Amizade Instantânea é Assim.

por Luiz Alberto Mendes

 

O Barqueiro

 

O que me contaram foi o seguinte:

Roberto Bomtempo, o ator e diretor de teatro, cinema e televisão, ao fazer uma devassa em sua imensa biblioteca, encontrou vários livros em duplicata. Sabendo que sua mãe, a atriz Regina Sampaio, é grande leitora, deu-lhe alguns daqueles livros. Um deles, assim maçudo, 478 páginas, desanimava só de sentir o peso. Seria uma jornada de muitos dias e ela não tinha esse tempo todo. Aos 73 anos de idade, o tempo nunca foi tão pouco tempo para ela. Então cedeu o livro para um jovem barqueiro que também era grande leitor e a conduzia da Ilha Primeira da Barra da Tijuca, onde reside, ao continente.

Passado algum tempo, esse mesmo barqueiro perguntou se ela havia lido o livro que havia dado a ele. Não, não tivera tempo de ler. Então ele lhe devolveu o livro e recomendou para que ela o lesse. Era importante. No mínimo era estranho o fato do barqueiro haver devolvido o livro, ainda mais recomendando daquele jeito. Sentindo-se desafiada, encarou a tarefa de ler o tal livro.

Antes de passar da metade, já não conseguia mais largar do livro. Dormia e acordava lendo. A história a absorveu inteiramente. Tanto que me procurou por e-mail. Era o meu primeiro livro “Memórias de um Sobrevivente”. Foi instantâneo. Nos primeiros e-mails já éramos amigos; havia coisa demais em comum. Depois a amizade cresceu ao ponto em que a gente não conseguia mais ficar sem se ver, sem se falar, sem estar juntos.

Convidou-me para passar uns dias em sua casa. Rio de Janeiro me interessava vivamente. Amo aquele pedaço de céu e mar. Logo já me imaginei andando com os pés na água do Leme ao Leblon como queria Tim Maia. Demorou! Ainda mais que a novíssima amiga me arrumou carona. Os pais e a irmã do namorado de sua neta iriam visitar o filho e a nora que moram com ela. Nem pensei; claro que iria quase que já estava lá.

A viagem foi cansativa. Não estava preparado para tantas horas sentado e contido, mas enfim, chegamos à Barra da Tijuca. Havia ainda que tomar um barco para chegarmos à ilha. Regina nos esperava no cais. Uma alegria imensa conhecê-la de perto. A casa era muito bonita e espaçosa, fui acomodado em um quarto.

Comecei a conversar com Regina sexta à tarde quando chegamos e só fui parar ontem, quarta-feira quando voltamos. Claro com intervalos para dormir. Sábado fomos ao Projac para Regina gravar suas apresentações em Malhação. Depois à noite ela me levou a festa de aniversário de um dos seus netos, Miguel, filho de Roberto Bomtempo e Miriam Freeland. O garoto fazia um ano de vida feliz com toda aquela paparicação. Uma festa memorável. 

Choveu o tempo todo e não pude ir à praia. Saímos de casa somente para compras e algumas necessidades. Passamos os 5 dias conversando e não lamento nem um pouco. Aprendi muito, ela me fez entender muito de minha vida e meus rumos.

A mulher aos 73 anos esta estudando teclados; dança; faz musculação; esta em uma escola de teatro e não tem tempo para pensar que tem idade. Não é nem um pouco velha; é apenas idosa. Sua alegria é contagiante, sua vontade de viver embriaga qualquer um. Seu empenho no que faz é estimulante, sua arte é fina e recheada de conheceres. Faz tudo como se fosse viver para sempre, sem reclamações ou concessões. É excelente motorista e faz tudo muito bem feito, além de ser uma grande mãe e avó. É uma mulher bendita por todos que a conhecem: simpática, agradável, bem humorada e com uma espiritualidade incomum.

Bebi dessa fonte sofregamente. Sai de lá já morto de saudades. Quando sua neta falou que a casa estava à minha disposição, só não pedi para ficar porque ela vai ter visitas neste fim de semana. Dá vontade ficar para sempre.

Amei Regina. Não por isso ou por aqui, mas por tudo. Eis um ser feito da matéria que eu gostaria de ter sido construído. Não há como agradecer o fato dela ser como é. Faz parte dela a gentileza, a generosidade e a boa vontade. Resta admirar e mesmo por isso, tentar chegar perto.

Agradeço do fundo de minha alma ao barqueiro Josias, responsável por toda essa alegria em meu coração.

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Luiz Mendes

03/05/2012.

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