Cães e Sentimentos

por Luiz Alberto Mendes

Quando o vi, sabia que tinha que ser meu. E o bichinho havia me escolhido

CHICÃO

Quando o vi, sabia que tinha que ser meu. Era assim de amarelo fulvo no centro de suas costas, ao amarelo ouro claro, quase bege, descendo até o peito. No centro do peito, havia uma incrível linha de pelos brancos lhe conferindo nobreza. Apaixonei-me à primeira vista. Cheguei e o bichinho veio com as orelhas para trás, parecendo um pitibullzinho. O rabo era curto e, ao balançá-lo, sacudia a parte traseira toda. Alegre, saudável e bonito demais. Atropelei quem queria também. Já era meu. Peguei e os dedos afundaram em seu pelo macio. Era tão macio e fofo que levei instintivamente ao rosto num afago... Ergui e, incrível: os olhos eram azuis com o contorno em verde. Nunca havia visto nada parecido. Esticava a língua, querendo me lamber. Estavam dando, agora era meu. Agradeci a doadora que olhava atônita, trouxe-o no junto ao peito, virei e fui. Nem olhei para trás com receio de arrependimento. O bichinho se acomodou e se fixou à frente. Ele havia me escolhido.

Conquistou-me com aquela olhada com as orelhas para trás, a balançar o traseiro. Em casa, soltei no chão e meus meninos vieram curiosos. Deixei que gostassem um pouco dele. Só gostar, não era para apaixonar. Tomei o cãozinho deles, soltei na minha cozinha e fiquei admirando. Saiu cheirando centímetro por centímetro, se apropriando do território. O cachorrinho só queria morder. Acariciava e ele crava os dentinhos afiadíssimos. Não sabia machucar. Pressionava e soltava, deixei. Caso puxasse, cortaria a pele. Reagi com afagos. Parece que ele não conhecia muito de afeto. Os garotos foram chegando de novo, invadiram e tomaram conta. Era pura energia. Encarava os dois, latia fininho e partia para cima. Fui ao pet, comprei ração, coleira e biscroquer. Demorei e o encontrei ralando tudo. Sapatos, jornal, tapete, lixeira, até meu desodorante foi parar na boca dele. Fez uma zona. E à noite para dormir? Acomodei-o ternamente em minha cama. Pior viagem. Não me deixou dormir a noite toda. Acordava e vinha para cima brincar de morder. Minha sobrinha afirmou que era vira lata, me ofendi. Ela se explicou. Era uma mistura de várias raças nobres. Parecia um mini Labrador. Caso cortasse suas orelhas e levasse em conta a boca enorme, seria um Pit Bull mirim. Tinha porte de Fila por ser encorpado e possuir pequena barbela debaixo do queixo. Quiseram me assustar. Parecia pit bull, tenho filhos, e se ele fosse perigoso? Nunca acreditei no que dizem. Não ia começar agora por medo. Isso dele querer morder o tempo todo era coisa da idade. Agora ele esta com 2 anos e meio e é minha maior companhia. Sou um homem só. Não é por opção. É que ainda não aprendi a me relacionar devidamente. É um longo aprendizado. Bem queria ter um montão de amigos. Ele tem porte médio, continua amarelo fulvo e ouro, seus olhos azuis de dia e verdes à noite. Vive misturado a meus pés ou latindo no portão. Aprendi a andar arrastando para não pisá-lo sem querer. Agora mesmo esta aqui, deitado no chão. Dorme, mas seus sensores estão ligados em mim. É só eu levantar para ele acordar instantaneamente. Estica o focinho, cheira o ar, dá uma esticada no corpo todo e se põe a seguir aonde eu vá. Caso saia, ele fica no portão uivando e ganindo. Deixo os meninos atentos para o distraírem; mas não dá para sair sem que ele saiba. Quando chego, me recebe como se fizesse séculos que não me vê. Fica louco e nem sabe o que faz para me agradar. Sua alegria faz esquecer tudo. Desde a hora de limpar seus malcheirosos cocos e xixis, até quando me acorda na madrugada, lambendo minha cara, a fim de fazer xixi no quintal. É um animal brincalhão e cheio de energia. Eu o criei com amor e creio que o tornei dócil. Acredito nisso. Pelo menos nunca soube que ele houvesse mordido alguém. Ah! Ele acordou e enfiou o focinho aqui em meu colo; parece que sabe que falo dele. Vou curti-lo um pouco. Tchau...

 

** Luiz Mendes Composto em 20/01/2008 / Reescrito em 18/05/2010.

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