copiar o Roberto, mas na verdade temos problemas na perna mesmo”, garantem os dois.

E foi assim, mancando, que ambos entraram num restaurante de São Paulo logo após a tarde de fotos. Garfadas interrompidas para ver a fila de Robertos entrar. “Meu Deus! Quantos Robertos ainda vão chegar?”, perguntou o garçom enquanto arrumava as cadeiras. “Ainda bem que isso aqui
não é uma mesa de covers do Tim Maia, senão daria prejuízo”, calculou um dos genéricos. Durante os brindes com copos de cerveja, lembraram: “Mas não é whisky que o Roberto bebe?”.

 

"Para o nosso cover de karaokê faltavam as letrinhas numa tela, e ele achou melhor não arriscar uma canção sozinho"


De volta à Augusta
“Agora serão muitas emoções porque ele está aqui. Ou melhor, eles estão aqui.” O anúncio no palco da casa noturna Studio SP já era esperado por grande parte do público. Passava da uma da manhã quando o grupo de Robertos desembarcou na rua Augusta para participar de um show da banda pernambucana Del Rey – composta de membros do Mombojó mais o vocalista China e conhecida por tocar sucessos do cantor. Se um Roberto Carlos já tumultuava a Augusta no passado, “a 120 por hora”, o que dizer de seis?

O plano era simples. Cada um cantaria uma música e no fim todos entoariam “Emoções” juntos. Com uma exceção. Para o nosso cover de karaoke faltavam as letrinhas numa tela, e ele achou melhor não arriscar uma canção sozinho. Tudo bem, os outros deram conta do recado. No palco do Studio SP, pareciam ter ultrapassado os 60% da matemática de Carlos Cristiano. 

 

Carlos Evanney

Idade: “Artista não tem idade”
Cover há
: 15 anos
Música preferida
: “Detalhes”
Disco preferido
: “Todos”
Como é ser Roberto? “É complicado. Quando você incorpora um artista, gosta dele, ama de verdade, acaba pensando que é ele”

  

Roberto Moreira

Idade: 44 anos
Cover há: Três anos
Música preferida: “A janela”
Disco preferido: Verde e amarelo
Como é ser Roberto? “Parece que o incorporamos, e o público faz a gente se sentir assim. Acabamos pegando o jeito dele também, algum gesto. É natural”

 

Fábio Freitas

Idade: 57 anos
Cover há: 15 anos
Música preferida: “Emoções”
Disco preferido: Negro gato
Como é ser Roberto? “É muito gratificante, uma realização. Procuro achar a perfeição, tanto que em meu guarda-roupa só tem peça branca ou azul”

 

Raul Nazário

Idade: 50 anos
Cover há: Oito anos
Música preferida: “O portão”
Disco preferido: É preciso saber viver
Como é ser Roberto? “Essa é uma pergunta complexa. Na hora do show, vivo o personagem. Às vezes minha mulher fala: ‘Casei com o Raul, para de imitar o Roberto, quero meu Raul de volta’ ”

 

Carlos Cristiano

Idade: 55 anos
Cover há: 42 anos
Música preferida: “Rotina”
Disco preferido: Em ritmo de aventura
Como é ser Roberto? “Eu tenho que imaginar o Roberto, sentir a presença dele, a música tem que entrar em você”

 

Paulo Omine

Idade: 56 anos
Cover há: Três anos
Música preferida: “Emoções”
Disco preferido: Jovem guarda Roberto Carlos
Como é ser Roberto? “É difícil explicar. Faço o máximo possível pra ficar parecido com ele, coloco sentimento nas músicas. E, às vezes, faço alguns gestos dele quando estou fora do palco”

Agradecimentos Hotel La Guardia www.laguardia.com.br / Studio SP www.studiosp.org 

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