Quando a viagem não compensa

por Gaía Passarelli

Viajar é que nem viver: às vezes dá ruim. Por isso o turismo deve ser mais crítico sobre o impacto ambiental, social e econômico

Considerada a mais bela ilha da Tailândia, Ko Tachai foi explorada até o osso por turistas do mundo todo, afetando a vida marinha da região. A coisa chegou num nível de descontrole que o país está fechando o acesso à ilha indefinidamente – leia aqui. Há quem critique, dizendo que isso vai sobrecarregar outras ilha-paraísos do Sudeste Asiático, mas também há quem argumente que esse pode ser o caminho certo, sim.

A Tailândia não está sozinha nesse rolê. Machu Picchu, a Muralha da China e as pirâmides do Egito são "destinos" (jargão da indústria do turismo para "local visitado") que sofrem a cada temporada com o excesso de visitantes humanos que, barulhentos e cheios de necessidades, espantam animais, alteram o cenário e esgotam recursos na mesma velocidade com que tiram selfies. 

Mas o problema pode ser menos o fluxo exagerado de gente e mais a falta de educação dos visitantes. Pense no vexame do nadador olímpico Ryan Lochte na Olimpíada do Rio de Janeiro (leia aqui), que encheu a cara e destruiu o banheiro de um posto de gasolina. O caso dele é piorado por tentar inventar um assalto e por, claro, ser atleta olímpico. Mas esse tipo de comportamento babaca acontece no Rio, acontece em Dubrovinik (que planeja como restringir o acesso de turistas ao seu centro histórico medieval), acontece em Angkor Wat (onde turistas foram multados por tirarem fotos pelados) e acontece em Amsterdam (onde recentemente a população votou pelo fim da venda de cannabis para turistas nos coffee shops). 

Em resumo: acontece. É a famosa falta de educação, de empatia, de responsabilidade. Todo turista é assim? Óbvio que não. Mas em casos como o do maluco que subiu num moai na Ilha de Páscoa e arrancou um pedaço da orelha da estátua (juro!), fica claro que basta um idiota para que algo de valor inestimável seja danificado para sempre. Como contornar?

Turismo é um negócio e tanto. Lazer é a primeira coisa que uma pessoa investe quando o dinheiro dá, e viajar é o lazer máximo: ver coisas bonitas, comer bem, fazer, comprar e colocar as fotos no Facebook. É status, mas não só. É um prazer. Só que no afã de aproveitar seu momento de prazer, tem turista que esquece que é um convidado e age como dono do lugar. E quando isso acontece, todo mundo sai perdendo.

A boa notícia é que não é tarde demais. Exemplos como os da Tailândia, da Costa Rica, do Butão e de Fernando de Noronha ganham espaço. A solução que esses lugares encontraram para lidar com o problemas do turismo são variadas. No Butão a estratégia é “high cost and low impact”, ou seja, poucos visitantes e custos altos.

O Butão não enxerga seu patrimônio histórico e cultural como algo que todo mundo tem direito de ver e sim como algo que é único, especial e deve ser preservado. Já na Costa Rica, um dos países mais verdes do mundo, a abertura existe, o turismo é a indústria principal e é tratado com cuidado. O país entende que, se destruir aquilo que tem de precioso no país, a entrada de grana acaba. E Fernando de Noronha, candidato brasileiro a geoparque da UNESCO, usa o formato de cobrar taxas e controlar quantas pessoas entram por vez no território. 

Lá funciona porque é uma ilha. Outros lugares, em especial os de natureza delicada como o deserto de sal da Bolívia ou a lagoa de Veneza, vão precisar encontrar seus próprios formatos para continuarem existindo. Nunca se viajou tanto e para tantos lugares como hoje, mas o que vivemos está longe de ser uma era de ouro do turismo. É, isso sim, um momento crucial que pede reflexão e uma visão mais crítica do impacto ambiental, social e econômico do turismo.

Para saber mais: três sites de viagem que incentivam o turismo consciente.
Vai lá: 
ethicaltraveler.org
theincidentaltourist.com
dentrodomochilao.com

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