Alê Youssef: ’Que 2014 seja o ano da mudança’
Precisamos ter pessoas que arregacem as mangas e façam da política uma opção de vida, enfrentando as dificuldades deste sistema corrompido para criar novas alternativas eleitorais para todos. Que 2014 seja o ano da mudança
Nosso maior desafio é a qualificação da política. E esse desafio é maior ainda quando constatamos que, depois de todas as manifestações que tomaram as ruas em 2013, poucos foram os que resolveram se filiar a partidos para entrar efetivamente na política e tentar mudar alguma coisa. Tudo bem, sabemos que a rejeição à política é algo absolutamente enraizado na nossa sociedade e que não conseguiremos mudar esse quadro da noite para o dia. Mas não deixa de ser perturbadora a hipótese de, depois das tão exaltadas e até festejadas manifestações, ao avançarmos no período eleitoral, constatarmos os mesmos candidatos de sempre, sem novas opções para votar.
Para deixar um pouco mais perturbador o quadro, imaginemos as propagandas nos horários eleitorais do ano que vem: como sempre, mais saúde, educação, transporte público de qualidade e segurança para todos. Mas, antes de cada candidato aparecer, cenas dos milhões de pessoas nas ruas segurando cartazes e um locutor em off dizendo: “O povo deu seu recado nas ruas”. É de dar nó no estômago e provocar arrepios.
Mas talvez tudo isso faça parte de um grande novo ciclo de transformação. Depois do levante de junho, a simples constatação da impossibilidade de mudanças pode gerar uma verdadeira ruptura, capaz de efetivamente acordar o gigante deitado em berço esplêndido. Talvez esse momento de tensão diante da mesmice gere a compreensão de que, para mudar a política do país, não bastam alguns meses de indignação na rua, palavras de ordem fortes e caixas eletrônicos detonados. É preciso muito mais do que isso: desde uma participação mais efetiva ao longo dos anos, reunindo amigos, buscando novas lideranças, até a procura de espaços reais em partidos políticos ou mesmo a criação de outros para consolidar novas propostas e candidaturas conectadas com os anseios de cada grupo social.
Historicamente foi assim e, acreditem, alguns dos partidos que estão aí – e hoje são alvos de nossas críticas – representaram rupturas importantes no passado e atuaram como agentes de mudanças impulsionadas pelos desejos das mulheres e homens que os criaram.
NOVO CICLO
Devemos compreender o tamanho do problema da política nos dias de hoje, mas jamais negá-la. A grande ruptura transformadora do próximo ano pode ser a politização forçada de toda uma geração que sempre detestou política, foi às ruas em 2013, mas não sacou que, para as coisas mudarem, é preciso criar opções eleitorais que vençam as eleições e, estando no poder, não atuem apenas para manter esse poder conquistado. Uma nova geração comprometida em trabalhar para reformar as regras do jogo e o funcionamento do Estado. Essa é a lição maior do jogo democrático.
Tem quem se manifestou para expor a fúria dos anos de opressão, tem quem saiu às ruas para reviver os anos rebeldes, tem quem está exausto e não aguenta mais tanta coisa errada. Mas, perceba, precisamos ter também muitos que arregacem as mangas e façam da política uma opção de vida, enfrentando as dificuldades de todo este sistema corrompido para criar novas alternativas eleitorais para todos os outros.
Que 2014 seja o ano dessa constatação, para que nos próximos processos eleitorais surjam muito mais opções transformadoras de verdade. Feliz ciclo novo.
*Alê Youssef, 38, é apresentador do programa Navegador, da Globonews, comentarista do programa Esquenta!, da TV Globo, advogado e produtor. Seu e-mail é alexandreyoussef@gmail.com